A antiga Camargo Corrêa, hoje Mover, busca reestruturação após admitir corrupção na Lava Jato. Com R$ 1,4 bilhão em multas renegociadas e ativos despencando de R$ 15,5 bilhões para R$ 4,2 bilhões, a empreiteira enfrenta desafios de reputação e mercado. Análise com dados e impactos no setor.
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00:00A empreiteira antes conhecida como Camargo Corrêa, que admitiu ter participado dos casos de corrupção revelados pela Lava Jato,
00:07pode se beneficiar da repactuação dos acordos de leniência firmados no âmbito da operação.
00:14A mudança nas multas a serem pagas se tornou possível depois da anulação de partes da Lava Jato pelo Supremo Tribunal Federal.
00:21A eventual redução dos valores, entretanto, não tem se mostrado como garantia da recuperação financeira da Camargo Corrêa, agora rebatizada como Mover.
00:32Uma das principais empresas envolvidas nos escândalos descobertos pela Operação Lava Jato,
00:51a Camargo Corrêa foi a primeira grande empreiteira a admitir que tinha responsabilidade nos casos de corrupção.
00:59A confissão de culpa também fez o grupo ser pioneiro na celebração de um novo tipo de acordo,
01:11como explica a advogada Samanta Meyer, especialista em direito econômico.
01:16A lei que prevê o acordo de leniência surgiu em um contexto internacional de luta de combate à corrupção.
01:23Ela surge no momento em que as empresas estavam acostumadas com outro sistema punitivo, digamos assim.
01:29Se você fosse advogada de uma empresa e estivesse respondendo a uma ação penal, qual seria o seu objetivo?
01:33Fazer com que esses processos fossem os mais longos possíveis, as punições as menores e a empresa sofresse os menores danos.
01:40Com a Lava Jato, que há uma mudança de paradigma e com o surgimento dessas novas leis,
01:44a punição veio muito rápido, inclusive, para os dirigentes dessas empresas.
01:48E aí o acordo de leniência aparece como um instrumento importante, num primeiro momento, para a manutenção dessa empresa.
01:57Com atuação relacionada a investigações de compliance e anticorrupção,
02:02Beatriz Yocota explica que o acordo de leniência seria uma versão da colaboração premiada voltada para pessoas jurídicas.
02:10Os acordos de leniência são instrumentos de negociação que permitem a um ente privado que tenha tido alguma conduta ilícita em relação ao Estado,
02:22de endereçar esses pontos e ter um benefício, uma redução da sanção,
02:27ou outros benefícios relacionados a não ter declaração de suspensão ou de inidoneidade.
02:34Os primeiros acordos firmados pela Camargo Correia foram com o Ministério Público Federal
02:41e com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o CAD, em 2015.
02:47Neles, a empresa se compromete a cooperar com o Ministério Público Federal e pagar uma multa de 700 milhões de reais.
02:54Mais tarde, em 2018, o grupo fechou um acordo de leniência com a Controladoria Geral da União,
03:03quando o valor total a ser pago, entre ressarcimento e multas, aumentou.
03:08Chegou a quase 1 bilhão e 400 milhões de reais.
03:14Apesar de vultosos, os valores cobrados da Camargo Correia foram menores do que aqueles acordados
03:20com outras grandes empreiteiras envolvidas na Lava Jato.
03:24Odebrecht, OAS e Andrade Gutierrez terão que pagar mais do que o grupo da família Camargo.
03:33Quando você é a primeira, você apresenta mais provas e apresenta também elementos
03:37que podem comprometer as demais empresas.
03:40O acordo prevê o pagamento em 24 parcelas anuais.
03:45Mas para a advogada especialista em direito internacional, Gisele Soares,
03:50não garante o ressarcimento total do que foi desviado.
03:55Houve uma recuperação financeira relevante, foi importante,
03:59porque também foi uma primeira grande operação que envolveu muitos servidores públicos,
04:05o judiciário de uma forma muito ativa.
04:08Mas a recuperação financeira, em termos de montante de valores do que foi desviado
04:14para o que foi recuperado, foi muito pequeno.
04:17Em 2023, depois da anulação de parte dos processos da Operação Lava Jato
04:23pelo Supremo Tribunal Federal, por questões técnicas,
04:27partidos políticos entraram com uma ação para a refactuação dos acordos de leniência,
04:32com a justificativa de que eles eram considerados demasiadamente prejudiciais às empresas.
04:39A empresa que sofre um processo, um acordo de leniência, um processo como o da Lava Jato,
04:44ela perde valor no mercado, as instituições privadas não querem emprestar dinheiro para elas.
04:49Se tem debêntures emitidas, podem antecipar o pagamento dessas debêntures.
04:54Então há um impacto e aquela realidade de faturamento,
04:58principalmente nessas empresas que eram do setor estratégico de construção, não é a mesma.
05:02O ministro André Mendonça, que relata a ação, pediu uma conciliação entre a CGU e as empresas
05:09e foram acertadas mudanças no acordo, que ainda precisam da homologação do STF.
05:16Uma coisa é o ressarcimento do prejuízo.
05:19Esse é inegociável.
05:21Então se estabeleceu que determinados contratos foram superfaturados em 10%, em 15%, em 5%,
05:27essa questão do superfaturamento pela CGU, pela AGU, essa questão é inegociável.
05:34O que se está aí se repactuando é o valor da multa em cima disso, da punição das empresas.
05:42Em nota, a Controladoria Geral da União garante que nenhuma das alterações importou em perdão
05:48ou diminuição dos valores inicialmente acordados.
05:51As novas negociações importaram na possibilidade de uso de créditos de prejuízo fiscal
05:58para abatimento do saldo devedor em aberto e no reparcelamento dos débitos.
06:04Em meio às denúncias, acordos de leniência e processos abertos depois da Operação Lava Jato,
06:11a Camargo Correia começou a se reestruturar.
06:14Em 2016, as herdeiras diretas de Sebastião Camargo saíram de cena.
06:21Rosana Camargo de Arruda Botelho, Renata Camargo Nascimento e Regina de Camargo Pires Oliveira Dias
06:28passaram o controle para a terceira geração da família.
06:34Três netos de Sebastião e os maridos de duas netas do antigo dono
06:39assumiram a empresa e se afastaram das obras públicas.
06:44Dois anos depois, decidiram mudar o nome da holding.
06:49O grupo Camargo Correia se tornou Grupo Mover.
06:53As empresas mudam de nome por várias razões.
06:57A Mover, eu acredito, o que se cogita no mercado é que houve uma reestruturação da empresa
07:03por conta das consequências das próprias operações, principalmente da Lava Jato.
07:07Então, por questões reputacionais e também porque a empresa fez ali uma reorganização.
07:15Então, ela muda sua marca, muda seu nome, muitas vezes muda o seu objetivo social também.
07:21Acaba que as pessoas esquecem qual era a empresa processada e você busca dizer que agora você tem uma nova empresa,
07:28com novas regras de compliance, com maior programa de integridade.
07:33Isso é válido para a sobrevivência da empresa.
07:36No caso do Grupo Mover, a estratégia não parece ter dado certo.
07:40Entre 2010 e 2023, o ativo total da holding caiu de R$ 15,5 bilhões para R$ 4,2 bilhões.
07:50Enquanto o patrimônio líquido, que em 2013 ultrapassava R$ 9,5 bilhões, passou a ser negativo em R$ 87 milhões.
08:02Se a empresa entrou em crise econômico-financeira, houve uma má gestão.
08:08Houve alguma situação ali que impediu aquela empresa.
08:12Claro, crises externas também podem impactar e a empresa pode sofrer uma crise.
08:17Mas, normalmente, sim, isso vem combinado com alguma falha de gestão.
08:22Ou muitas falhas combinadas e aí, então, a empresa entra em crise.
08:47Sobre a reportagem, recebemos o seguinte posicionamento do Grupo Mover.
08:53A nota diz ainda que, abre aspas,
09:12A repactuação do acordo tem como objetivo adequar as condições financeiras para o pagamento dos compromissos assumidos,
09:20considerando o cenário adverso enfrentado por todo o setor de construção,
09:25que sofreu os impactos combinados da pandemia, do aumento expressivo dos custos de insumos
09:31e da elevação das taxas de juros e incidentes sobre os valores acordados.
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