Pular para o playerIr para o conteúdo principal
Ana Flávia Cabral, CEO da Fundação Orquestra Sinfônica Brasileira, contou como a música erudita transformou sua trajetória e revelou os desafios de liderar uma das instituições culturais mais emblemáticas do país. Uma conversa sobre impacto social, educação e futuro cultural do Brasil.

🚨Inscreva-se no canal e ative o sininho para receber todo o nosso conteúdo!

Siga o Times Brasil - Licenciado Exclusivo CNBC nas redes sociais: @otimesbrasil

📌 ONDE ASSISTIR AO MAIOR CANAL DE NEGÓCIOS DO MUNDO NO BRASIL:

🔷 Canal 562 ClaroTV+ | Canal 562 Sky | Canal 592 Vivo | Canal 187 Oi | Operadoras regionais

🔷 TV SINAL ABERTO: parabólicas canal 562

🔷 ONLINE: https://timesbrasil.com.br | YouTube

🔷 FAST Channels: Samsung TV Plus, LG Channels, TCL Channels, Pluto TV, Roku, Soul TV, Zapping | Novos Streamings

#CNBCNoBrasil
#JornalismoDeNegócios
#TimesBrasilCNBC

Categoria

🗞
Notícias
Transcrição
00:00A protagonista de hoje é Ana Flávia Cabral, CEO da Fundação Orquestra Sinfônica Brasileira.
00:11Ela conduz uma das instituições culturais mais emblemáticas do país, com o desafio
00:16de democratizar o acesso à música erudita e formar novas gerações de talentos.
00:22Ana Flávia é um exemplo raro de liderança que une gestão, educação, cultura e impacto
00:30social.
00:31Conselheira em organizações nacionais, professora, autora e integrante do movimento Women-Led
00:37Economy, ela construiu uma carreira sólida em sustentabilidade, terceiro setor e políticas
00:43públicas.
00:45Ana Flávia, seja bem-vinda.
00:46Prazer ter você aqui com a gente.
00:48Muito obrigada.
00:49A minha primeira pergunta é sempre a mesma para todas vocês.
00:52Quem é Ana Flávia Cabral?
00:54Eu acho, acredito que eu seja uma pensadora humanista, forjada no reconhecimento do valor
01:01do trabalho.
01:02Os meus pais me ensinaram a trabalhar muito cedo e os dois trabalham demais, sempre trabalharam
01:06demais.
01:07E nossa relação com o trabalho sempre teve associada ao servir.
01:12Então, acho que o entendimento do servir ao outro, do contribuir para o desenvolvimento,
01:17para o contexto em que eu me insiro, fez de mim uma costureira.
01:22Digamos assim.
01:23Eu me sinto uma costureira de grandes ideias, de pessoas, de histórias e ao mesmo tempo
01:29com uma proposta de que a utilidade de todo esse trabalho artesanal, que eu diria, seja
01:36sempre o bem comum.
01:38E como é que você foi parar na música erudita?
01:41Você sempre gostou?
01:42Eu sou do interior de São Paulo.
01:45Nunca tinha visto uma orquestra na minha vida.
01:48Olha!
01:48Até que idade!
01:49Eu não tinha tudo nem visto.
01:51Meu ambiente sempre foi o ambiente rural, o agronegócio, o sertanejo.
01:56Eu adoro, eu amo o sertanejo.
01:58Mas eu fui conhecer uma orquestra sinfônica com 18 anos.
02:03Aqui em São Paulo.
02:04Em Brasília, eu tinha saído de casa com 17 anos, eu fui estudar em Brasília para
02:09me preparar para a minha faculdade de Direito.
02:11E eu, na verdade, eu nem via orquestra nessa ocasião.
02:14Eu só ouvi, porque era uma ópera e a orquestra tocava no fosso.
02:17Eu não cheguei a ver, eu só ouvi.
02:19E esse fenômeno do encontro, dessa atmosfera da música de concerto, que promove o encontro
02:28e coloca a beleza nessa estatura que é um concerto, que é essa ideia do espetáculo
02:36acontecendo ali no palco, aquilo é uma coisa que me marcou para sempre.
02:42E acabou que em conhecendo, isso ficou na minha vida, ficou como uma referência.
02:48E fui trabalhar na Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, como estagiária no
02:54final da minha faculdade, porque eu sou advogada, com o presidente Fernando Henrique Cardoso,
02:59com o time do Fernando Henrique, que tinham se juntado para construir a OSESP, a Orquestra
03:05Sinfônica do Estado de São Paulo, a Sala São Paulo que ela é hoje.
03:07Então, isso eu fui em 2005, 20 anos atrás, dentro da minha carreira jurídica, eu fui
03:13ser o jurídico do projeto da Secretaria de Estado da Cultura para a OSESP, no caso.
03:17Meu primeiro orquestra.
03:18Em que momento que você pulou para o outro lado, que você deixou de ser advogada para
03:24entrar numa carreira, digamos assim, mais executiva na Orquestra Sinfônica?
03:30Eu diria o seguinte, eu nunca precisei tanto do direito como eu preciso numa Orquestra Sinfônica,
03:37trabalhando numa Orquestra Sinfônica.
03:39e nunca dispus tanto da filosofia, porque eu sou mestre em filosofia, como agora, quando
03:47a gente está discutindo ética, valores, nesse momento que a gente para para refletir sobre
03:53a tecnologia, a dimensão da tecnologia nas nossas vidas.
03:57Então, a minha formação intelectual, minha formação jurídica, minha formação em filosofia
04:03para os estudos culturais, são os alicerces que me prepararam para essa atividade que
04:09eu tenho hoje, uma das atividades que eu tenho que é cuidar da Orquestra Sinfônica Brasileira.
04:14Então, o direito, ele é mesmo a base de tudo, porque na medida em que a gente tem a consciência
04:19do que é o bem principal, o valor maior de estarmos aqui, o contexto da sociedade, como
04:26tudo isso se organiza num aparato normativo, legislativo, mas como as regras são estabelecidas
04:33para que a gente possa viver com respeito e promovendo aquilo que é interessante a todos,
04:39que é a lógica do direito, é a mesma disposição desse conjunto, a gente usa a mesma disposição
04:45para o universo da Orquestra Sinfônica, que na verdade tem muito também para ensinar
04:50para o direito, porque você trabalhar no universo de prática coletiva de música, na
04:56prática coletiva de uma instituição que tem 85 anos, que segue uma... essa ideia
05:04de beleza, de produzir a música através dos séculos pela humanidade, a gente está
05:09falando da música que precede o registro da palavra, a música vem muito antes do que
05:14a gente conhece por comunicação, que é o que a gente está fazendo aqui hoje.
05:19Então, a música tem 500 anos, as orquestras sinfônicas têm 500 anos, quantas empresas
05:24a gente conhece que têm 500 anos.
05:31Então, tem muita história e tem muito saber, tem muita sabedoria, tem muita profundidade
05:38nos conhecimentos acumulados numa orquestra sinfônica.
05:41Então, acho que uma atmosfera e outra se complementam na minha vida, para mim.
05:46E é evidente que a música muda destinos.
05:50Em que momento que você percebeu isso?
05:53Eu venho da... eu tive muitos anos de trabalho na gestão pública e pude trabalhar nas três
06:00esferas de governo, no Estado, São Paulo, Prefeitura e Governo Federal.
06:04Quando a gente trabalha no universo público e a gente tem... eu tive, no meu caso, eu tive a possibilidade
06:11de ocupar posições de formulação de política pública e de gestão do bem público, essa
06:18noção do que é o bem público é muito difícil da gente ter a partir das nossas famílias,
06:25dos nossos espaços privados.
06:27Então, estar num contexto de política pública, de gestão pública, me trouxe o conhecimento
06:33e essa noção de o que é a educação.
06:37Como é que a gente conforma políticas, processos, intenções para a construção, para o desenvolvimento
06:45da sociedade, para o desenvolvimento humano, para o desenvolvimento coletivo, pensando quais
06:51são os caminhos para isso.
06:52E a minha descoberta e o meu entendimento foi que a educação é o caminho pelo qual
06:59a gente promove desenvolvimentos em geral.
07:01E transformação social também.
07:04Exatamente.
07:05E nós, no Brasil, não contamos com o ensino da música nas escolas.
07:10Não mais.
07:11Já tivemos.
07:12Quando o Vila-Lobos era ministro da educação, da cultura, a gente tinha a política pública
07:17de educação musical, canto efeônico, não temos mais.
07:21E esse deixar de ter, eu sempre digo isso, às vezes é melhor a gente não fazer do que
07:29começar a fazer e deixar de fazer.
07:31A descontinuidade das políticas públicas, sobretudo, mas as descontinuidades, elas são
07:37desestruturantes.
07:38Então, se a gente não tem a certeza de manter um benefício, de manter uma política, é melhor
07:45a gente pensar se vale a pena mesmo começar.
07:47E nesse caso, a gente entendeu que a ausência da música na escola, a ausência do cuidado
07:54da beleza, do cuidado da participação na vida cultural, do entendimento do direito
08:01cultural das crianças, aquilo estava precarizando o ensino público, o ensino, o processo educativo,
08:10os processos pedagógicos.
08:12E aí, a gente passou, então, a testar um projeto que a gente desenvolveu na Oqueça
08:17Sinfônica Brasileira.
08:19E numa primeira edição dele, a gente já viu como aquilo foi transformador no contexto
08:25de uma escola pública.
08:26E aí, é isso.
08:27Vamos trabalhar com a música no contexto da escola pública.
08:30Quais são os principais desafios e até urgências de liderar uma instituição cultural aqui
08:36no Brasil hoje?
08:38Olha, são alguns.
08:41Até respira fundo, né?
08:42Eu acho que o começo de tudo é, eu acho que há ainda uma incipiência na compreensão
08:53do que é o papel da cultura numa sociedade.
08:56E isso, eu não estou falando, eu não estou criticando nenhum setor especificamente, mas
09:02como nós não lidamos com cultura, com a centralidade de uma política pública de Estado, isso ainda
09:11não acontece, há uma série de iniciativas nos poderes públicos de modo geral, conheço
09:16inúmeros, já trabalhei com esses inúmeros projetos de iniciativa pública, mas a cultura
09:21não é central como uma política de Estado, ou seja, ela não é reconhecida, não é servida
09:29com o nosso arroz com feijão.
09:31Cultura é um pouco do residual, é um pouco do, ah, o folclore, a tradição, é um pouco
09:37de entretenimento, a gente não tem a noção de como a cultura pode contribuir e contribui
09:43e, de fato, promove grandes investimentos econômicos, grandes volumes de operações
09:49econômicas.
09:50Não compreendendo o papel da cultura, a gente começa, então, esse é o ponto de partida
09:56de precarização da gestão das instituições culturais.
10:00Então, aí é uma imensa dificuldade para a gente conseguir explicar o que é patrimônio,
10:04o que é patrimônio para as crianças, noção da educação patrimonial.
10:08A gente está falando de insuficiência de aparato jurídico, legislativo para a administração
10:15das instituições sem fins lucrativos, terceiro setor.
10:19Então, uma enormidade de questões como, por exemplo, não é possível aplicar a lei
10:24de recuperação extrajudicial e judicial para fundações.
10:27Então, é um tipo de obstáculo que se coloca dentro de um universo jurídico que está
10:34à disposição das empresas privadas, mas que, por outro lado, só prejudica e auxiliaria
10:40muito se a gente tivesse isso no ambiente do terceiro setor.
10:43Então, coisas assim, a justiça especializada para a cultura, por exemplo, para entes fundacionais,
10:48a gente estava discutindo isso ontem, dando aula para o Ministério Público do Rio de Janeiro.
10:54Como seria importante se a gente tivesse, no poder judiciário, a compreensão de que
10:59instituições do terceiro setor têm um outro corredor, têm peculiaridades no sentido da gestão.
11:04Então, uma série de coisas que são sintomas, fragilidades no sentido de como a gente lida
11:10com esse setor da economia, que é absolutamente representativo e movimenta empregos e muita riqueza
11:18e gera muita riqueza, essas dificuldades vêm da falta de a gente entender qual é o papel
11:23da cultura na sociedade.
11:24O que significa para você, pensando que esse ano a Orquestra Sinfônica Brasileira
11:29completa 85 anos?
11:31O que significa preservar essa tradição e, ao mesmo tempo, reinventá-la?
11:38Permanecer durante todo esse tempo, né?
11:40A gente não está só celebrando um aniversário.
11:43A gente está celebrando ter permanecido durante esse tempo todo com tantas vicissitudes,
11:48com tantas impermanências, tantas fragilidades, como a gente estava comentando brevemente aqui.
11:53A música seguir existindo, a instituição seguir existindo, mesmo sem a defesa, mesmo sem
12:00a salvaguarda, mesmo sem o amparo do poder público, na minha opinião, significa uma força
12:06intrínseca e reconhecida pela própria sociedade.
12:09Isso tem um valor muito grande.
12:10Então, se a gente está falando que a opinião pública defende essa instituição, se a gente
12:14está falando que a sociedade defende essa instituição, percebe o valor, né?
12:19Está ali nos concertos.
12:21A gente tem hoje uma grande percepção da relevância do projeto de educação musical,
12:27isso, nível nacional.
12:28Esse continuar existindo é uma das sensações de permanência que a gente tem quando a gente
12:36está falando de gestão de cultura.
12:37Então, a ideia de permanência e as instituições culturais sendo longevas, isso nos traz uma
12:45segurança como cidadãos.
12:47Saber e sentir que determinadas coisas continuam ali, continuam desenvolvendo o seu papel, continuam
12:55contribuindo, isso é muito forte, isso é muito relevante para uma sociedade.
13:01E essa tradição, e ela passa por gerações, estamos falando de 85 anos, a SB foi criada
13:06quando o Rio de Janeiro era a capital federal.
13:08A história do país mudou, a capital do país mudou, temos Brasília agora e a instituição
13:14continuou.
13:15Então, a gente está falando da história de um país que segue se modificando e se atualizando
13:20e uma instituição ali, digamos, firme e forte na sua simbologia.
13:27Quando a gente fala sobre a contemporaneidade, o que é esse tradicional que a gente traz para
13:32esse presente, por exemplo, vou te dar um dado.
13:35Cresceu 90% o uso, a utilização de músicas clássicas como trilhas sonoras de conteúdos
13:44para a internet, para plataformas digitais.
13:46Então, as pessoas estão usando as músicas clássicas como trilhas dos seus conteúdos
13:50agora.
13:51Produção de conteúdo para a plataforma digital.
13:55A gente está falando de uma geração jovem.
13:57Incrível isso.
13:58E essas pessoas não necessariamente vão ao concerto.
14:01Não acredito que ela seja um público da Casa Sinfônica Brasileira.
14:04Mas está ali à disposição das pessoas esse conhecimento, essa sabedoria, esse bem
14:10cultural que é a música clássica.
14:13A gente, por exemplo, trabalhando hoje, a gente sabe que o sertanejo é o gênero da
14:18música brasileira mais consumido e mais celebrado pelos brasileiros.
14:24A gente produzindo projetos sinfônicos com o sertanejo.
14:29Então, como é que a gente faz?
14:30A gente vai entendendo...
14:31É sucesso.
14:32Exato.
14:33Que a música clássica é uma coisa.
14:36A música de concerto é como se toca uma música.
14:39E a orquestra sinfônica, ela é uma comunicadora.
14:42Ela é uma educadora para a escola pública e ela é uma comunicadora quando a gente estabelece
14:46a missão de transmitir determinada mensagem.
14:49Então, esse formato, orquestra sinfônica, música de concerto, é um veículo.
14:55O que a gente vai tocar, a gente decide.
14:56Pode ser o sertanejo, pode ser o funk.
14:58Teve um encontro recente também de titãs com a orquestra sinfônica brasileira.
15:03A gente tocou com o titãs no Rock in Rio.
15:06A gente toca o Rock in Rio desde que o Rock in Rio é Rock in Rio.
15:09Então, a gente tocou o Rock in Rio há 40 anos.
15:11A gente fez debutante a OSB Jovem, que é a nossa orquestra pré-profissional, no último
15:17Rock in Rio.
15:18Então, a gente traz para esse formato contemporâneo, para essa forma de consumir música moderna,
15:26mais jovial, talvez, o que é uma estrutura tradicional.
15:32Então, o que a gente vai tocar, a gente combina com o que estão gostando agora.
15:36Como é que a gente faz isso?
15:37Mas a dimensão orquestra sinfônica, ela também é sofisticada.
15:42Ela também incrementa o trabalho do músico popular, desse músico que está aí no mainstream.
15:47Eles também se interessam em estar nesse contexto.
15:50Então, é uma soma virtuosa, eu diria.
15:54Aproveitando o que você falou da Orquestra Sinfônica Jovem, o sucesso deles impressiona.
16:00Qual é o impacto disso nesses jovens, principalmente em jovens em situação mais vulnerável?
16:08Olha, as nossas iniciativas de educação musical, seja para o âmbito da escola pública,
16:13seja para promover a formação dos jovens em estágio de pré-profissionalização, que é o SB Jovem,
16:22são sempre muito contundentes.
16:25Então, a gente só tem 50 vagas no SB Jovem, mas a gente tem centenas de inscritos para a prova.
16:32Agora, a gente vai ter a nossa nova edição do SB Jovem.
16:35Incrível!
16:35Pessoas de vários países diferentes.
16:38Essa é a segunda edição.
16:39A primeira, a gente teve o pessoal do Rio de Janeiro, um pouquinho restrito ali ao nosso universo.
16:44Essa segunda vez, dois anos depois, segunda edição, pessoas da América Latina, todas.
16:51Gente, assim, é impressionante.
16:53Eu acho que a gente nem consegue medir esse exponencial do impacto que a gente gera.
16:59Mas voltando a essa ideia de que a instituição orquestral está aqui para servir,
17:04que tem muito a ver com o que eu penso sobre mim mesma, qual é a minha utilidade no mundo,
17:10para a vida de modo geral, para a vida coletiva.
17:13Mas a instituição orquestral, ela precisa estar preparada para dialogar com esse tempo
17:17e entender quais são as circunstâncias em que a gente está inserido.
17:21Então, se a gente tem uma agenda social que discute populações subrepresentadas,
17:26a gente discute direitos de minorias, a gente discute a presença da mulher
17:32em vários setores da economia, estou contribuindo com o movimento Women in the Economy.
17:38Essa discussão, essa agenda contemporânea, a orquestra precisa refletir.
17:43Ela é uma instituição social.
17:45E quando a gente parou para entender isso, e a gente faz muito esses encontros
17:50de refletir sobre o nosso tempo, nossa sociedade,
17:53nossa missão, nossa função social,
17:56a gente percebeu que a orquestra profissional estava muito desequilibrada.
18:02A gente tem 77 músicos e 9 mulheres.
18:05Nossa!
18:06Como é que a gente corrige isso?
18:07Chamei as mulheres.
18:10Falei, mulheres?
18:11Vamos conversar sobre isso.
18:13Como é que a gente pode promover um pouco de equilíbrio?
18:16A gente não é a favor de cotas.
18:19A gente precisa encontrar uma alternativa.
18:21Mas quando você fala chamei as mulheres, as mulheres, essas 9?
18:24As profissionais, as musicistas da USB.
18:27E elas me explicando.
18:28Olha, Ana Flávia, é preparo de uma vida inteira.
18:31Mas é um preconceito?
18:33Não, é essa.
18:35A gente precisa encontrar...
18:35Aí eu tive até um preconceito em relação à música clássica, erudita.
18:39Ah, não.
18:39É porque o que acontece na vida da mulher,
18:42o trabalho de uma orquestra sinfônica exige muitas horas de estudo,
18:47muitas horas de dedicação.
18:49E a gente está falando de 14, 15 horas.
18:54Não que outras atividades não exijam da mesma forma.
19:04Mas as mulheres têm menos flexibilidade para ter dois empregos.
19:08Não tem como ter dois empregos.
19:09Então, ela passa a maior parte do seu dia estudando, não remunerada, né?
19:14Entre aspas, ela é remunerada ali num nível ainda bastante diferente de países ricos, né?
19:21A gente tem os nossos profissionais, mas quando surge uma demanda na família,
19:26quando a gente fala, quem é que vai cuidar do familiar que ficou doente?
19:30Do filho que não foi para a escola?
19:31Quem é que leva o médico?
19:32Quem leva para o médico?
19:33Quem fica em casa?
19:34Quem faz a comida?
19:35Quem limpa a casa?
19:36Pandemia!
19:37As mulheres vão assumir essas posições, especialmente na economia do cuidado.
19:41Então, como a profissão exige demais e ela isola a pessoa da sua vida doméstica,
19:48é muito difícil a mulher seguir numa carreira.
19:51Então, a gente tem esse aspecto.
19:53Outro aspecto, a maternidade.
19:55É muito difícil.
19:55A gente está falando, ser músico de orquestra é como se fosse atleta.
19:59Então, a questão da forma física, portanto, a dificuldade de engravidar, a amamentação.
20:06Tem que viajar muito.
20:07A gente viaja bastante, viaja muito, tem que estar muito à disposição.
20:11Trabalha todo final de semana, a gente trabalha todo final de semana.
20:14Então, é um pouco na contramão das nossas vidas privadas, né?
20:19De como a gente tem os nossos hábitos de família e tal.
20:22Mas é como mudar isso, Ana Flávia, para exatamente poder trazer mais mulheres
20:27para a Orquestra Sinfônica Brasileira?
20:30Eu dei uma palestra no Chile duas semanas atrás.
20:33Falei, gente, para os meus colegas gestores de orquestras ibero-americanas,
20:37a gente vai precisar repensar como o papel, como está, como é o trabalho do músico de orquestra.
20:42Não dá para deixar 15 horas ensaiando, é isso?
20:45A gente precisa entender melhor isso.
20:48No caso da brasileira, a gente tem mais flexibilidade da Sinfônica Brasileira.
20:53A gente tem um outro formato de trabalho, a gente tem uma gestão compartilhada.
20:57Então, os próprios músicos deliberam sobre o seu projeto artístico.
21:01Então, eles participam das decisões sobre o escopo do trabalho.
21:05Portanto, as mulheres têm voz ativa e podem deliberar também sobre isso.
21:09Mas nós não temos tantas mulheres em...
21:14A gente não tem acesso...
21:17Porque a gente também não...
21:18A questão de acessar uma orquestra sinfônica profissional
21:21depende de elas terem estudado muito tempo.
21:24E para se manterem nos estudos, também é uma questão.
21:28Então, a gente criou a SB Jovem pensando em atender essas populações.
21:34Mulheres é uma das populações.
21:36Mas aí, quando você estava falando, me veio exatamente essa questão na cabeça.
21:42Você disse que tem uma procura impressionante de vários países,
21:46apenas na segunda edição.
21:48Vocês, quantas mulheres têm na OSB Jovem?
21:53É uma proporção absurda como essa?
21:56A gente teve 50%, mais até do que 50% de inscritas mulheres.
22:02Ah, que ótimo, então.
22:03Então, a gente tem a procura.
22:05Estamos caminhando bem.
22:06Estamos.
22:07Eu acho que o grande desafio é como a gente assegura,
22:11como a gente consegue manter a equidade.
22:15Esse é o meu ponto.
22:16E nesse nosso movimento da ONU...
22:19Não basta inserir, tem que incluir.
22:21Você tem esse sentimento?
22:23Totalmente.
22:24Eu acho que muitas das agendas que envolvem, que discutem a mulher ocupando determinados espaços,
22:31já não tem a ver com incluir ou a mulher ter aquele emprego, ter aquela posição.
22:37Mas e como ela se mantém?
22:38É, tanto que eu tento separar dessa maneira.
22:41Seria diferente de incluir.
22:43Para mim, eu penso incluir exatamente dessa forma.
22:46Você dá ferramentas para que aquela mulher consiga continuar ali por muito tempo.
22:52Ela querendo, evidentemente.
22:54E seria, joga ela ali dentro.
22:56É para ser um número.
22:57Não é assim.
22:59Mas você tem que dar subsídios, tem que dar ferramentas para que ela possa continuar.
23:03E possa subir.
23:04E possa chegar em cargos mais altos dentro de qualquer instituição,
23:08de qualquer emprego, de qualquer empresa.
23:10Não, eu já quero estar, embora, na hora que eu acabar aqui, eu já posso ligar a correira na orquestra,
23:14porque eu acho que a gente acabou de encontrar essa solução.
23:17Não, mas é, de fato, isso que você está trazendo é um amadurecimento dessa agenda
23:22sobre a mulher ocupando determinados espaços.
23:26E o fato da gente ter esse modelo de gestão compartilhada,
23:30permite que eu empodere essa mulher.
23:34Então, essa mulher, ela tem a possibilidade de liberar sobre o seu próprio regime de trabalho.
23:39Isso, para mim, é revolucionário.
23:41Eu nunca vi em nenhum outro lugar.
23:43Nenhuma outra orquestra tem essa possibilidade.
23:46O fato dela ter a possibilidade de deliberar sobre o seu regime de trabalho,
23:52eu já começo por aí.
23:52Porque é uma mulher analisando a sua própria realidade.
23:56Por outro lado, no caso do...
23:59Mas isso foi algo que surgiu na sua gestão?
24:02Foi.
24:03E não tinha...
24:04Puxa, claro que você também.
24:05Mas é uma coisa interessante, porque assim, eu acho...
24:09Um homem também poderia pensar a mesma coisa.
24:11Não é um predicado, é uma coisa particular de uma mulher.
24:14Mas só a gente consegue pensar e lembrar quais são os desafios que a gente enfrenta
24:21na vida doméstica, carreira sendo mãe.
24:24Eu sou mãe.
24:25Eu tenho uma filha de 17 anos fazendo Enem agora.
24:29E eu praticamente criei a Manoela sozinha, assim.
24:35Essa mãe, essa mulher trabalhando e, ao mesmo tempo, morando fora.
24:39Trabalho em Brasília.
24:40Viajo muito.
24:42Eu estou muito distante, muitas vezes.
24:44E como é que a gente cria esses equilíbrios?
24:48Sem cair naquele lugar de, ah, me sinto culpada.
24:51Não.
24:51Como a gente cria o equilíbrio para que a próxima geração perceba que não precisa ser tão sacrificante.
24:57Eu acho que não precisaria ser tão doloroso, né?
25:00A gente consegue criar esses equilíbrios.
25:02E eu acho que o fundamental somos nós, mulheres, conseguindo refletir sobre esses desafios
25:08e como a gente contribui para a economia de uma forma equilibrada e, ao mesmo tempo,
25:11reconhecendo esse valor e, ao mesmo tempo, contando com os homens com quem a gente vai construir
25:16essas realidades novas.
25:17Não, fundamental.
25:18Temos que ter o apoio deles.
25:19Porque não é excluir os homens, né?
25:20Não, não.
25:21É o contrário.
25:22Eu acho que a riqueza do que é a diversidade é a soma.
25:26Sim.
25:26Não é, não é, esse aqui exclui o outro.
25:29Não, é a soma.
25:30Exatamente.
25:30Então, em contextos artísticos, a gente vê muito isso.
25:34Concordo totalmente com você.
25:36O tempo voou e a gente já explodiu o tempo, acredite.
25:39Não, não acredito.
25:40Juro.
25:41Tanta coisa.
25:42É, pois é.
25:43Mas pode, se você quiser dar uma, acrescentar o que você gostaria de falar e não falou ainda,
25:50fica à vontade.
25:51E eu já aproveito para fazer a última pergunta, que é o que significa para você ser protagonista
25:56da sua própria história, da sua própria vida.
25:59Eu vou te dizer, eu amo o nome do programa.
26:04Obrigada.
26:04Amo.
26:05Eu acho que é de uma sensibilidade imensa a gente poder pensar que dentro de um veículo
26:11de comunicação com o El de vocês, pensar que a gente está discutindo o protagonismo
26:16é colocar o foco nas pessoas, que a gente já vem conversando muito sobre isso, mas o
26:21foco nas pessoas, a partir da própria pessoa e como ela se conecta no seu meio, que é o
26:26meu caso aqui, isso tem, isso se traduz, isso traz uma materialidade sobre o que é essa
26:34ser alguém.
26:36E o ser alguém, promover o protagonismo, a gente usa isso, é um valor do nosso trabalho,
26:40protagonismo cultural, participar da vida cultural, promover, acessar a beleza, produzir
26:48beleza, estar ali dentro desse belo, o que eu quero dizer, o belo do espírito humano,
26:52da criação do espírito humano.
26:54Então, para mim, ser protagonista é poder dispor dessa grandeza do que é a criação
27:02do espírito humano e poder colocar à disposição, poder comunicar essa beleza para outras pessoas.
27:09Então, isso, para mim, é ser protagonista da própria vida.
27:12Ah, que lindo!
27:13Muito obrigada, Ana Flávia, adorei!
27:15Eu te agradeço disso, eu te agradeço.
27:16Uma delícia!
27:17E continua esse trabalho tão lindo que você faz.
27:20Obrigada, obrigada.
27:21Uma honra estar aqui com você.
27:22Obrigada.
27:23Obrigada.
Seja a primeira pessoa a comentar
Adicionar seu comentário

Recomendado