No Só Vale a Verdade, Marco Antonio Villa recebe o sociólogo e cientista político, Bolívar Lamounier, para uma análise contundente sobre a Constituição brasileira de 1988 e a dificuldade do atual sistema em cumprir com os direitos básicos à população. Lamounier atribui esse problema a estrutura política e econômica, a corrupção partidária, a falta de educação política e os interesses dos jovens.
Confira o programa na íntegra em: https://youtube.com/live/BI7i69yxs-o
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00:00Deixa eu perguntar, pegando a expressão que o senhor falou, o Brasil está regredindo, o senhor disse, isso é claro e evidente em todos os setores, aí o senhor deu alguns exemplos.
00:10Porém, desde 1988, com a promulgação da carta de 5 de outubro, a Constituição Cidadã, como diz lá o doutor Ulisses, nós nunca tivemos tanta liberdade política no país.
00:22Eleições a cada dois anos, amplamente transparentes, um tribunal subeleitoral e tribunais regionais que fiscalizam o processo eleitoral.
00:31Hoje não é possível falar em fraude como na Primeira República, não tem eleições a bico de pena.
00:37Qualquer um pode ser candidato, se ampliou o colégio eleitoral, como nunca na história do Brasil.
00:43Então, como é possível, nós estamos passando desde 1988 pelo período mais democrático da história republicana
00:51e nós vivemos uma situação desse nó górdio, que não sei se vai ter um Alexandre Magno para resolver,
00:58como o senhor expôs, olha, o Brasil hoje viu uma situação gravíssima e daqui 15 anos ou 20 vai estourar essa bomba.
01:04O que aconteceu? É a nossa democracia que falhou?
01:06Não, veja, eu acho a Constituição de 88, do ponto de vista dos direitos do cidadão, uma beleza.
01:15O problema é que aqueles direitos, na verdade, não são plenamente implementáveis, porque em qualquer lugar, onde se for,
01:26há alguma barreira, esvazia aquele direito e ele se torna teoria, flatas vossas, entende?
01:34Ele não é verdadeiro.
01:35Eu dei o exemplo dos partidos políticos.
01:38Nós temos, agora, todo mundo está cansado de saber que se você quer ser candidato por um partido político,
01:45você tem que pedir a benção do presidente desse partido, porque ele é uma oligárquica que controla inteiramente a estrutura
01:54e existe até uma coisa chamada fundo partidário, entende?
01:58Que é dinheiro para o partido fazer campanha.
02:00Eu, se fundasse um partido, eu começaria pensando como é que eu vou pagar as despesas, como é que eu vou financiar a eleição, não é?
02:10Não. No Brasil está tudo previsto, entende?
02:12Você tem de saída que existe o dinheiro público destinado aos partidos para financiar as eleições
02:22e quem controla este fundo é o presidente do partido, é a curiola, para falar em termos populares, que o controla.
02:33Quer dizer, nós temos uma estrutura partidária que impede o pleno exercício dos direitos que, poeticamente,
02:42foram lindamente redigidos na Constituição.
02:45Ou seja, nós temos, vamos ser bem claro, a nossa estrutura institucional, Constituição, poderes, é falsa.
02:57É uma camada, é como se aqui, sobre São Paulo, houvesse uma grande nuvem parada aqui em cima,
03:06dizendo, transmitindo mensagens lindas para nós, sobre o nosso futuro,
03:12mas nós não temos como afastar essa nuvem daí, porque ela impede essa operação de limpeza.
03:21Cada pessoa, cada cidadão que pega o metrô às cinco da manhã em casa,
03:28ele vai fazer uma longa viagem, ele ganha pouco, ele corre risco de violência,
03:36ele corre risco até de lhe roubarem o celular.
03:40Essa é a realidade, não é?
03:41Quer dizer, então, a sociedade que nós temos, no papel está linda, eu acho que é só pôr em prática.
03:49Mas nós não temos como colocá-la em prática, porque a maior parte dos cidadãos não querem saber disso,
03:58não querem entender isso, ou não querem conversar sobre isso.
04:02Mal e parcamente lê o jornal, se é que dê.
04:04Então, assim não dá.
04:08Meia dúzia de, vamos dizer, 5% desta sociedade, tem metade da riqueza.
04:17Se falou, a pessoa que vive lá em Paris, tem pessoas que vivem em embarcações,
04:26em... como é que era o nome mesmo? Esqueci.
04:30O que é de...
04:31É, isso.
04:32Sim, sim.
04:33Então, você não pode viver dessa maneira.
04:38Então, vamos ao essencial.
04:41Sim.
04:41Estudo.
04:42Eu acho que nós temos que deixar de ser paternalistas e irresponsáveis e fazer com que os estudantes estudem.
04:53Entende?
04:54Eu não quero contar vantagem, mas certos livros que um universitário hoje não consegue ler,
05:01eu li com 13, 14 anos, né?
05:03Entende?
05:04Porque havia, entende?
05:07Havia, realmente, pressão.
05:10Naquela época, foi quando saiu o livro do Fernando Sabino, Encontro Marcado.
05:15Sim.
05:15Quando saiu o...
05:17O...
05:18O...
05:19Lá de Curvelo, né?
05:22O...
05:22O Guimarães Rosa.
05:23O Guimarães Rosa.
05:25Essa maravilha da nossa...
05:27Isso eu li naquela idade.
05:29Sim.
05:29Entende?
05:30Não sou eu.
05:32Sou de um gênio, não.
05:33Aliás, eu nunca fui de lei muito, não.
05:35O que acontece é que, naquela época, nós todos tínhamos que ir estudar.
05:39Entende?
05:40E tínhamos a noção de que estudar, além de ser um prazer, é uma obrigação sua, como
05:46um futuro cidadão.
05:49Entende?
05:49Você tinha que chegar a cada nível com o nível previsto de escolaridade.
05:56Como no Japão.
05:57Como no Japão.
05:59No Japão, as famílias controlam.
06:01Em conexão com as escolas, o avanço do estudante ao longo do prazo de estudos.
06:11Se a escola percebe que determinados alunos estão ficando para trás, elas vão na casa do
06:21rapaz, né?
06:22Vão lá falar com a família.
06:24O que é que é acontecendo?
06:25A senhora não está acompanhando os estudos dele?
06:28É preciso colocar a sociedade no ritmo paralelo, constante, forte, para nós sairmos dessa
06:40tristeza em que vivemos.
06:41Então, seria cosmético, professor, falarmos, como muitos dizem hoje, olha, vamos adotar
06:47o semipresidencialismo.
06:49Eleição direta de presidente da república, mas um primeiro-ministro que tenha, com base
06:55na Câmara, seria no Brasil na Câmara dos Deputados, seria o melhor regime, o presidente
07:01com mais ou menos no sentido, ou no modelo francês ou português.
07:05E, com isso, nós podemos enfrentar esses grandes dilemas nacionais.
07:09Isso seria uma questão cosmética, frente a questões estruturais tão graves como o
07:14senhor expôs?
07:14Ou seja, se não colocar o dedo nessas feridas, não adianta pensar em mudar o regime.
07:19Ô, Vila, eu, entre o semipresidencialismo francês e o nosso, eu prefiro deixar como está.
07:27Entende?
07:27Eu, absolutamente, não acredito no semipresidencialismo francês.
07:32Aquilo deu certo lá, em parte em Portugal, por uma razão muito simples, a França tinha
07:39sido destroçada na guerra, o plano macho jorrou dinheiro na França, e a França tinha uma
07:48linhagem de estadistas como poucos países têm, assim, em sequência.
07:53O vice, desculpe, o sucessor do De Gaulle era o Pompidou, outra pessoa de grande envergadura,
08:01e depois Alain D'Estaing e outros.
08:03O próprio Mitterrand, que era de esquerda, teve a responsabilidade de reconhecer que a
08:11plataforma dele era inviável, estava fora de lugar e mudou de posição, né?
08:16Passou a defender a privatização na França.
08:19O Felipe Gonzalez, na Espanha, que era socialista, partido socialista, partido socialista operário
08:27da Espanha.
08:29Ele era, evidentemente, um esquerdista furibundo, privatizou um monte de coisas, vendeu um monte
08:36de coisas, reestruturou a economia da Espanha.
08:39Ou seja, só aqui é que nós enfiamos a cabeça na areia e não queremos enxergar.
08:48Nós somos 220 milhões de avestruzes, entende?
08:53É um país de avestruzes, a avestuslândia não funciona.
08:59Nós temos que, realmente, pegar no pesado.
09:02Então, temos que, alguns setores têm que ou se adaptam ou vão sofrer com o ajuste