Pesquisadora da Embrapa Soja e vencedora do Prêmio Mundial da Alimentação, o "Nobel da Agricultura", Mariangela Hungria avalia a importância do desenvolvimento da pesquisa para os avanços no setor agro.
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00:00Professora, vamos começar por essa coisa importante.
00:02A sua pesquisa demorou mais de 40 anos nesse desenvolvimento.
00:06Como é que é financiar pesquisas por um período tão longo
00:10quando as pessoas querem resultado imediato?
00:12A gente vive num mundo do imediatismo.
00:14Isso não combina com a pesquisa.
00:16Não, então, aí eu acho que é muito importante
00:19já começar na primeira coisa que eu quero enfatizar muito,
00:22a importância da pesquisa pública.
00:25Então, por quê?
00:26A gente tem um setor privado, que é muito importante,
00:29mas o setor privado é aquilo, é lucro, ele dá emprego,
00:33ele gera recursos para o país, ele é muito importante,
00:37mas ele quer lucro e lucro a curto prazo.
00:41A pesquisa pública, a pesquisa pública, ela é fundamental
00:45porque ela pensa a longo prazo, tá?
00:48Ela investe no bem de todos, ela não quer o lucro de dinheiro momentâneo,
00:56ela vai pensar no bem de toda uma sociedade e de todos.
01:00E como nós vamos ter oportunidade hoje de discutir,
01:04os biológicos lá eram zero, ninguém acreditava nos biológicos.
01:08A Embrapa, a instituição que foi meu primeiro e único emprego,
01:12uma empresa pública, ela acreditou e ela investiu 40 anos nisso,
01:17o que nos tornou líderes mundiais hoje no uso de biológicos na agricultura.
01:22E isso deu um retorno enorme para a nossa agricultura, para a nossa sociedade.
01:28É Embrapa como um todo.
01:29Então, quer dizer, nós não damos lucro e é triste para a gente,
01:33quando às vezes eu vou no jornal e vejo lá Embrapa,
01:36empresa que está dando prejuízo para o governo.
01:39Não é, nós não vendemos nada.
01:42Mas a gente tem outros mecanismos que a sociedade pode checar o nosso desempenho.
01:49Nós temos, por exemplo, metodologia cientificamente comprovada de balanço social.
01:54E o último que saiu esse ano mostrou que cada R$ 1 investido na Embrapa
01:59deu R$ 25 de retorno à sociedade.
02:03Esse retorno vai do super pequeno agricultor até o grande exportador.
02:08E essas tecnologias das quais a gente está ficando líder,
02:12como uso de biológicos, o sistema plantio direto,
02:16que nós também somos os líderes, integração lavoura-pecuária,
02:20tudo isso é fruto de pesquisa pública e dá o retorno.
02:26Sustentabilidade na agricultura é pesquisa pública.
02:30Bom, e a Embrapa é o exemplo de uma instituição,
02:33graças a essa pesquisa e esse retorno à sociedade,
02:35a fronteira agrícola do Brasil conseguiu expandir enormemente nos últimos anos.
02:40E sempre, quando falo em Embrapa, sempre me vem a imagem do grande professor
02:45Aulisson Paulinelli, que é a grande figura da Embrapa e que teve um papel fundamental.
02:51Como foi resistir a politização de uma instituição de pesquisa
02:56para que ela pudesse fazer esse desenvolvimento em áreas de pesquisa tão importante
03:01que causou com que o Brasil tivesse, ou que passasse a ter uma das agriculturas mais produtivas do mundo?
03:07Então, foi uma época de ouro, de pessoas como Alisson Paulinelli, como Eliseu Alves,
03:15foram visionários que resolveram criar uma instituição
03:20e que eles viram que a gente tinha um potencial para alguma coisa diferente,
03:26que seria uma agricultura tropical.
03:29E criaram então a Embrapa, investiram, deram dinheiro, formaram recursos humanos
03:39e com as condições, olha, eu acho assim, o povo brasileiro, nós somos inteligentes,
03:46nós somos criativos, só nos solta dinheiro, tá?
03:49Dando recursos para a gente, a gente realmente vai longe.
03:53E comprovou isso, nós nos tornamos líderes em agricultura tropical,
03:58que é totalmente diferente da agricultura das regiões temperadas e subtropicais.
04:04Hoje nós até exportamos tecnologia de agricultura tropical,
04:11graças a essas pessoas que foram visionárias nisso.
04:14Então foi uma época de ouro, de investimentos que retornaram ao Brasil.
04:19Para você ver, eu entrei na faculdade em 1976, ainda era aquilo, falava assim,
04:26não, os cerrados, a gente nunca vai conseguir produzir nos cerrados,
04:32porque os solos são ácidos, são ricos em alumínio,
04:35aquele lugar das árvores tortinhas.
04:38Olha, hoje é a nossa maior fronteira agrícola, nossa maior área de produção.
04:44Então, a gente sabe, isso também nos deu confiança,
04:48de que com investimento, com tecnologia, com esforço,
04:52a gente resolve todos e consegue vencer todos os desafios.
04:57Mas a gente precisa de investimentos e suporte, né?
05:01Para a ciência, para a tecnologia, para as instituições.
05:05Bom, uma fonte importante de pesquisa aqui no Estado de São Paulo foi a FAPESP, né?
05:10A FAPESP sempre teve um papel fundamental, uma recorrência no investimento,
05:14não teve cortes drásticos, como isso aconteceu em outras linhas de pesquisa no Brasil.
05:19Qual é o papel importante da FAPESP nesse desenvolvimento e financiamento de pesquisa no Estado de São Paulo?
05:25Olha, eu moro no Paraná, né?
05:29Posso falar que a FAPESP é um sonho de consumo de todos os estados, né?
05:34A FAPESP tem os recursos, ela financia, ela tem estabilidade no financiamento.
05:42Então, ela é o sonho de consumo, sabe?
05:45Tem uma legislação que destina a porcentagem que deve ir de recursos para pesquisa.
05:52Então, por isso que São Paulo, ele é diferenciado, entendeu?
05:56É justo? Não é justo, porque deveria ter um balanço.
05:59Todos os estados deveriam ter as condições para fazer pesquisa,
06:05porque todos os estados têm pesquisadores capacitados, têm seus problemas regionais.
06:10Olha, por exemplo, se fala assim, ai, bioeconomia da Amazônia, tal, a riqueza.
06:16Nossa, menos de 1% do, vamos falar, PIB da Amazônia é baseado na bioeconomia, entendeu?
06:25Quase nada lá não tem determinado nem as cadeias produtivas dos principais pescados de lá.
06:32Então, precisava o governo intervir um pouco mais para fazer um balanço.
06:37São Paulo, por exemplo, tem recursos? Excelente.
06:40Vamos, então, ajudar um pouco mais os estados menos favorecidos,
06:44porque hoje todos os estados têm essas fundações de apoio à pesquisa.
06:50E elas estão, até tem uma confederação agora de todas elas, chama CONFAPS.
06:57Mas ainda é muito desequilibrado entre os estados.
07:01Mas que a FAPESP é o sonho de consumo de todo mundo.
07:04Quer dizer, São Paulo é sonho de consumo em várias coisas.
07:07Eu falo assim, a gente vai no Brasil, tipo estradas.
07:11Nossa, eu viajo muito, né?
07:12Você anda aquelas estradas, pistas simples, tudo esburacado.
07:15Você entra em São Paulo assim, quatro pistas para um lado, quatro para o outro, uns dois, três carros aqui.
07:21Então, eu sou paulista, paulistana de nascimento, né?
07:26Mas faz tempo que eu saí daqui, eu falo assim, nossa, é um outro mundo, tá?
07:31E o Paraná, como é que está em pesquisa?
07:33O Paraná, o governo no Paraná ajuda bastante nessa área de pesquisa?
07:37Sim, agora a gente tem uma fundação que está vendo com outros olhos.
07:41Olha muito a parte de empreendedorismo, sabe?
07:46Nós temos a nossa fundação Araucária que está ajudando.
07:49Agora, o que eu gosto muito no Paraná?
07:51Eu gosto muito do Paraná é da parte da agricultura.
07:55O Paraná tem uma visão para a sustentabilidade agrícola que é assim...
08:01O Paraná foi o berço do plantio direto.
08:04É verdade.
08:05Hoje, assim, acho que quase 100% do Paraná é de plantio direto.
08:09São pequenos e médios agricultores.
08:12Eu gosto muito de pequenos e médios agricultores, sabe?
08:14Porque eles realmente ouvem a gente, eles dão atenção, eles, sabe?
08:20Eles daí aplicam aquilo que a gente fala e a gente sente que impacta muito a vida deles.
08:29Um exemplo só, por exemplo, esses biológicos que usam.
08:36Eu faço a pesquisa acadêmica, né?
08:39Mas eu acho que até um diferencial para esse prêmio que ganhei é que eu faço desde o genoma até ir realmente ao agricultor.
08:48E isso me faz muito feliz, né?
08:50Porque não adiantaria eu estar lá só no laboratório e não levar o produto para o agricultor.
08:55Então, eu fiz um trabalho, nós estamos agora no sétimo ano, mas uma análise de cinco anos de mostrar para esses agricultores como que seria para eles usar esses biológicos ali na soja.
09:10Então, foram quase 3 mil agricultores assistidos, fizemos 273 unidades técnicas de referência, então a gente fazia dia de campo, explicava como que eu usava, chamava para ver o que que acontecia, o que que os micro-organismos estavam fazendo e tudo isso.
09:28E daí, uma análise desses cinco anos mostrou para eles que eles ganhavam de lucro 111 dólares por hectare.
09:37Aumentar a produtividade.
09:38É, aumentar a produtividade sem gastar, entendeu?
09:42Com fertilizante, nada disso.
09:44E eram agricultores com no máximo 50 hectares.
09:48Então, 111 dólares por hectare, por uma safra, né?
09:53Que lá eles ainda poderiam fazer mais uma ou duas safras de outras culturas durante o ano.
09:59É ali aquele dinheiro que ele vai poder comprar uma máquina nova, ou colocar uma internet boa para o filho não querer isso, só ficar na cidade.
10:09Isso impacta a vida dele.
10:12E ele retorna para a gente falando, sabe, como isso foi importante e tudo.
10:17E você impactar a vida desses pequenos agricultores, porque, sabe uma coisa surpresa?
10:23As pessoas, assim, pensam muito, soja, soja.
10:27O que que vem na sua cabeça?
10:28Não é automaticamente aquelas fazendas enormes, cheias de máquina.
10:32Não, sabia que 75% dos agricultores que cultivam soja no Brasil, eles são agricultores com menos de 50 hectares?
10:43É mesmo?
10:44É.
10:44Eles podem não ser os principais responsáveis pelo volume da exportação.
10:50Mas 50, mas 75% deles são pequenos agricultores.
10:56Então, a gente tem como ajudar e melhorar a vida desses agricultores.
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