- há 6 meses
Duda Teixeira e Rogério Ortega entrevistam o historiador e professor associado do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (IRI-USP) Felipe Loureiro.
Assista ao programa na íntegra: https://youtu.be/hj7fFz7PHO0
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NotíciasTranscrição
00:00Bom, Felipe Loureiro, você que escreveu esse livro, então, Linha Vermelha, sobre a Ucrânia,
00:05e disse aqui para a gente que foi difícil fazer essa análise de um processo multifacetado, complexo,
00:11o que está acontecendo, né?
00:13A pergunta para você é, por que raios o Putin tomou essa iniciativa de ir lá e invadir a Ucrânia?
00:20Alguma explicação, depois de tudo isso que você ajudou a organizar?
00:24Vou pegar duas contribuições que estão no livro para responder a tua pergunta.
00:30E as duas contribuições, elas seguem algum caminho um pouco diferente.
00:33Então, a contribuição do Paul Danieri, que é um professor da Universidade de Califórnia,
00:37e a contribuição do Taras Kuzio, que é um acadêmico ucraniano da Universidade de Kiev.
00:42O Taras, por exemplo, dá, coloca uma responsabilidade muito grande na figura do Putin,
00:47do ponto de vista decisório, para a entrada no conflito.
00:51E aí, um mindset conspiracionista, uma perspectiva que, de fato,
00:56desqualifica completamente a identidade nacional ucraniana, né?
01:01Então, ele realmente entende o Putin como uma figura mais responsável.
01:05O Paul Danieri, e eu tendo a me alinhar um pouco mais a essa perspectiva,
01:09entende que o Putin, sim, ele tem uma noção ultranacionalista sobre o que representa a Rússia, né?
01:15Entende que a Ucrânia faz parte intrínseca da Rússia,
01:19e uma aproximação da Ucrânia com países do Ocidente representaria uma ameaça nacional à Rússia,
01:25particularmente à OTAN, mas o Putin, ele é muito maior, né?
01:28Ou seja, o que o Putin pense, como o Putin age, é muito mais estruturante na sociedade,
01:34especialmente no alto escalão político e militar da Rússia, do que a gente pode imaginar, né?
01:38Então, mesmo figuras que são de oposição ao Putin, como o Alexei Navalny, por exemplo, que está preso,
01:44chegou a dar declarações, né, no sentido de que a Ucrânia e Rússia fazem a mesma parte de nação, né?
01:50São a mesma nação, constituem a mesma nação.
01:53Então, dentro da sociedade russa, especialmente na alta cúpula política e militar da Rússia,
01:58realmente há uma concepção de que a Ucrânia é uma parte intrínseca da Rússia,
02:03particularmente algumas regiões da Ucrânia, como, por exemplo, a Península da Crimeia,
02:07que tem um papel muito grande no imaginário, né?
02:09Nessa geografia imaginada da Rússia.
02:12E aí você me pergunta, por que, então, tomar a decisão da invasão?
02:16Entendendo essa perspectiva do Putin como alguém que é representativo
02:20e que não simplesmente é o único que toma e que possui essas posições,
02:24a partir do momento em que você enxerga que algo intrínseco ao seu Estado e à sua identidade nacional
02:31corre o risco de se separar irremediavelmente de você, né?
02:36Você estaria disposto a assumir riscos que normalmente você não assumiria, né?
02:42Então, o Paul Giannieri, no capítulo dele, ele vai contando como, desde 2014,
02:46com a queda do Yanukovych, que é um presidente da Ucrânia que era mais pró-Rússia,
02:51eu não gosto muito dessa expressão, porque apesar de ele ter posições
02:54que poderiam ser mais alinhadas à Rússia,
02:56ele também faz gestos na União Europeia durante a gestão dele,
03:00mas desde a queda do Yanukovych em 2014, a gente percebe uma Ucrânia
03:06cada vez mais se aproximando do Ocidente em questões estratégicas.
03:10A Rússia invade a Ucrânia na Crimeia, apoia os separatistas no Dombás,
03:15nas duas províncias que ficam mais ali ao leste,
03:18mas ela vai perdendo o controle do restante do país.
03:21E essa sensação de que ela estava perdendo irremediavelmente a Ucrânia,
03:27na visão do Daniel, e eu acho que essa é uma hipótese interessante,
03:30é difícil a gente aferir isso, porque o Kremlin tem um secretismo muito grande,
03:35difícil aferir isso agora, mas é uma hipótese que eu acho que é interessante
03:39para ser verificada posteriormente.
03:41Essa sensação de uma perda irremediável levou a assumir riscos
03:45que numa situação, digamos, normal, o Putin e a elite política e militar russa
03:50não teriam assumido.
03:51A gente comentou isso um pouco antes de entrar,
03:54que a invasão da Crimeia em 2014 tem que ser entendida
03:59como fruto, como consequência da queda do Yanukovych,
04:04que era a época visto como um presidente pró-Rússia, da Ucrânia,
04:08mas que deu para trás na hora de assinar um acordo de cooperação econômica
04:12com a União Europeia.
04:13Enfim, ele estava interessado em fazer esse acordo
04:16e a pressão russa fez com que ele desistisse,
04:18e isso desencadeou os protestos, que a gente chama de Euromaidan hoje,
04:22que levaram à queda dele depois das eleições do Petro Poroshenko,
04:26que foi o antecessor do Zelensky.
04:30Mas, enfim, era uma...
04:32Na época do Yanukovych, parecia que o Kremlin, de alguma forma,
04:36se contentava com um presidente em que eles pudessem influir ali,
04:43de modo mais ou menos decisivo, a não se aproximar tanto do Ocidente.
04:47E a coisa evoluiu de uma tal forma que o que o, claramente,
04:52pelo menos para a gente que vê daqui,
04:53o que o Putin quer agora é botar um Lukashenko em Kiev,
04:57botar um, como o Lukashenko, o Alexandre Lukashenko, o ditador de Belarus,
05:01que é um aliado fidelíssimo do Putin,
05:05é basicamente um fantoche da Rússia,
05:08e ele quer colocar, tirar o Zelensky do poder,
05:10e colocar alguém absolutamente fiel a Moscou também.
05:13Então, o Yanukovych, a impressão que eu tenho é que o Yanukovych agora não bastaria.
05:18Você vai ver se é alguém mais...
05:20O problema é que não me parece que ele tem condições hoje
05:25de sonhar com uma figura que seja um títere na Ucrânia
05:30que seja completamente dominado por Moscou.
05:33Muito possivelmente, esse era o objetivo no início do conflito.
05:38Uma mudança de regime de Kiev, tanto é que o discurso...
05:41Eu acreditava que isso talvez fosse possível.
05:43É, eu diria que essa cúpula, essa alta cúpula política militar russa
05:47entendia a desnazificação, que era esse termo utilizado comumente,
05:52como, digamos, o símbolo para cortar a cabeça da elite política de Kiev
05:57e reconstruir essa elite política com um grupo absolutamente,
06:02aí sim, pró-Rússia, até o último fio de cabelo.
06:05Na medida em que a guerra evoluiu para algo muito mais complicado,
06:09a Batalha de Kiev foi...
06:11A Rússia sofreu uma derrota muito significativa na chamada Batalha de Kiev
06:14e teve que reposicionar suas forças, focando única e exclusivamente no Dombássio.
06:19E mesmo agora, vem sofrendo derrotas importantes, derrotas do Nordeste,
06:24que foi desocupado por tropas ucranianas na região da província de Kharkiv.
06:29E, como você citou anteriormente, o caso de Kherson, que foi retomada,
06:34que era a única capital provincial que estava nas mãos dos russos.
06:37E agora a Ucrânia está, pelo menos aí há uma especulação,
06:41existe a possibilidade dos ucranianos ameaçarem algo que é absolutamente estratégico
06:46para a Rússia nesse conflito, que é essa ponte terrestre entre o território russo
06:50e a Península da Crimeia.
06:51Lembrando que não há uma confirmação oficial,
06:54mas tudo indica que a Ucrânia esteve envolvida no atentado,
06:59na ponte que liga a Rússia à Península da Crimeia.
07:02A ponte ainda está passando por obras,
07:04ela funciona, mas ela não funciona com capacidade plena.
07:07Se a Ucrânia, por exemplo, nessa ofensiva que se desenvolve,
07:11que agora está mais ou menos parada,
07:13mas nada indica que ela de fato vai continuar parada por meses.
07:17Acho que há uma expectativa das tropas ucranianas de continuar.
07:20Se existe uma ameaça a essa ponte terrestre entre Rússia e Crimeia,
07:26a situação da Rússia na guerra vai ficar muito difícil.
07:28Tudo isso estou te dizendo que, apesar do sonho poder ter sido um Lukashenko,
07:32hoje a situação é mais complicada,
07:34que é um pouco a resposta que eu dava para o Duda anteriormente.
07:36A situação da guerra para a Rússia no curto e médio prazo não é muito boa,
07:41mas é óbvio que, caso esses reservistas de fato consigam ser integrados,
07:47treinados, equipados e a Rússia consiga respirar,
07:50a gente pode ter uma reversão no conflito,
07:52mas no curto e médio prazo esse sonho de um Lukashenko está muito distante.
07:57Felipe, bom, o Putin, uma das coisas que ele usa para justificar essa invasão
08:03é falar da OTAN e no final a gente vê que a OTAN fica fortalecida,
08:09os Estados Unidos entram ali super ajudando os ucranianos
08:12e aí você muda um pouco também essa relação Rússia e Estados Unidos.
08:19Você tem um capítulo no livro que é sobre a nova Guerra Fria,
08:23se isso é uma Guerra Fria ou não.
08:26A gente está tendo uma Guerra Fria 2.0 com essa guerra na Ucrânia ou não?
08:31A resposta do capítulo é não.
08:34Se a gente for olhar a Guerra Fria e entender a Guerra Fria como um embate
08:39entre dois projetos de modernidade, que eram dois projetos antagônicos,
08:44uma modernidade baseada em economia de mercado
08:47e uma modernidade baseada em uma economia planificada, coletivista,
08:52um tipo de sistema internacional capaz de incitar corações e mentes
08:59a levar pessoas a literalmente dedicar suas vidas para colocar em prática
09:04esse tipo de sociedade, esse tipo de modernização que estava em embate uma com a outra
09:08e, ao mesmo tempo, uma União Soviética que possui uma capacidade de projeção de poder global
09:14em que, pese o fato, no continente americano, essa projeção de poder ser mais limitada.
09:20Mas a União Soviética tinha uma capacidade de projeção de poder muito significativa durante a Guerra Fria.
09:26Colocando todos esses elementos em curso, a gente percebe que o acirramento das tensões
09:30entre Estados Unidos e Rússia, ele não representa, pelo menos até então,
09:35não parece representar um embate entre dois grandes sistemas de mundo.
09:39Pelo contrário, você tem figuras dentro da política norte-americana
09:43e que são figuras muito influentes que advogam uma visão de mundo
09:47que é bastante próxima à visão do Putin, coisa que seria impensável durante a Guerra Fria.
09:53Você ter, por exemplo, um presidente, um candidato a presidente do Partido Comunista
09:58nos Estados Unidos com uma chance real de vitória.
10:01Se a gente for olhar a visão de mundo do Trump e do trumpismo, tem muitas relações com que o Putin advoga
10:07em termos de neoconservadorismo, família.
10:09Então, não me parece que é um grande embate de valores e modernidade, em termos de diferentes tipos de modernidade.
10:15A capacidade da Rússia de projeção global de poder, ela realmente diminuiu muito,
10:20em que, pese o fato da Rússia claramente tentar isso e venha ampliando sua presença na África,
10:25mesmo na América Latina, tendo contatos com Venezuela, com Cuba, etc.
10:30Mas é uma capacidade muito diminuída.
10:33E tem um outro elemento que o capítulo discute, que é até que ponto, e há muitos analistas que levantam essa hipótese,
10:39essa nova Guerra Fria é uma Guerra Fria que seria um triângulo.
10:42Ou seja, os Estados Unidos e a China e a Rússia sendo, digamos, esse novo bloco.
10:47E aí um dos pontos que eu argumento no capítulo é que é fundamental entender o quão imbricados são as economias
10:54e as finanças do norte global ocidental rico com a China, a leste asiático.
11:00Tem muito investimento de um em outro, do norte global na China e vice-versa,
11:05para se configurar uma situação que era de Estados Unidos e União Soviética na Guerra Fria,
11:09em termos de investimento em cada um.
11:11Exato. O que não significa que algum tipo de desvinculação não possa e não esteja acontecendo.
11:16Ou seja, a gente vê um discurso de ambos os lados, tanto do lado da China quanto do lado norte-americano e aliados,
11:24de segurança alimentar, de segurança energética, segurança tecnológica.
11:29Isso significa o quê, na realidade?
11:30Significa eu ter esse tipo de produto, esse tipo de tecnologia, essa oferta, digamos assim,
11:36em áreas que são seguras ao ponto de eu ter clareza que qualquer tipo de tensão internacional não haverá disrupção.
11:43Na minha oferta de alimentos, na minha oferta energética, na minha oferta de tecnologias absolutamente estratégicas.
11:49Isso pode e talvez, e muitos apostam, que levará a algum tipo de, digamos, de maior separação entre essas economias.
11:59Agora, pensar no grau de separação que a gente teve durante a Guerra Fria, com a União Soviética e o Bloco Soviético,
12:05com um percentual de comércio, interação financeira muito pequeno com o Ocidente, é dificílimo.
12:11E se isso, de fato, evoluir, aí a gente está falando de uma crise econômica gravíssima, né?
12:16Porque é um tipo de separação que vai doer muito, né?
12:20Para ambas as partes.
12:21É a disrupção mesmo.
12:22Completamente.
12:23O que não significa que a relação entre Estados Unidos e Rússia não seja uma relação que está evoluindo,
12:28e mesmo Estados Unidos e China, para uma crescente tensão, né?
12:32Que é um pouco como o capítulo argumenta no final, que é uma rivalidade estratégica.
12:36E isso é grave, né?
12:38De você ter duas potências nucleares, no caso aí Estados Unidos e Rússia,
12:42que estão se enxergando como a sua principal ameaça,
12:45uma das principais ameaças à sua segurança nacional.
12:49E são duas potências nucleares, né?
12:51Essa é uma outra linha vermelha que essa guerra cruzou.
12:54A liderança russa, particularmente o Putin, mas não só o Putin,
12:59o Medevdev, que foi o presidente russo e que hoje está como vice do Conselho de Segurança Nacional da Rússia,
13:06usa também um linguajar irresponsável no que se refere à possibilidade de empregar armes nucleares.
13:14É uma linha vermelha gravíssima, né?
13:16Ou seja, desde o final da Guerra Fria, que a gente não tem alta cúpula política de superpotência
13:22dizendo na possibilidade de uso de armas nucleares.
13:25Lembra um pouco a coisa da crise dos mísseis em Cuba, né?
13:27A gente pensava que eu estivesse livre disso nos últimos 30 anos.
13:32Isso é assustador, né?
13:34Então, essa rivalidade estratégica entre potências nucleares,
13:38isso não significa uma Guerra Fria,
13:40mas não significa que é algo que a gente tem que ficar tranquilo também.
13:42Porque não é um mundo, digamos, que do ponto de vista dos desafios que nós temos,
13:48de mudança climática, questão de alimentação, pobreza, desigualdade no sul global,
13:54não é um mundo que a gente gostaria de ter, né?
13:56Os países que são potências nucleares enxergando um ao outro como uma ameaça existencial.
14:01E aí você pode ter crises em que as coisas podem sair do controle.
14:05É a gravidade desse momento que eu acho que é fundamental passar para o telespectador,
14:10para o telespectador, o quão a gente está falando de um conflito,
14:14que não é porque está acontecendo na Europa que ele é importante,
14:16mas é o fato de você ter uma potência nuclear num território,
14:20que é um território europeu, que é no caso na Ucrânia,
14:22que é muito próximo a territórios de países que formam a aliança militar norte-americana na Europa,
14:29que é a Organização para o Tratado do Atlântico Norte.
14:32Um tipo de transbordamento desse conflito,
14:34a gente está falando de um conflito direto entre Estados Unidos e Rússia.
14:37E é algo que eu tenho até muita dificuldade, Lude Rogério, de elaborar.
14:42O que seria um conflito entre Estados Unidos e Rússia no século XXI?
14:47É algo inimaginável como a coisa pode escalar.
14:49A gente teve recentemente um caso de um ataque que chegou no território polonês,
14:56e que inicialmente atribuiu-se à Rússia,
14:59e depois verificou-se, apesar da Ucrânia não ter admitido isso,
15:03que era uma defesa de míssel ucraniano contra mísseis russos.
15:06E se tivesse sido um míssel russo que tivesse atacado a Polônia?
15:10A Polônia faz parte da OTAN.
15:11Como é que a OTAN responderia?
15:13Então, é um contexto realmente muito grave.
15:16Não é uma guerra fria, mas essa rivalidade estratégica,
15:19que essa guerra da Ucrânia exemplifica de maneira perfeita, eu diria,
15:23ela é muito grave para o sistema internacional.
15:36que essa guerra da Ucrânia é muito grave para o sistema internacional.
15:41Então, é uma guerra fria, mas essa guerra da Ucrânia é muito grave para o sistema internacional.
15:43Então, é uma guerra fria, mas essa guerra da Ucrânia é muito grave para o sistema internacional.
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