No Discutindo Direito, o ministro Sebastião Alves dos Reis Júnior (STJ) analisa a validade de cartas psicografadas em julgamentos criminais. O juiz detalha por que essa prova, isoladamente, não pode sustentar uma acusação no Tribunal. Acompanhe a visão técnica do STJ sobre o tema e o valor da prova espiritual no Direito.
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00:00Qual o valor probatório? Eu, quando era promotor do júri, tinha um caso em que a defesa quis usar uma carta psicografada como prova.
00:12E a gente sabe que pela doutrina é considerada como uma prova mágica.
00:16Qual a opinião do Superior Tribunal de Justiça sobre o valor probatório de cartas psicografadas, independentemente da fé de cada um?
00:24Bem-vindo, ministro.
00:24Gostaria primeiro de agradecer a oportunidade de estar aqui nessa conversa.
00:33Bom, isso foi uma decisão recente do tribunal sobre esse assunto, em que a parte que questionou, a parte que estava sendo acusada de determinado crime,
00:43do uso pelo Ministério Público como prova de uma carta psicografada.
00:47A conclusão foi no sentido de que não teria validade.
00:50É uma situação meio excepcional, sem entrar no mérito de quem acredita, quem não acredita,
00:58porque se você abre espaço para esse tipo de prova, nós poderíamos caminhar para tarólogo, para búzios, essas coisas todas.
01:10E isso fica uma coisa muito complicada, porque você não pode contraditar, você não pode questionar aquele que escreveu a carta, você não pode...
01:18Então, é uma situação realmente que, independente de se acreditar ou não da crença de cada um,
01:28é uma prova que ela não tem como sustentar uma acusação.
01:32Nós estamos dentro do processo, uma coisa que orienta o processo em geral e em especial o criminal.
01:41É o contraditório, a oportunidade da defesa questionar as provas que são apresentadas contra ela.
01:48E esse tipo de prova, como você vai questionar?
01:51Primeiro, você não estava presente no momento em que a carta foi psicografada.
01:55Segundo, que você não tem como perguntar para quem mandou a carta lá de cima, quem ditou a carta,
02:02ou fazer algum questionário, perguntar isso e aquilo, botar em dúvida esse tipo de fala.
02:08Então, é muito difícil.
02:09Então, essa prova realmente não tem como ter uma força, que a gente chama de força probante.
02:14E como no caso, se não me falha a memória, era o homicídio,
02:20e aquela prova ia ser apresentada perante um júri, que não tem inclusive um preparo técnico
02:27para avaliar o peso de cada prova, eu acho que fica mais importante ainda a exclusão dessa prova do processo.
02:36Olha que interessante, foi no início dos anos 90, foi no júri também, em um caso de homicídio.
02:42Que interessante, porque a justiça é laica, evidentemente, como o Estado brasileiro.
02:46Então, a ciência jurídica se baseia na racionalidade e na lógica, independentemente da fé de cada um.
02:52Exatamente.
02:53Muito bem.
02:53Agora, vamos para um outro tema ainda ligado à questão da prova.
02:57Crimes sexuais.
03:00Estupro, importunação sexual, ou mesmo a questão da Lei Maria da Penha.
03:05Claro que a palavra da vítima, ela tem valor desde que cotejada com outros elementos de prova.
03:10Mas eu queria ouvir a opinião do senhor.
03:12Como fazer?
03:13O senhor é um magistrado experiente, está há muitos anos no Superior Tribunal de Justiça.
03:17Como fazer para mensurar se ali existe uma carga excessiva, se existe um exagero, uma distorção,
03:25ou se realmente se trata de uma vítima autêntica?
03:27Como faz o magistrado para fazer essa distinção?
03:30É uma situação muito difícil, porque normalmente esses crimes, a grande maioria das vezes,
03:37ele acontece o que a gente fala, as portas fechadas.
03:40Não é um crime que acontece publicamente, você não vai ter uma câmera filmando um roubo, um furto na rua,
03:46que você tem a câmera, tem uma testemunha, etc.
03:49E aí você utiliza esse conjunto probatório para chegar a uma conclusão.
03:54Ali realmente vai, em geral, é muito comum a palavra da vítima contra a palavra do acusado.
04:01Eu acho que o juiz, primeiro, eu como sou um juiz de um tribunal superior,
04:06eu vou trabalhar com aquilo que chega pronto para mim.
04:08Ou seja, eu não conduzo a produção da prova, eu não vou ouvir a testemunha, eu não vou ouvir as partes.
04:14Então, eu, em especial, eu levo muito em conta a opinião do juiz.
04:18Porque foi aquele que colheu as provas.
04:20Foi ele que ouviu a vítima, foi ele que ouviu o acusado e, eventualmente, ouviu alguma outra testemunha
04:27que talvez não tenha presenciado o ato, mas do convívio.
04:32Então, é muito comum uma prova de abuso infantil.
04:36Você vai ouvir os familiares, as pessoas, professor da escola que percebe uma mudança de comportamento na criança.
04:43Essas coisas todas que vão constituir um quadro que vai orientar o juiz.
04:48Mas, nessa situação, eu acho que o que vai pesar é a convicção.
04:56Ou seja, a coerência do depoimento da vítima, que é o que vai levar ao vítima.
05:01Ou seja, aquilo tem uma determinada lógica.
05:04Aquilo tem, como posso dizer, tem conteúdo.
05:10Ou seja, é coerente aquilo que a vítima está falando.
05:14Ou seja, é possível você acreditar nisso.
05:16E a forma que ela depõe, a convicção.
05:18É claro que ela vai estar, muitas vezes, emocionalmente debilitada.
05:23Mas, até isso serve para orientar o juiz.
05:26E eu, como um juiz do Tribunal Superior, eu levo muito em conta justamente aquilo que o juiz...
05:32Aquele juiz que colheu a prova, a conclusão que ele chegou.
05:37É claro que o juiz do Tribunal Superior, eu levo muito em conta.
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