França mergulha em crise política; entenda como saída de outro primeiro-ministro agrava situação

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A renúncia de Sébastien Lecornu mergulha a França em incerteza política e econômica, afetando a confiança dos investidores e ampliando o risco de instabilidade na União Europeia. O consultor de investimentos Leandro Benincá, da API Capital, analisa o impacto da crise francesa, o endividamento de R$ 3,3 trilhões e o possível avanço do euroceticismo no país.

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00:00A renúncia do primeiro-ministro francês, Sébastien Lecornu, mergulha o país em uma nova e profunda crise política e econômica,

00:09podendo respingar e afetar toda a União Europeia.

00:13Para me ajudar a entender o que tudo isso significa, eu converso agora com o Leandro Benicá,

00:19que é consultor de investimentos da A-Pay Capital,

00:23a quem eu desejo uma ótima madrugada para o Benicá, que sempre muito gentil,

00:31ele é um sony, porque ele já está, ele está na França, vai falar de economia francesa conosco,

00:37direto da França, que está aí cinco horas, se eu não estou falhando na memória,

00:43a nossa diferença das franjas horárias aqui, do nosso fuso horário, está cinco horas na frente,

00:49já é aí madrugada estendida, mas o Benicá está ali em pavido colosso para conversar conosco.

00:58Obrigado, Leandro, mais uma vez.

00:59Já te passo a palavra, que é o seguinte, e agora, hein?

01:02O que é o day after aí na França? Por quê?

01:06O Lecornu, menos de um mês no cargo, ele não conseguiu receber nem o salário...

01:11Não conseguiu receber nem o salário completo de primeiro-ministro.

01:16O gabinete que ele tinha que montar já foi desmontado.

01:21Então, você tem agora uma areia na engrenagem.

01:24O que vai ser aí de um futuro próximo, o resto da semana na França?

01:29Vou te passar esse exercício de futurologia.

01:33Marcelo, Marcelo, muito obrigado pelo convite mais uma vez.

01:35É sempre um prazer estar com você aqui.

01:37Não tem como a gente fazer muito horário francês tão conectado ao Brasil, né?

01:41Com clientes no Brasil.

01:42Então, o horário é brasileiro.

01:43Apesar de ser duas da manhã aqui, para mim é nove e meia da noite e vamos lá.

01:48Mas é isso aí.

01:48Lecornu nem esquentou o banco, né?

01:5127 dias, ele tinha acabado de anunciar a equipe.

01:54O pessoal nem chegou a ser empossado, né?

01:57O plano dele ia ser apresentado amanhã,

02:00mas ele mesmo já presenciou ali por dentro que governabilidade é uma coisa impossível para a França neste momento.

02:10E o que acontece?

02:10Se a gente não tem governabilidade, a gente não consegue passar nenhum projeto.

02:15A França está muito fragmentada, como vocês já disseram.

02:18A política francesa está muito fragmentada no poder.

02:22E na população a gente tem mais ou menos duas camadas, né?

02:25Quem é mais politizado está tendendo mais para o lado do partido mais à direita de todos.

02:33Eu não gosto muito da palavra extrema, mas é o mais à direita de todos,

02:36que é o partido da Marilene Pen.

02:38Quem é mais politizado está pendendo para isso.

02:41Nas pesquisas, saiu uma pesquisa ontem, inclusive,

02:44dando larga vantagem para os partidos mais para esse lado.

02:48Mas a população francesa está meio numa sensação de apatia política,

02:53de que, poxa, ninguém presta.

02:54Aí, como a gente tem muitos partidos e está tudo muito fragmentado,

02:58como é que o governo vai passar alguma confiança para quem vai investir?

03:02É você, o caso que a gente falou aquele dia,

03:04a gente tem dois primos aí pedindo dinheiro emprestado.

03:07Um paga sempre direitinho, está sempre com o salário em dia,

03:10está sempre com as contas em ordem.

03:12O outro começou a dar calote na praça, começou a enganar aqui e ali.

03:15Você não sabe mais onde ele está, você não sabe mais que horário ele chega.

03:18Você vai emprestar dinheiro para ele?

03:19Se for para emprestar, você vai pedir um juro muito caro para esse empréstimo.

03:22É isso que o mercado está olhando.

03:25Poxa, se é para emprestar dinheiro para a França,

03:27que não consegue nem arrumar a própria casa,

03:29a gente tem que pedir um juro muito mais alto.

03:32E aí o score, a nota do Serasa ali, o score de crédito da França,

03:36está caindo cada vez mais.

03:38Já vinha perdendo para países que, historicamente,

03:41são os primos caloteiros, tipo a Grécia, tipo Portugal.

03:44Já vinha com notas mais baixas e com taxas de juros,

03:49o mercado pedindo taxas de juros mais altas.

03:52Agora deu uma pioradinha.

03:54Parece que nenhuma solução está realmente em vista.

04:00O Macron vai pedir mais um primeiro-ministro?

04:03Não vai passar mais nada, de qualquer jeito.

04:05Se ele tentar agradar os partidos de minoria hoje,

04:09que são os partidos de esquerda,

04:11nem esses partidos estão chegando num consenso.

04:14Eles fizeram uma união, o Partido Verde, os Comunistas e os Socialistas,

04:17que são os três partidos mais à esquerda,

04:20e eles não conseguem chegar num consenso.

04:22Parece que é uma briguinha, os jogos escolares,

04:25e aí todas as quintas séries estão brigando para ver quem tem o melhor time.

04:29E ninguém quer passar o projeto do outro.

04:32Então, o mercado, diante disso, está dizendo, aparentemente, França não.

04:38A questão, né, Benicá, é que não é que o Emmanuel Macron está nos últimos dias do mandato,

04:44ele já é aquele chamado pato manco, já largou a mão.

04:48Ele tem dois anos praticamente, tem 2026 inteiro para uma troca de comando em 2027.

04:57Temos um largo tempo ainda na segunda maior economia da Europa,

05:01segunda maior economia da zona do euro, segunda maior economia da União Europeia.

05:05E aí, né, sabendo que o nosso canal aqui tem esse DNA de negócio,

05:09é aí que eu quero chegar.

05:10Os números são muito desfavoráveis quando a gente olha o tamanho da dívida,

05:14e essa questão política, ela está diretamente ligada às questões econômicas,

05:18porque, seja de direita, seja de esquerda, seja de centro,

05:22a França vai ter que cortar gastos para diminuir esse déficit

05:27em que o governo gasta mais do que arrecada.

05:30Agora, olhando para os números, né, a dívida...

05:34Uma dívida enorme, né, R$ 3,3 trilhões.

05:35Pois é.

05:35Dívida gigantesca.

05:38E você, como economista, vai entender isso muito bem.

05:42O que isso pode causar de problemas a curto prazo, médio prazo, se quiser colocar,

05:49e principalmente se isso pode vir contaminar a zona do euro,

05:54os mais de 20 países, quase 30, e nós estamos falando da segunda moeda mais importante

06:02em valor de mercado, né, em aceitação no mundo inteiro.

06:05O desafio, Benica, é o seguinte, que a gente tem mais uns dois minutos de conversa só.

06:10Vamos tentar rapidinho, então.

06:12O que acontece?

06:13Como o mercado está muito receoso, a taxa de juros é o principal indicador,

06:19ou seja, o governo precisa se financiar, o governo precisa de dinheiro emprestado.

06:22Então, no curto prazo, o que a gente já está vendo é o dinheiro ficando mais caro.

06:28Para o próprio governo, e aí vem pagamento de juros ficando como o maior dos gastos do governo,

06:34que a gente já está vendo isso também no Brasil, isso já está acontecendo.

06:38Curtíssimo prazo, isso já é realidade, não é nem impacto futuro.

06:42Isso já está acontecendo e tende a piorar.

06:44A médio prazo, a gente tende a ver, se isso não se equalizar logo,

06:49esses processos de resgate.

06:52De fundo monetário internacional, da própria Comunhão Europeia,

06:56que aí vão fazendo que isso vire um ciclo vicioso, cada vez pior, cada vez mais desconfiança.

07:02E aí, a mais longo prazo, a gente pode chegar a rupturas muito traumáticas,

07:07porque a França não é dos países que costuma tratar as coisas da forma mais pacífica,

07:13quando o assunto é política que não está agradando a população.

07:15Eles vão pra rua e tocam fogo nos pejôzinhos.

07:19Então, a gente pode tender a ver rupturas muito fortes sociais, movimentos sociais,

07:25beirando guerra civil, se isso não se resolver, porque vai quebrar a empresa,

07:31vai começar a derrubar a economia de um país que é importante demais pra quebrar.

07:36Leandro, a gente tem mais alguns segundos, eu vou esquentar a batata, jogar pra você descascar,

07:41ela quente rapidamente.

07:43Você que está aí, né, está fazendo um trabalho de analista,

07:46olha a política, tem esse faro fino para a economia,

07:50mas se tornou aí um cidadão europeu, um cidadão francês.

07:53Esse sentimento de europoceticismo, ele ainda tem guarida na França, né?

08:02A Marine Le Pen, que é o principal expoente, o a principal expoente dessa direita mais conservadora,

08:10mais dura, mais tradicional, falava muito de tirar a França da zona do euro.

08:16Depois da experiência do Brexit, senti que ela deu uma atenuada nesse discurso.

08:21Você sente que isso pode voltar agora?

08:24Pode, pode voltar sim, e nem é um discurso só da extrema-direita, né, do partido da Marine Le Pen,

08:32porque acaba que esse ceticismo, principalmente entre as camadas mais jovens,

08:38está se espalhando muito.

08:39A sensação, e a imprensa francesa fala disso, a sensação entre os mais jovens é de apatia.

08:44É de que, assim, político nenhum presta, nenhuma medida vai dar certo,

08:49Então, se você tirar as pessoas que são mais politizadas, que têm os seus espectros políticos,

08:53essa sensação de apatia vai dando cada vez mais combustível

08:58para que a população simplesmente não se importe mais pela organização,

09:03por exemplo, que é uma organização 100% política, como a zona do euro.

09:07E aí isso pode levar a um apoio popular gigantesco para um rompimento, como foi o Brexit, né?

09:12A gente tem um Frexit aí no futuro.

09:15Obrigado pelo teu olhar, eu sei que a gente vai contar com as suas informações sempre muito precisas,

09:22análises, assim, sutis e muito bem posicionadas.

09:29Queria agradecer publicamente a conversa que eu tive com o Leandro Benicá,

09:32consultor de investimentos da API Capital.

09:36Uma boa noite, bom dia para você aí, já é terça-feira na França,

09:41Agora vai descansar, Benicá.

09:43Até uma próxima.

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