A Suprema Corte dos EUA analisa se Donald Trump ultrapassou seus poderes ao impor tarifas comerciais sem aval do Congresso, baseando-se na Lei de Emergência Econômica de 1977. O professor Alexandre Pires e o analista Vinícius Torres Freire avaliam o impacto político e econômico dessa decisão para o governo Trump e para o comércio global.
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00:00A Suprema Corte dos Estados Unidos está acolhendo os argumentos do governo de Donald Trump
00:05sobre a legalidade das tarifas comerciais aplicadas a dezenas de países, entre eles o Brasil.
00:12No começo do ano, Trump invocou os poderes de uma base legal de 1977,
00:18a Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional.
00:21Com base nesse dispositivo, o governo passou a aplicar as tarifas sem submetê-las à análise do Congresso.
00:28Os tribunais de primeira instância decidiram que a lei não concede esses poderes ao presidente.
00:33E o caso foi parar na Suprema Corte.
00:36Vamos falar sobre esse assunto com o Alexandre Pires, professor de Relações Internacionais e Economia do IBMEC São Paulo.
00:43E para essa entrevista, nosso analista Vinícius Torres Freire também já está aqui.
00:47Tudo bem, Vinícius? Boa tarde.
00:48Boa tarde, Fábio.
00:50Alexandre, boa tarde a você. Muito obrigado pela sua participação aqui.
00:52Alexandre, a gente tem aí um julgamento que é sobre limites presidenciais, limites à autoridade de um presidente,
01:00exatamente envolvendo um presidente que desafia limites.
01:03É um caso emblemático, não?
01:05Sim, o Donald Trump tem recorrido ali a muitos momentos à Suprema Corte de modo bem sucedido.
01:14Esse parece ser o teste de fogo em um alinhamento entre a Suprema Corte e, claro, a presidência dos Estados Unidos.
01:22É um caso mais forte, mais consistente.
01:24E teve agora, nessa audiência, o lado das empresas, ou seja, a ideia de como que as tarifas estão pesando no civilizar um voto para os juízes conservadores.
01:38Vinícius.
01:39Alexandre, tem uma discussão na mídia americana, quer dizer, tem informações de bastidores na mídia americana dizendo que a Suprema Corte não está gostando nada desse tarifaço via lei de poderes econômicos de emergência.
01:52Por outro lado, a Suprema Corte, como em qualquer corte, inclusive o brasileiro, pode fazer uma modulação da decisão de modo que o impacto no poder do Trump,
02:03nas contas públicas americanas, nas relações diplomáticas americanas, não seja muito grande.
02:08Você acha que sai o quê daí?
02:09Porque o Trump pode ter até que, no limite, poderia ter até que devolver dinheiro, o governo poderia ter que devolver dinheiro.
02:16Isso enfraqueceria seu poder de negociação com alguns países do resto do mundo.
02:24Como é que fica?
02:25Como é que...
02:25É possível que a Suprema Corte dê uma decisão dura?
02:28Claro que o Trump ainda pode recorrer a outras leis, mas seria mais difícil.
02:32É possível que a decisão da Suprema Corte seja dura ou modulada de um modo a não causar muito distúrbio para o Trump?
02:39Esse mecanismo já foi aventado pelo Trump lá no início, ele não fez isso no primeiro governo, agora conseguiu fazer.
02:47Como você colocou, existem outros caminhos para ele tarifar, talvez com um teto, com uma limitação.
02:55A outra legislação econômica colocaria um teto para ele.
02:59Essa não coloca teto algum, mas pelo que nós sentimos nessa primeira fala dos juízes da Suprema Corte,
03:08que é o momento ali que eles fazem questões, tanto para o advogado-geral quanto para os outros participantes da audiência,
03:15os juízes conservadores falaram algo que preocupa muito, Vinícius.
03:19Eles estavam colocando as tarifas como tributos.
03:22E tributos é prerrogativa da Suprema Corte.
03:25E isso mudaria completamente o quadro.
03:27Então tem uma questão de enquadramento realmente legal dessa legislação.
03:33Então caso saísse ali uma derrota para o Trump, toda a estratégia desse segundo governo cairia por terra de imediato.
03:41Só que você bem falou, existe uma questão ligada a reparações.
03:47Os importadores americanos recolheram uma quantidade bilionária de tarifas de modo recorde no período
03:54e isso teria que ser restituído, levando provavelmente a dificuldades nas contas.
03:59Então eu acredito que vai ter, provavelmente são questionamentos duros.
04:04Pode ser que o julgamento se arraste um pouco mais.
04:09E a Suprema Corte, votando ali, indo para uma votação que nós não vamos poder acompanhar,
04:14porque o sistema deles é diferente, é fechada, pode ser que eles decidam ali alguma forma de modulação.
04:21Lembrando que toda modulação ali vai ser difícil, né, Vinícius?
04:24Por quê?
04:25Ou é legal ou não é legal.
04:27Ou a tarifa pode ou não pode.
04:29E teve um ponto que no final foi falado,
04:33tudo que foi relatado por quem acompanhava da imprensa,
04:36é que eles falaram que tarifa não é a mesma coisa de embargo.
04:40Então é como se numa situação de emergência talvez um embargo fosse permitido,
04:45aumento de tarifas não, porque isso cria um tributo sobre os contribuintes.
04:49Então eu acho que isso ainda vai se alongar bastante, Vinícius,
04:52porque não tem um cenário claro.
04:55Outros presidentes já usaram de modo bem mais limitado,
04:59então tem precedentes.
05:00Existem discussões da Suprema Corte bem frágeis que dariam vitória para o Trump,
05:05se fossem baseadas nesses precedentes.
05:08Então está todo mundo em compasso de espera.
05:11Alexandre, os juízes, mesmo os conservadores, como vocês pontuaram aí,
05:17estão mostrando um grande ceticismo em relação ao uso desse mecanismo legal
05:21para embasar essa aplicação via canetada do tarifaço.
05:26Então a gente está vendo ali que mesmo aqueles que em tese
05:28poderiam se posicionar favoravelmente ao governo
05:31por um alinhamento ideológico tão também incomodados com esse tarifaço
05:39e apresentando argumentos ali, inclusive, de muito estranhamento,
05:43até em relação, citando países aliados,
05:45mas por que aplicar esse tipo de tarifa sobre países aliados,
05:48que tipo de ameaça eles oferecem aos Estados Unidos.
05:51Enfim, a gente está diante de um caso que tem uma chance real
05:55de derrubar esse tarifaço.
05:56Você entende dessa forma?
05:58Fábio, tem sim um potencial muito grande.
06:02Por quê?
06:02Você trouxe um ponto importante.
06:05Essa legislação da qual nós estamos tratando,
06:07que é a de emergência econômica,
06:09de fato há uma decretação de um estado de emergência econômica.
06:13E como qualquer estado de emergência, a urgência, a importância
06:16teria que ser consolidada.
06:18E aí, se a discussão for para esse ponto,
06:21seria até uma vitória para o Trump.
06:22Por quê?
06:23O questionamento seria se, de fato, o estado de emergência declarado,
06:30pode, ele, digamos assim, tem méritos para se sustentar,
06:34ou se seria, por exemplo, prerrogativa do presidente
06:37verificar quais são as situações de emergência
06:40que ele teria esse poder sem ter que passar pelo Congresso.
06:43Se a discussão for para essa direção, é uma vitória do Trump.
06:46Olha, discutimos, ele pode impor tarifas,
06:49mas só se houver um estado de emergência que se justifique.
06:53Mas quem define o estado de emergência?
06:55Você fala, não, nesse caso, quem define o estado de emergência
06:58é o próprio presidente, as tarifas ficariam de pé.
07:02Seria, inclusive, uma solução para os juízes conservadores,
07:08porque eles falaram o seguinte, não,
07:10ele não tem liberdade para impor tarifas,
07:13não tem prerrogativa, mas ele tem a prerrogativa
07:15para impor o estado de emergência que o autoriza.
07:17E aí eles voltariam para a situação atual com o status quo.
07:21Há uma grande expectativa sobre qual ponto
07:23dessa legislação, que tem uma certa complexidade,
07:27vai ser discutido.
07:28Alguns pontos vão ser bons para o Trump,
07:31outros, como esse que eu coloquei,
07:33se tarifa é tributo,
07:34e sendo tributo a prerrogativa do Congresso,
07:37não é bom para o Trump.
07:39Alexandre, vamos supor, no caso de a Suprema Corte
07:43colocar alguma limitação do Trump
07:44que exija que ele recorra ao Congresso.
07:48O Trump, por enquanto, tem maioria no Congresso,
07:51deve ficar com maioria, vai ficar com maioria
07:53até o final do ano que vem,
07:54mas tem, às vezes, deputados e senadores republicanos
08:00recalcitrantes, porque é uma minoria que não gosta do Trump
08:02ou que não gosta de imposto,
08:04ou que não queira, talvez, aprovar o imposto.
08:07Qual você acha, então, se parte desse tarifaço
08:10tivesse que ser referendado pelo Congresso,
08:13qual seria a atitude republicana majoritária, você acha?
08:17Passa tudo ou vai ser difícil?
08:20Eu acho que o cenário do Trump não é positivo,
08:23como você colocou.
08:24Ele tem uma maioria,
08:25essa maioria é frágil.
08:27Além de tudo, tem a possibilidade de eu fazer
08:29o que seria ali,
08:32esse bloqueio, né,
08:34que é o filibuster, ou seja,
08:35dentro do Senado, o que não resolve muita coisa,
08:38o próprio Shutdown está colocando aí
08:40como uma dessas questões,
08:41então a maioria sempre é muito frágil,
08:43essa maioria é pequena.
08:45O governo teria que se redesenhar por completo,
08:47nós veríamos um cenário muito mais parecido
08:50com o primeiro Trump, né,
08:52ele se tornaria ali um governo,
08:54um pato manco, né, um sitting dunk,
08:56e isso faria com que o governo perdesse a tração
08:59e muitos dos acordos poderiam cair por terra, né,
09:03ou seja, os parceiros que assinaram agora
09:05poderiam pedir para rediscutir alguns assuntos.
09:10Complicaria completamente o cenário americano,
09:12talvez por isso a Suprema Corte não leve isso
09:20diretamente para o Congresso,
09:21desestabilizaria demais.
09:23E aí tem uma grande questão, né,
09:25porque esse ponto ainda não chegou
09:27e o advogado geral também não trouxe de modo claro
09:30até onde eu vi pelos relatos.
09:33É que, de fato, hoje, no mundo contemporâneo,
09:37a economia se tornou, sim,
09:39um instrumento de competição entre as nações
09:42de modo bastante explícito,
09:44inclusive com a conversão ali de investimentos
09:47e ganhos de exportação para uso militar.
09:50Então, vai chegar a esse ponto,
09:52vai ter uma discussão disso,
09:54e aí nesse aspecto talvez a Suprema Corte
09:56mantenha essas prerrogativas no presidente,
09:59ou seja, pelo fato de um mundo atual,
10:02nós temos países que podem ameaçar os Estados Unidos
10:05usando de artifícios econômicos.
10:08Então, a discussão pode ainda ser ampla,
10:11mas se for para o Congresso,
10:12eu acho que o cenário complica demais.
10:15Esse Congresso não é totalmente confiável
10:17para essa abordagem do Trump a respeito de tarifas.
10:21Falo do Partido Republicano.
10:24Alexandre Pires, professor de Relações Internacionais
10:26e Economia do IBMEC São Paulo.
10:28Muito obrigado, Alexandre, pela sua participação aqui.
10:31Obrigado, Vinícius, também, pela participação da entrevista.
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