Qual o interesse de Donald Trump nas eleições de 2026? No Visão Crítica, os cientistas políticos Eduardo José Grin e Paulo Niccoli Ramirez analisam se os EUA devem interferir na política brasileira. Niccoli defende que, como “Trump não joga um jogo que não vai ganhar”, ele não deve se envolver na disputa e que a aproximação com Lula na ONU pode indicar uma aliança pragmática.
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00:00Haverá uma presença norte-americana aqui na eleição de 26? Isso é possível ou é isso, na verdade, é um sonho de uma noite de verão, especialmente para o extremismo?
00:11Vila, eu acho que a presença da norte-americana, a presença deste governo Trump, para ser mais preciso, eu, em primeiro lugar, te diria que o governo Lula, o governo Lula 3, ele vinha até então com uma marca de governo muito fraca, né?
00:34Programas sociais requentados, como Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida, o PAC, programas esses que a sociedade brasileira, ou pelo menos o público que os recebe, já os identificam não mais como uma inovação, mas como direito conquistado.
00:50E, de repente, cai no colo do governo uma série de questões que vão gerando alguma marca que esse governo não tinha.
00:57A primeira foi, de maneira um pouco desorganizada, e de novo, por um desastre do Hugo Mota, não ter colocado a discussão do IOF em pauta, que gerou a narrativa de um congresso que quer proteger os ricos e um governo que quer proteger os pobres, né?
01:13Travestido na discussão da justiça tributária.
01:15E, logo mais adiante, a extrema-direita, com a sua estratégia profundamente equivocada, achando que um sopro do presidente Trump ia fazer o Supremo Tribunal Federal ficar com medo e voltar atrás do processo que levou à condenação do ex-presidente Bolsonaro,
01:34que jogou no colo do presidente Lula, de presente, a segunda grande narrativa para gerar uma marca, tanto é que o governo mudou seu slogan, que era União e Reconstrução, para o governo do Brasil do lado do povo brasileiro, ou do lado dos brasileiros.
01:51Então, o governo ganhou uma narrativa muito significativa, lembrando, né?
01:57Nós estamos aqui diante de você, um grande historiador, que, historicamente, a visão dos Estados Unidos no Brasil, sobretudo por aquilo que, popularmente, todo brasileiro, brasileira, digamos assim, já ouviu falar,
02:14deu apoio ao golpe militar de 64, ajudou na ditadura militar, um dos Estados Unidos que sempre adotaram a ideia de que a América do Sul e o Brasil eram parte do seu quintal,
02:25e a extrema-direita reforça, dando de presente para o governo Lula essa narrativa de que ele, Lula, é o homem forte que vai defender o Brasil contra a invasão estrangeira,
02:39contra a tentativa dos Estados Unidos de interferir na nossa política interna.
02:44Dito isso, eu acho que tem dois cenários possíveis para responder a tua pergunta.
02:49A primeira é, um cenário que eu acho, e os dois cenários são prováveis, um deles, a meu juízo, mais do que o outro.
02:57Qual que eu acho que é o cenário mais provável?
03:02Ano que vem, nós vamos ter uma enorme atuação das big techs nas eleições, as redes sociais.
03:11Fake news, proliferação de inverdades e uma série de narrativas que vêm se intensificando.
03:17E isso significa dizer que várias dessas empresas que hoje estão diretamente vinculadas ao projeto empresarial político do governo Trump
03:29vão dizer que estão sendo possivelmente cerceadas pela justiça brasileira,
03:33e isso vai afetar não só a campanha, como vai respingar no governo Lula.
03:39Então, acho que um cenário mais provável é que nós venhamos a seguir,
03:45durante esse período que antecede as eleições e no ano que vem,
03:49com o governo americano buscando colocar de novo em execução uma nova visão requentada da chamada doutrina Monroe.
03:59Este quintal aqui é nosso e nós não admitimos que haja nenhum tipo de interferência em relação ao que está acontecendo
04:07e vamos buscar atuar para que nós tenhamos um governo que seja eleito conforme aquilo que nós imaginamos.
04:15Eu sou daqueles que acho, sim, que o governo Trump tem todo interesse em fazer uma mudança não só de governo no Brasil,
04:21mas, idealmente, falando até de regime, porque o Trump não é um democrata e conviver com democratas é uma coisa que lhe incomoda.
04:29Por isso que ele se dá bem com o Putin, se dá bem com o Bekele, o Bukele lá de El Salvador e por aí vai.
04:35O segundo cenário que pode acontecer, e esse eu acho menos provável, talvez, digamos assim, um cenário um pouco mais benigno.
04:43Vai que essa química que rolou entre os dois se deslobe, de fato, em alguma normalização mínima das relações econômicas
04:52e, com isso, Trump entenda que não faz muito sentido interferir na política brasileira?
04:57Não porque ele não quisesse, mas porque isso lhe gera problemas internos, que é o aumento da inflação
05:03e, portanto, ele, Trump, ano que vem enfrentará uma eleição de meio período,
05:08no qual metade da Câmara dos Deputados e um terço do Senado será eleito.
05:13E, historicamente, presidentes americanos que vão mal na condução da economia
05:18viram chamados patos mancos na segunda parte do seu mandato.
05:22Então, pode ser que, diante não da sua falta de intenção de interferir na democracia brasileira,
05:28mas olhando para o seu projeto de poder nos Estados Unidos,
05:32quem sabe nós venhamos a ter uma interferência menor no ano que vem.
05:36Mas eu ainda sigo apostando que nós seguiremos falando da relação bastante abusiva,
05:42da relação que quebra barreiras diplomáticas civilizatórias entre países,
05:49que é o que vem fazendo os Estados Unidos e buscando interferir nas nossas instituições políticas.
05:54Me parece que esse deve ser o cenário que ainda vai marcar a relação entre os dois países
05:59durante um bom tempo.
06:00Paulo, sobre essa questão.
06:03O professor Eduardo fez um excelente diagnóstico, né?
06:06Mas, por exemplo, uma ruptura institucional
06:08auxiliada pelos Estados Unidos hoje no Brasil é muito difícil, né?
06:13Porque a gente pode dizer que o fato das Forças Armadas não terem apoiado o golpe de Bolsonaro em 2022
06:20mostrou um amadurecimento institucional, né?
06:23As nossas Forças Armadas que foram marcadas anos e mais anos em eventos históricos terríveis, né?
06:29De ruptura institucional, dessa vez não embarcaram nessa aventura.
06:33Então, o Trump não teria, digamos assim, um apoio militar, né?
06:37De tropas brasileiras a favor de um golpe aqui no Brasil, né?
06:42Não sei se jogasse um míssil nuclear, mas também não ia ter mais escoação de produção, né?
06:48Para os Estados Unidos, né?
06:50Agora, o Trump, junto com as big techs, poderiam, sim, perfeitamente intervir sobre o processo democrático, né?
06:57Com fake news, enfim, tantas notícias distorcidas da realidade.
07:04Mas o Trump também, pelo menos o que ele mostra nos seus discursos,
07:07é que ele não entra para jogar num jogo que ele não vai ganhar, né?
07:12Em que ele precisa saber que vai lucrar em um cenário, de fato, previsível e favorável, né?
07:20Para que os Estados Unidos e sua imagem sejam favorecidas.
07:24Mas, diante dos candidatos, ou da ausência de candidatos de direita, né?
07:29Qual que é o sentido, né?
07:30De manter o apoio aos extremistas brasileiros aqui, né?
07:36Não faz sentido.
07:37De modo que o caminho mais saudável e que faz com que as duas nações saiam, de alguma forma, com logros,
07:47é exatamente partir para a negociação.
07:49E o Trump deu essa sinalização na segunda-feira, quando abraça o governo Lula e, em plena tribuna da ONU,
07:57faz um discurso totalmente inesperado, né?
08:00Faz alguns segundos, né?
08:01De elogios e afagos ao presidente Lula.
08:04Então, eu diria que, hoje, o cenário, né?
08:09Para o bolsonarismo, para tentativas de rupturas institucionais, é uma visão falida.
08:16Seja pela decisão do STF, seja já em 2023, né?
08:20No 8 de janeiro, as Forças Armadas não terem embarcado nessa aventura.
08:26Os congressistas estão recuando, o Senado é totalmente contra qualquer modificação na legislação para favorecer o retorno de Bolsonaro.
08:37Enfim, então, dificilmente Trump tem um cenário favorável aos Estados Unidos aqui no Brasil na eleição do próximo ano.
08:46O caminho mais racional e razoável é negociar com o governo brasileiro.
08:52E me parece que foi um engano tremendo receber essa influência do Eduardo Bolsonaro.
08:59Ele vendeu um produto muito maior do que tinha aqui no Brasil, né?
09:03Porque, certamente, o que o Eduardo Bolsonaro deve ter mostrado aqui, era muito maior o bolsonarismo do que é hoje.
09:10E a capacidade de influenciar a política brasileira.
09:14Talvez tenha sido no passado recente, mas hoje o bolsonarismo está no fundo do poço.
09:21Vive o pior momento possível, né?
09:23E vale dizer que também candidaturas fortes geralmente são construídas a longo prazo.
09:30Bolsonaro, por exemplo, quando se lança a candidatura para 2018, ele já anunciava isso em 2014.
09:38Quando o Aécio Neves era o candidato ali do centro, da direita, né?
09:43Agora, nós não temos, faltando praticamente o ano para a eleição, ninguém que você veja e diga
09:48esse sujeito vai ser um candidato forte, né?
09:51E o Bolsonaro, apesar de no começo ter, nas pesquisas, um baixo índice,
09:56a gente sabe que nas redes sociais ele tinha uma grande comoção.
10:01Assim como em vários programas de TV que ele frequentava.
10:04Mas hoje você não tem nenhum candidato com essas características, né?
10:07Com viralizações na internet, né?
10:11Que seja de direita, que tem uma grande amplitude.
10:15A gente não tem também políticos de direita midiáticos, né?
10:20Que frequentam programas de talk show, de humorísticos, como o Bolsonaro foi no passado, né?
10:27Então é um cenário totalmente desfavorável.
10:29Por isso mesmo que, diante do fato de que Trump não joga um jogo em que não sabe que vai ganhar,
10:36ele vai diretamente intervir sobre a eleição brasileira, né?
10:40Talvez ele espere ver o que vai acontecer.
10:43O governo Lula também não é um governo radical de esquerda, longe disso, né?
10:47Eu tenho vários colegas que são radicais de esquerda que chegam a dizer que o Lula é a direita da esquerda, na verdade, né?
10:53Pelas negociações que faz, pela composição que tem do governo, né?
10:58Os velhos acordos com o Centrão.
11:00Então o Lula também não é uma ameaça comunista, né?
11:03Inclusive hoje quem acredita em comunismo não são nem mais os comunistas, né?
11:08É a extrema direita, né?
11:09Que caiu numa paranoia absurda, né?
11:12De acreditar que vão acabar com a propriedade privada, com a família, né?
11:18Aquela história de kit gay, etc.
11:20Então essas narrativas também se esgotaram, né?
11:22Hoje o bolsonarismo é muito mais um meme do que necessariamente uma posição política.
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