No Visão Crítica, Sergio Salomão Shecaira analisa o conceito de atos de exceção e faz um retrospecto da ditadura militar, refletindo sobe a interpretação jurídica do termo e ressaltando que, na prática, o argumento “não faz nenhum sentido”.
Confira o programa na íntegra em: https://youtube.com/live/EZ0XAMqz3-g
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00:00Os advogados se esforçaram muito, teve algumas defesas muito boas, não vou falar alguma porque aí depois você é conhecido de outro, você vai falar que esqueceu dele e tal, mas foram muito bem.
00:10Eu não gostei só de uma ou outra, eu não gosto muito de homenagens, homenagem você pode homenajar um minuto, não 21 minutos quando você tem uma hora para defender seu cliente, aí não dá, você perde um terço do tempo.
00:21Mas em certo momento o advogado general Paulo Sérgio, ele falou cinco vezes a palavra demover, e os ministros ao contrário de gente que mente para você, estavam muito atentos às sustentações orais, muito atentos, e anotando, anotando.
00:41E hoje mesmo o ministro Flavrino falou sobre isso, e a ministra Carmelho falou, um momento, vossa senhoria, porque o tratamento se tem, vocês estão vendo, é um outro mundo, nós estamos entrando aqui, vossa senhoria para uma, vossa excelência para outra, vossa senhoria falou o seguinte, eu vou ler literalmente, estou vendo a transição do Jornal Globo.
01:01A ministra Carmelho Lúcia se referiu ao dizer o seu cliente, tal, tal, falou, demover de que? Ela perguntou ao advogado, porque até agora todo mundo disse que ninguém passou em nada, quer dizer, não tinha golpe de estado.
01:16Aí o advogado do general Paulo Sérgio, comandante do exército e ministro da defesa, o senhor falou cinco vezes em demover, a resposta, o advogado foi direto, e disse o seguinte, abre aspas,
01:31Falo claramente para a senhora, demover de adotar qualquer medida de exceção, fecha aspas. O que é medida de exceção? Golpe de estado.
01:42E essa expressão, medida de exceção, ela se consagrou na luta liberal e democrática contra o regime militar. O general, ou o senador Paulo Grossar era um dos grandes, o doutor Ulisses aqui, então está aqui, ou seja, o general falou claramente, porque estão falando que não teve golpe de estado.
01:59Foi só uma brincadeira. Um foi passear lá com o pato dono, abraçar o Mickey, né, enquanto estavam destruindo, pela primeira vez na história, foi o pior ato da história do Brasil, o nosso dia da infâmia.
02:11Se nos Estados Unidos é o Pearl Harbor, o nosso foi o dia 8 de janeiro de 2023. Não podíamos diminuir isso, achar que isso é engraçado, isso é trágico, é trágico e tal correndo.
02:21Nós estamos assistindo porque tem democracia, porque se eles tivessem ganhado, nós não estaríamos aqui. Eu, com certeza, não estaria.
02:28Então, eu coloco ao senhor, doutor Jorge, na hora que aquilo desmontou outras defesas, porque as defesas estão tendo ensaiadas, dizendo, não, não aconteceu nada, o que é isso?
02:38Você veja, o Jair Bolsonaro é ótimo, chamou o ministro Alexandre Moraes no dia 7 de setembro de 21, a 200 metros daqui de canalha.
02:48E veja que homem forte. No dia do depoimento, convidou ele para ser vice-presidente da sua chapa em 26.
02:55Isso quando aquele, o ministro relator, era presidente do TSE, ele estava suspenso com seus direitos por 8 anos.
03:02Olha o delírio e os tremens que eles vivem. Eu passo ao senhor, como é que fica esse momento?
03:09Porque é um momento bonito da ministra Carmen Lúcio, eu achei, ela realmente levando a sério, prestando atenção nas tentações orais, e pegou um ato falho, diria alguém.
03:20Ah, o senhor falou demover 5 vezes. Demover de quê? Demover de qualquer medida de exceção.
03:26Então, Vila, aliás, essa é a riqueza da oralidade, quando ela é permitida no processo penal civil brasileiro, que é essa, esse debate, romper o formalismo, fazer a pergunta,
03:39por isso que eu acho muito interessante quando o ministro, em julgamento, também faz a parte em relação a outro ministro.
03:44Porque é isso que é o interessante num debate que está sendo falado, que está sendo oral.
03:48Porque senão todo mundo depositava o voto no sistema e seria muito mais rápido e mais econômico.
03:54E quando fala de medida de exceção, talvez um dos maiores gênios do direito mundial, apesar de ser um gênio maligno, que é o Carl Schmitt, ele foi o maior teórico sobre a exceção.
04:04Que é um alemão considerado, entre aspas, um dos...
04:07O teórico do nazismo.
04:10O nazismo, perfeito.
04:11O teórico do autoritarismo, o inimigo de Weimar.
04:13E ele dizia, a exceção é a maior força que a política e o direito conhecem.
04:20Pela exceção, você funda o direito e você destrói uma ordem jurídica.
04:24Por isso que ele fala que o poder constituinte é o poder por exceção, por excelência.
04:27Que ou ele destrói uma ordem jurídica e funda uma nova, ou ele, quem tem a força da exceção, é quem, vamos dizer assim, controla o sistema.
04:36Por isso que ele é soberano, é quem decide sobre o estado de exceção.
04:40Na visão de Schmitt, que era nunca o judiciário, era sempre o Führer.
04:43Que era o grande debate que ele teve com outro gênio do direito, esse um democrata, que era Kelsen.
04:48Porque Kelsen cria a ideia do Supremo, como a gente tem hoje, uma criação desse alemão, austríaco-alemão, Hans Kelsen,
04:55que cria uma ideia de uma corte para ser a intérprete da Constituição.
05:00Que é, vamos dizer assim, uma resposta ao que foram os horrores das guerras mundiais,
05:05que é a ideia de uma instância para controlar, vamos dizer assim, os atos, inclusive, os atos do líder da nação.
05:13É essa, por isso que medida de exceção, realmente a expressão é uma coisa bastante grave.
05:19Então, quando a gente fala de exceção, a gente está falando de ruptura, golpe de estado.
05:24Então, essa fala, com certeza, ela impactou não só os julgadores, mas impactou provavelmente todo mundo que estava ali, né,
05:30os advogados dos demais correus e assim sucessivamente.
05:33Posso fazer uma parte?
05:35Claro, claro.
05:36Porque me parece que essa questão é fundamental.
05:40A ditadura civil-militar de 64, ela teve 17 atos institucionais, que eram atos de exceção,
05:49mas ela não ficou somente nos atos institucionais.
05:53Por exemplo, nós que fomos estudantes no período da ditadura, Vila,
05:57nós sabemos que existe um decreto chamado decreto 477.
06:00Exato.
06:00Que autorizava, por exemplo, a ditadura, autorizava entrar um agente infiltrado da ditadura, um policial,
06:12tirar o aluno da sala de aula e levar para o DOICODE, levar para a tortura.
06:19E isso aconteceu em inúmeros casos, né, a gente tem desaparecidos, né, nessas circunstâncias,
06:28que eram com a utilização do decreto 477.
06:32Portanto, a gente tem medidas de exceção que vão além dos atos institucionais.
06:38Então, quando a gente fala o que era ditadura, o que era censura, eu me recordo quando liberaram os filmes, né,
06:49em 1979, eu tinha 18 anos, eu fui ao cinema assistir Encoraçado Potemkin.
06:57É um filme clássico do Sergei Eisenstein e que não faz nenhum sentido ele ser proibido.
07:04Mas também foi proibido Jevou Falou Marie, também foi proibido, né, inúmeros filmes nacionais, inúmeras músicas.
07:13Né, a música Cálice, né, do Chico Buarque tinha que ser cantada de outra forma.
07:19Ele foi tão censurado, tão censurado, que ele começou a escrever com um pseudônimo.
07:24Julinho D'Adelaide.
07:25Julinho D'Adelaide.
07:26Né, quer dizer, então, as pessoas não têm noção do que é uma ditadura.
07:32E é importante a gente lembrar sempre, e eu sempre digo isso pros meus alunos,
07:36a ditadura não é isso que eles estão dizendo que é.
07:39Aliás, não faz nenhum sentido.
07:41Se hoje nós podemos debater aqui, com opiniões diferentes, o mesmo fenômeno,
07:47é porque nós estamos numa democracia.
07:50Então, é importante a gente ver o que que é, como é que a gente interpreta esses atos de exceção.