Roberto Dumas, professor de economia chinesa e internacional do Insper, explica os impactos geoeconômicos e estratégicos do rascunho de acordo que envolve terras raras, chips de alta tecnologia e interesses militares e comerciais.
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00:00Sem dados concretos, cabe a nós desenhar uns cenários sobre este rascunho do acordo entre Estados Unidos e China.
00:09Para isso, eu conto com a ajuda de Roberto Dumas, economista e professor de economia internacional do INSPER, aqui em São Paulo.
00:18Boa noite, Dumas. Que alívio tê-lo aqui, porque você entende muito de economia dos Estados Unidos,
00:24entende muito de economia da China, leciona sobre a economia chinesa.
00:29Eu vou juntar os seus dois conhecimentos e pedir para que você ligue a sua bola de cristal,
00:35para a gente tentar entender o que está nesse framework, nesse rascunho entre os dois lados.
00:41Obviamente, terras raras deve estar ali, nos primeiros parágrafos.
00:46Qual é a sua percepção, Dumas? Boa noite mais uma vez. Obrigado de novo por participar aqui da nossa programação.
00:52Boa noite, Marcelo. É sempre um prazer estar com você.
00:55Veja, não é ainda um acordo enorme que pode dar um respiro aliviado no globo terrestre, vamos dizer assim.
01:06Ainda existe muita coisa para se discutir.
01:09Mas é que é um problema maior, por enquanto, está sendo, como você bem colocou,
01:15e como a correspondente Washington colocou, o problema das terras raras.
01:19Veja, de rara não tem nada isso daí, porque nós estamos falando de 17 elementos químicos,
01:25que é o lítio, vanário, cobalto, níquel, platina, nióbio.
01:29Só que para você extrair e fazer processamento dessas terras raras não é uma coisa simples,
01:36demora de 5 a 10 anos.
01:38Já tinha empresas de automóveis de defesa que estavam sofrendo com a restrição das exportações chinesas dessas terras raras para os Estados Unidos.
01:51Então a gente fala, mas é um valor alto?
01:53Não, são 170 milhões de dólares.
01:57Isso praticamente não é nada.
01:59Só que é a vitamina que faz mexer grandes grupos de segmentos econômicos dos Estados Unidos,
02:07como, por exemplo, telecomunicações, defesa, microchip, etc.
02:12Do outro lado, os Estados Unidos, desde a época de Joe Biden,
02:17estavam cerceando as exportações de chips de alta tecnologia para os chineses.
02:25Então ficava aquela coisa, olha, ou você libera a exportação de chips de alta tecnologia,
02:33que é importante também para a defesa e o armamento dos chineses,
02:38ou nós vamos cercear as exportações chinesas para os Estados Unidos de terras raras.
02:45Não estamos falando de muito dinheiro.
02:48O dinheiro é pouco.
02:49Não estamos falando de tarifa.
02:51Não é questão disso.
02:52É questão de você libera terras raras, porque se não, vários segmentos econômicos param,
02:59celulares, computadores, turbinas eólicas, aparelho de imagem de medicina,
03:04bateria, eletrônica de veículos e toda a defesa, aero também, aviões de combate, drones, etc.
03:14Ou nós também não vamos liberar a parte do chip de alta tecnologia que tantos chineses precisam.
03:22Veja, é um acordo micro, não é um acordo sobre tarifácio, vou diminuir para 30, de 20, para 10 ou vou subir para 40.
03:34Não, ainda estamos nos lineares de um novo acordo para saber se vai ser 30 e 10.
03:41Então, eu acho, na minha opinião, que muito provavelmente poucos se falaram em tarifas de 30 ou 10%,
03:50mas sim em restrições de terras raras de chineses para os Estados Unidos e de chips de alta tecnologia dos Estados Unidos para os chineses.
04:03Agora, Dumas, política e economia são grandezas que andam de mãos dadas.
04:09Deixa eu subir um pouco o nível da conversa, saindo do espectro da economia, chegando na política,
04:16ou se você preferir, na geopolítica.
04:19Dá para dizer que a China está um degrauzinho acima diante dessas negociações,
04:25diante aí dos Estados Unidos, terem levado isso para um terreno mais neutro,
04:30terem conseguido trazer os chineses para a mesa de negociação.
04:34Os chineses estão um degrauzinho acima na grande ambição do governo Xi Jinping,
04:39que é se tornar o grande hegemônico, transformar a China no grande líder hegemônico do século XXI.
04:46Quero dizer o seguinte, existe uma relação umbilical entre os dois,
04:51Estados Unidos e China, quando a gente fala de comércio.
04:55É a maior relação entre dois países em todo o mundo e talvez em toda a história da humanidade,
04:59pelo menos na história contemporânea.
05:01É o seguinte, mas se a gente olhar uns dados um pouco mais cruz,
05:07a China precisa menos dos Estados Unidos do que os Estados Unidos precisam mais da China.
05:13A China se tornou um pouco mais independente.
05:15A China talvez tenha dado um pouco mais as cartas nessa negociação.
05:19Volto à pergunta original.
05:21Você consegue perceber isso ou é uma ilusão da minha cabeça?
05:24A China está um degrauzinho acima nesse nível de negociação?
05:28Se nós falarmos sobre a geoeconomia, eu acho difícil, porque é aquela coisa,
05:34você precisa de duas pessoas para dançar um tango.
05:38Então, se você errar o passo, mesmo que você dance melhor,
05:41o outro dançarino, o homem ou a mulher, ou quer que seja, o cônjuge que estiver do seu lado,
05:47não vai conseguir acompanhar.
05:49Então, os dois são intradependentes.
05:51Por quê?
05:52Porque um vende excedente para o outro, que é o chinês vendendo para os Estados Unidos,
05:59e com essa poupança que sobra, ou seja, com esse dinheiro que ele acumula,
06:04ele acaba comprando o título público dos Estados Unidos.
06:07Isso é uma semelhança do que acontecia em 1973, 1974, com os petrodólares reciclados dos eurobanks.
06:16Os árabes depositavam dinheiro nos eurobanks, os eurobanks emprestavam dinheiro para os países da América Latina,
06:22a América Latina comprava petróleo, eram os petrodólares reciclados.
06:27A situação hoje, chinês vende para os Estados Unidos, os Estados Unidos compram da China,
06:33esse dinheiro vai para os chinês e os chinês acabam comprando o título público dos Estados Unidos,
06:40que é importante para manter a taxa de juros não tão elevada e continuar o crescimento econômico dos Estados Unidos.
06:48Então, os dois são dependentes.
06:51Falar que um é mais dependente do que o outro, é como eu te falei,
06:54você pode dançar melhor, mas errou o passo, o melhor dançarino também acaba tropeçando no pé da dama ou do cavaleiro.
07:02Não tem desde, é como dizem em inglês, you need two for tango, você precisa de dois para tango.
07:08Pelo lado cultural, a gente pode dizer que a China ganhou, pelo lado também da visão dos chinês.
07:17Por quê? Porque existe uma coisa na China chamada mianzã, que é a face.
07:23Nós já começamos isso daqui.
07:26E quem iniciou a guerra comercial foram justamente os Estados Unidos.
07:32Então, o Xi Jinping estava esperando o início dessa conversação para que o Donald Trump oferecesse a face,
07:40que é o mianzã, para o Xi Jinping iniciar a conversação.
07:44Então, para os chineses, quem está ganhando essa retórica da guerra comercial são os chineses, sim.
07:52Agora, para o lado ocidental, não tem problema você dar o primeiro passo para uma negociação
07:58a despeito de você ter iniciado a guerra comercial.
08:01Então, de novo, apesar de você dançar o melhor tango,
08:06não podemos deixar dizer que nós estamos na frente, os chineses estão à frente.
08:12Porque o melhor dançarino de tango, se não tem uma companheira que o acompanhe,
08:17um companheiro que o acompanhe, acaba saindo do ritmo e atrapalhando a economia dos dois países
08:25e, consequentemente, a economia global, como a gente está vendo já expectativas do FMI, do Banco Mundial,
08:35mostrando um crescimento menor da economia global, Marcelo.
08:39Dumas, excelente analogia com o do tango.
08:43Vamos colocar, deixa eu nacionalizar um pouco mais a nossa conversa.
08:47Nós que estamos de espectadores desse espetáculo de dança,
08:52Brasil ou América Latina, se você quiser colocar em uma proporção maior,
08:55o que nos sobra disso?
08:57Porque esses dois gigantes ficam guerreando,
08:59em geral, eles ficam batendo no solo, dá aquela tremedeira,
09:03e a gente sente aí os reflexos de um terremoto.
09:07O que sobra para a gente?
09:08Que temos uma associação muito mais próxima da China do que o dos Estados Unidos,
09:13embora seja o nosso segundo maior parceiro comercial os Estados Unidos,
09:17o nosso primeiro parceiro comercial é a China,
09:19e estamos ligados por meio do BRICS.
09:23Então, assim, diante, entre mortos e feridos,
09:25o que nos sobra aqui na América Latina?
09:28Veja, dos dois lados sobra.
09:32Por exemplo, tem o lado positivo?
09:33Tem o lado positivo.
09:35O lado positivo é que a China pode fazer uma réplica ou uma tréplica
09:40dessa guerra comercial e comprar mais grãos do Brasil.
09:44Isso ajudaria muito.
09:46Só que Trump também aprendeu.
09:48Como aconteceu no Trump I,
09:51os chineses compraram mais grãos do Brasil
09:53como forma de réplica da guerra comercial.
09:57Agora, Trump muito provavelmente vai colocar uma cota
10:00em cima de grãos dos chineses para não comprar do Brasil.
10:04Então, o Brasil precisa tomar cuidado
10:05que não é tão certo que o agronegócio possa se beneficiar,
10:10embora tenha se beneficiado.
10:12Do lado da segunda derivada,
10:15aí o Brasil acaba perdendo.
10:17Por quê?
10:18Porque dada a incerteza que a economia global está vivendo,
10:22como a gente sempre fala aqui na Times Brasil,
10:25risco a gente corre.
10:26Incerteza, não.
10:28Acaba que o consumo e investimento dos principais países
10:32acaba caindo.
10:34Então, o crescimento global acaba sendo cerceado,
10:38acaba um crescimento menor.
10:40Isso bate no preço de comorte.
10:43Ora, o que eu mais exporto?
10:45Comorte.
10:47Minério de ferro, minérios, grãos, etc.
10:49A não ser a parte do minério de cobre.
10:54Então, depende de qual segmento econômico a gente está analisando.
10:58Se, por um lado, vamos pensar, o agronegócio pode se beneficiar,
11:03por outro lado, o segmento de commodities como um todo,
11:07inclusive, levando em consideração o cerceamento dos ativos imobiliários
11:11que Xi Jinping colocou na China desde 2020,
11:14prejudica o minério de ferro,
11:16e o petróleo está comprando diretamente da Rússia,
11:19não compra mais tanto do Brasil,
11:20então, o commodity acaba caindo,
11:23dado um crescimento global menor.
11:25Agro se beneficia,
11:28commodity como um todo,
11:30prejudica e a sua exportação de commodities.
11:32Olha como é interessante que todo mundo chega aqui e fala o seguinte,
11:36não, mas a minha tarifa é de 10%,
11:37então, não vou ser prejudicado.
11:39Não, nós temos que ver a réplica, a tréplica
11:42e a segunda derivada desse impacto,
11:45dessa guerra comercial, como o Brasil vai sair.
11:48Em nenhum momento eu falei que nós vamos ser tributados 10%,
11:52mas o efeito colateral disso é enorme
11:55e pode ser positivo e negativo,
11:58dependendo do segmento econômico que nós estejamos falando, Marcelo.
12:02Dumas, é sempre um prazer conversar contigo,
12:04porque é a garantia de uma aula completa
12:06numa versão pocket, em 10 minutos.
12:10Dumas, sei que foi mais uma conversa
12:12sempre muito edificante entre nós,
12:16de muitas ainda que virão.
12:18Até porque o Donald Trump e o Xi Jinping
12:20vão nos dar argumentos para conversarmos muito.
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