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  • há 2 meses

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00:00Olá, estamos dando início a mais um Ponto de Vista.
00:12Hoje vamos falar sobre cultura, sobre literatura.
00:16O nosso convidado é o escritor e jornalista pernambucano Ney Anderson,
00:20que acaba de lançar o segundo livro dele na Flip,
00:23a Festa Literária Internacional de Paraty, no Rio de Janeiro.
00:27Ney, seja muito bem-vindo. É um prazer receber você aqui no Ponto de Vista.
00:33Obrigado, Fernando. O prazer é meu estar participando aqui do seu programa.
00:36A gente sabe que você acaba de lançar esse livro, o Apocalipse Todo Dia,
00:41que é um livro de contos. Como foi que surgiu esse livro?
00:45Esse livro surgiu nos últimos cinco anos.
00:48Depois do meu primeiro livro, eu comecei a escrever esse segundo livro.
00:51E são contos curtos, ambientados no Recife, com vários personagens que estão ali
00:59tentando algum tipo de redenção, algum tipo de salvação.
01:04E com as suas histórias dramáticas, as suas histórias que se intercruzam nessa metrópole,
01:11que é a capital pernambucana, sempre muito ensolarada, sempre com o Capibaribe cortando.
01:15E que tem várias histórias curtinhas, que justamente se conectam em algum momento uma com a outra.
01:23Então esse livro foi escrito ao longo de cinco anos.
01:26E é um livro bem assim, bem direto, bem incisivo.
01:29Até por isso esse título Apocalipse Todo Dia, que trata justamente dessa questão
01:34desses apocalipses cotidianos, diários, que a gente vivencia nos telejornais,
01:39na vida, que a gente vê, a gente observa, mas com as tintas da ficção, que é o meu interesse.
01:49O livro fala, como você mesmo disse, histórias que se passam aqui no Recife.
01:54Como foi que você fez para que esses personagens agissem e vivessem aqui no Recife?
02:01Naturalmente, né? Eu costumo dizer que o Recife é o meu ambiente natural, assim.
02:09Assim como o Rio de Janeiro de Rubem Fonseca, sabe?
02:12A Curitiba de Dauta Televisão, Salvador de Jorge Amado, só para ficar em alguns.
02:17A Recife é a minha Gotham City, assim.
02:20É a cidade onde eu uso não apenas como ambiente, mas como uma personagem também.
02:26Recife é uma cidade que faz parte, ela não é só um cenário.
02:30Ela é uma cidade que faz parte do enredo de verdade, assim, de fato.
02:35Ela ajuda a compor toda essa atmosfera que o livro apresenta, né?
02:40Agora, o livro foi lançado na Flip, né?
02:42Agora na festa literária lá de Paraty.
02:46E eu queria que você, que é uma das principais festas literárias, né?
02:49Queria que você falasse um pouquinho como foi essa experiência.
02:53Rapaz, foi incrível.
02:55Eu nunca tinha ido a Paraty, na Flip.
02:57E, assim, não sei porque não fui antes, mas tudo tem o seu tempo, não é?
03:01Eu fui como autor agora.
03:03Eu peguei o livro lá, inclusive...
03:04A gente está até com algumas imagens aí, olha, de você lançando lá o livro, né?
03:08Lá na Flip.
03:10Pois é.
03:10E como foi conviver com tantos escritores, com tantos leitores?
03:14Enfim, com gente que gosta de literatura, né?
03:17Pois é.
03:18Foi uma experiência incrível, como eu estava falando, porque eu nunca tinha ido.
03:20E, assim, ir como autor tem um peso maior, não é?
03:25Lançar o meu livro lá.
03:25Inclusive, eu peguei esse livro lá a primeira vez.
03:28Eu só vi lá o livro.
03:29Foi uma emoção dupla.
03:31De pegar o livro e de, no outro dia, lançar o livro.
03:34E foi uma recepção muito boa que eu tive.
03:36Muitos autores, muitos leitores lá foram prestigiar o lançamento.
03:39No meio daquele mar de lançamento todo, né?
03:43Aquela quantidade enorme de lançamentos acontecendo na mesma hora, simultaneamente.
03:47As pessoas foram lá me prestigiar e eu fiquei muito feliz, fiquei muito agradecido por estar na Flip lançando.
03:54Porque esse livro merecia muito e merece encontrar outros leitores também.
03:59A Flip foi de quarta, foi realizada em julho, tá?
04:03E foi realizada de quarta a domingo.
04:05Você me dizia, antes da gente começar aqui a entrevista, que você chegou na terça.
04:09Foi.
04:09Então, deu pra viver bem essa experiência de Flip.
04:13Flip, você nunca tinha ido, mas foi aproveitando tudo dessa vez.
04:18Cheguei na terça e fui embora na segunda.
04:20Ou seja, aproveitei a Flip mesmo em sua totalidade.
04:23Eu disse pras pessoas quando eu voltei, né?
04:25Que foi uma imersão no mundo da literatura.
04:28A Flip é diferente de Bienais, de outros eventos do setor,
04:31porque a cadeia do livro inteira tá ali.
04:34E pessoas apaixonadas pela literatura, pela ficção.
04:36Então, você andava assim, tinha poétias, reclamando poesia, lançamentos, saraus.
04:42Era realmente um universo ali.
04:44É a Disney dos escritores.
04:46É incrível isso.
04:47Agora, Ney, o Apocalipse Todo Dia vai ser lançado, foi lançado na Flip,
04:53mas vai ser lançado aqui na próxima sexta-feira, dia 29,
04:56na Casa Estação da Luz, em Olinda, né?
04:59Como é que tá a expectativa pra esse lançamento aqui na sua terra?
05:03Ó, a expectativa tá alta, né?
05:04Tô um pouquinho nervoso, inclusive, com esse lançamento,
05:06porque, primeiro, eu não consegui lançar por conta da pandemia.
05:10E, assim, eu quero que todo mundo vá pra esse lançamento.
05:13É um livro muito interessante.
05:15É um livro que ele tá mais, digamos, mais conciso, mais maduro.
05:20E a expectativa tá muito boa.
05:21E é um local muito interessante, né?
05:23A Casa Estação da Luz, que pertence ao Senhor Valença, né?
05:26Então, tem toda essa energia circulando também,
05:29que eu acho que contribuiu.
05:31Inclusive, foi um convite que me fizeram.
05:33Eu nem tava buscando a Casa Estação da Luz.
05:34E quando eu disse que eu queria lançar, apareceu o convite.
05:39É um local que acontece sempre esse tipo de evento lá em Olinda, não?
05:43É, se transformou num espaço cultural, né?
05:45Aí tem shows, apresentações teatrais, eventos, lançamento de livros.
05:51Então, o espaço já tem essa energia por ser em Olinda, né?
05:53Naquele sítio histórico.
05:55Eu tô saindo de um, que é a Flip, tô indo pra outro agora,
05:57que é o sítio histórico de Olinda.
05:59Então, a energia tá na mesma frequência, digamos assim.
06:04Agora, Ney, além de jornalista, você é também crítico literário, né?
06:08Você teve até uma coluna numa rádio, né?
06:10Onde você semanalmente falava sobre literatura.
06:14Como foi que começou esse seu interesse pela literatura?
06:18Ó, Fernando, o meu interesse pela literatura vem muito, há muito tempo, né?
06:24Eu sempre fui um leitor, sempre fui incentivado a ler em casa,
06:27mas ler no sentido da escola, na parte escolar.
06:31Mas o que me abriu mesmo o mundo da literatura
06:34foi a leitura do livro Don Quixote.
06:36E eu acho que depois que eu comecei a falar isso,
06:39muita gente fala a mesma coisa, que o Don Quixote abriu o universo.
06:43E, de fato, comigo isso foi muito verdade.
06:44Depois que eu li aquelas loucuras ali de Don Quixote com Sancho Panza,
06:49parece que é um antes e um depois, sabe, na minha vida.
06:52A partir dali, eu começo a me interessar realmente por literatura, por leitura,
06:57algo que eu sou apaixonado até hoje.
06:59É o meu vício mesmo, é a nossa cachaça, né?
07:01Agora, o Don Quixote é um livro bem denso, bem grosso.
07:05Você leu o original ou leu algum livro adaptado já pra adolescente?
07:10Como foi o teu primeiro contato com o Don Quixote?
07:13Não, esse primeiro contato foi uma edição juvenil, bem fininha, inclusive.
07:18À medida que eu fui crescendo, que ali foi por volta de 11, 12 anos, mais ou menos.
07:23Quando eu fui crescendo, eu fui buscando o texto original, li o texto original depois disso,
07:28e continuei lendo.
07:29Inclusive, eu comprei um novo agora, no ano passado,
07:32que foi publicado pela Antofágica, uma edição lindíssima,
07:36que o primeiro volume foi lançado no ano passado, vai ser lançado agora o segundo,
07:40ainda sem data, que é uma edição belíssima, com várias gravuras,
07:42de vários artistas do mundo inteiro que reproduziram o Don Quixote.
07:46E eu continuo lendo o Don Quixote.
07:47Toda vez que eu leio alguma coisa, eu descubro algo diferente naquele livro.
07:51É um livro que não se esgota, é um livro interessantíssimo.
07:55Agora, Ney, em que momento, assim, você era um cara já que gostava de ler,
08:00gostava de literatura, mas quando foi que surgiu aquele estalo, assim,
08:05eu quero ser escritor?
08:06Pois é, isso vem muito em conjunto, assim, né?
08:10Anda muito em paralelo, porque a partir do momento que eu comecei a ler,
08:14eu comecei a fabular, começar a fabular as minhas próprias histórias,
08:18mas não sabia que aquilo era querer ser escritor, não é?
08:22Então, foi acontecendo naturalmente com o tempo.
08:26A partir de determinado momento, como eu estava rascunhando contos,
08:29textos que eu não sabia o que eram contos, cenas, diálogos,
08:33eu tenho isso até hoje, uma parte disso escrita lá, sabe?
08:37Impulsos criativos, não é?
08:39E depois eu fui crescendo, né?
08:41Fui me tornando uma pessoa madura, né?
08:43Mais idade.
08:44E aí sim, aí eu comecei a ter essa compreensão
08:47de que a literatura poderia ser uma atividade também
08:50até antes do jornalismo, até antes de eu pensar em ser jornalista.
08:54A literatura já se impôs, assim, já começou a aparecer
08:56como uma forma de uma expressão artística mesmo, sabe?
09:01E que continuou e depois veio o jornalismo e se misturou tudo
09:04e eu estou aqui até hoje fazendo isso.
09:06O Apocalipse Todo Dia tem 35 histórias, né?
09:09Para ter um livro que não é tão grosso, né?
09:12Para ter 35 histórias, tem histórias de uma página, duas páginas só, né?
09:18Tem histórias bem curtas.
09:19Como é que você define que aquela história está acabada,
09:24aquela história pode se resumir em duas páginas, por exemplo?
09:27Na verdade, o que tem menos contos, assim, é o outro.
09:31Esse aí tem 67 histórias.
09:32Ah, esse, o 35 é o seu primeiro livro, 33.
09:36Esse tem mais histórias.
09:39Por isso são menores as histórias, essa última.
09:42São contos, assim, que não passam de uma página ou até uma página e meia,
09:46mas, em geral, conto de uma página, meia página.
09:49E é um livro que eu quis ser mais direto, sabe?
09:52A história, assim, começo, meio e fim, boa parte delas,
09:56mas uma outra parte não tem esse final, ficam em aberto.
09:59Eu gosto muito de escrever dessa forma,
10:01de não encerrar igual a vida, né?
10:03A gente, mesmo quando morre, quem acredita na pós-morte,
10:07sabe que tem algo que vai para outro universo aí que a gente não sabe o que é.
10:11Então, eu penso dessa mesma forma na literatura.
10:13Eu nunca encerro totalmente um conto no ponto final.
10:16O ponto final só é um detalhe para as histórias continuarem acontecendo na cabeça do leitor, né?
10:21Certo. Você até separou, você está com outro exemplar aí, né?
10:25Você separou uma das histórias para ler aqui para a gente.
10:28Pode dar uma lida agora?
10:30Posso.
10:31Vamos lá.
10:32Qual o conto que você vai ler?
10:34Fale Agora ou Cale-se para Sempre.
10:37Diga aí.
10:37São contos mais insensíveis, né?
10:40Era só questão de tempo ele dizer na frente de todos que me amavam.
10:44Era só questão de tempo ele me beijar no altar e todos aplaudirem a nossa união.
10:48Era só questão de tempo as juras de amor na lua de mel.
10:52Era só questão de tempo ele chegar fora do horário embriagado
10:55e me bater por eu apenas perguntar onde ele estava até aquele momento.
10:59E depois ele me dizer que o período da quarentena havia acabado.
11:02Que o mundo agora estava livre, menos eu.
11:04Que o lugar de mulher era em casa.
11:06Que o confinamento tinha provado isso.
11:09Era só questão de tempo eu entrar em depressão depois de meses
11:12vivendo uma relação pandêmica viral.
11:15Era só questão de tempo o meu corpo sem pulso em cima da cama.
11:18Era só questão de tempo.
11:20Matá-lo agora ou calar-me para sempre.
11:23Muito bem.
11:24Você disse que decidiu ser escritor exatamente quando você falou?
11:30Até antes de ser jornalista.
11:32Foi.
11:32Você decidiu ser escritor.
11:33A partir do momento que você decidiu ser escritor, quais foram os próximos passos?
11:38Eu comecei a buscar alguma coisa que pudesse me auxiliar.
11:42Me ajudar a compreender como é que eu poderia fazer literatura.
11:46E foi aí quando eu descobri a oficina de Raimundo Carreiro.
11:50Eu entrei lá em 2006, mais ou menos, em 2007.
11:53E a oficina de Raimundo Carreiro me abriu um leque de possibilidades.
11:58A oficina me ajudou muito.
12:01O Carreiro me ajudou muito a compreender o que eu estava fazendo.
12:05Era realmente literatura.
12:06O que não prestava para entrar em uma história.
12:09Ou o que seria interessante entrar em uma história.
12:11Então, a oficina, eu costumo dizer, eu passei lá uns 3, 4 anos.
12:15E eu ia toda semana assim com afinco.
12:17Eu adorava.
12:18Chegava o anterior horário para ficar conversando com ele.
12:21E a oficina me deu algo que eu acho que universidade nenhuma poderia me dar.
12:26Porque o conhecimento de carreiro, a cultura que ele tem,
12:29a paixão que ele tem pelos livros, pela literatura,
12:32é algo que se encaixou com o meu universo, sabe?
12:35Então, a oficina me ajudou a moldar o escritor que eu queria ser.
12:39Você acha que ela foi importante na sua formação como escritor, então?
12:43Foi demais, demais.
12:44Eu acredito até hoje.
12:45Até hoje eu ligo para a Carreiro quando eu escrevo algum texto.
12:47Carreiro, lê aí o que é que tu acha.
12:49Pede a opinião dele.
12:50Peço.
12:51Agora, a opinião sincera, tá?
12:53Porque a gente tem amigo que ele passa a mão, não.
12:55Eu mando para ele.
12:56Não presta, não.
12:56Jogue fora e faça de novo.
12:58Ele fala assim mesmo?
12:59Ele fala, ó, de um tempo para cá ele está mais comedido.
13:02Ele fez, olha, acho que você poderia melhorar aqui, melhorar ali.
13:05O texto não está bom ainda, sabe?
13:07Eu mando para ele, ele dá esses...
13:09Não mando muita coisa, mas eu mando de vez em quando.
13:11Essa crítica é muito importante também, né?
13:13Se você só ouvisse elogios, seria mais difícil até de melhorar o teu trabalho, né?
13:19Exatamente.
13:19Quando a pessoa aponta algumas falhas, algumas imprecisões,
13:24eu imagino que para o escritor que está começando é bastante importante,
13:29É importante porque você tem que pensar, no caso eu penso, como profissional mesmo.
13:33Esse livro eu botei na mão de um preparador de texto.
13:36Um preparador de texto é aquele cara que ele pega o livro, lê literariamente e fala, ó,
13:41está sem lógica isso aqui com isso aqui.
13:44Vê uma forma de você mudar isso aí, alterar esse parágrafo, botar para cima e para baixo.
13:48Então é todo um trabalho em conjunto até o livro sair de fato.
13:51Isso aí é um cuidado, né?
13:53Que a gente tem que ter com o que está fazendo, para não chegar na mão do leitor,
13:56uma coisa mal feita, mal acabada.
13:58E passa por todo um processo, né?
13:59Muitas leituras.
14:01É por isso que muitos escritores dizem que não gostam de reler os seus trabalhos,
14:04porque já leu tanto, já passou tanto tempo com aqueles personagens,
14:07e agora quando o livro sai eles se tornam filhos do mundo, né?
14:11O preparador de texto é uma pessoa da editora, indicado pela editora ou não?
14:17Se for uma editora grande, eles têm esse trabalho.
14:19Mas no meu caso eu contratei uma pessoa, que foi o Santiago Nazarian,
14:23que é um escritor de São Paulo, que tem vários livros publicados,
14:26ele trabalha dessa forma, né? Fazendo esse tipo de serviço.
14:29E eu contratei outra pessoa que é muito sincera nas análises dele, sabe?
14:33Esse livro a gente, ele mandava, ele retornava o texto, assim,
14:36a gente trabalhou, até eu dizer assim, não, pronto, o livro está pronto aqui.
14:41Aqui ninguém interfere, aqui já está, chegou numa qualidade que eu queria chegar,
14:45porque é um olhar muito de um leitor, de um escritor e de um profissional que está dentro, né?
14:51Que sabe o que é que funciona e o que é que não funciona mais.
14:53De cortar, de enxugar, enfim.
14:56Ok, Ney, vamos fazer um rápido intervalo.
14:59Você que está acompanhando a gente, não saia daí.
15:01A gente volta já já.
15:06O Ponto de Vista está de volta.
15:16Hoje estamos recebendo aqui o escritor e jornalista Ney Anderson.
15:21Ney, quais são as grandes influências literárias para você?
15:25Quem Ney Anderson gosta de ler?
15:27Fernando, eu leio o autor que eu mais li na vida, foi Carreiro, Raimundo Carreiro.
15:34Antes de entrar na oficina, eu li um livro dele que eu encontrei por acaso, não sabia da existência dele.
15:39Lá em 2004, 2005, um livro chamado Sinfonia para Vagabundos,
15:44que se passava no Recife também, assim, eu comecei a ler o livro.
15:48Eu disse, caramba, aí pode escrever dessa forma, tal.
15:50Comecei a buscar, comecei a ler, até que eu entrei na oficina e li tudo o que ele escreveu.
15:55Mas a partir daí, para falar de literatura pernambucana, começar por ela,
15:59eu sempre gostei muito de Gilvan Lemos, Luzilar Gonçalves Ferreira,
16:03Marcelino Freire, que escreveu A Orelha desse livro aqui.
16:07Outra influência, sim, outra leitura, porque é um contista.
16:10Escreveu alguns romances já, mas basicamente Marcelino é um contista.
16:13E sempre me empolgou demais essa literatura que ele faz, mas também...
16:18E é um contista que tem tido uma projeção muito grande nacionalmente, né?
16:21Ganhou o Jabuti, ele é um muito bom contista.
16:24Os contos se transformaram em peças de teatro, né?
16:28Pelo coletivo Angu de Teatro, aqui do Recife.
16:31E, assim, essa literatura mais urbana sempre me atraiu muito.
16:35Rubem Fonseca, Dalto Trevisan, sabe?
16:39Clarice Lispector daqui, que é ucraniana,
16:42mas eu digo sempre que Clarice é daqui, de Pernambuco, né?
16:44Ninguém tira, pra mim ela é nossa.
16:46Mesmo tendo vivido a vida quase toda no Rio de Janeiro.
16:49É, mas a influência que ela recebeu aqui no começo da vida,
16:52na primeira parte da vida dela...
16:54A infância, né?
16:56É, isso tá traduzido nas obras dela.
16:58Até a obra mais madura, você percebe um eco ali de Pernambuco, de Recife ali.
17:03E, assim, Rubem Fonseca foi um cara que...
17:06Um escritor que eu li demais na minha vida.
17:07Qual o livro de Rubem Fonseca que marcou mais o leitor Ney Anderson?
17:13Olha, tem aquele...
17:15É um livro...
17:17Feliz Ano Novo.
17:18Feliz Ano Novo.
17:19Ano Velho é de Rubem Fonseca, que é outro que eu gosto também.
17:22Sim, sim.
17:23Marcelo Rubem Fonseca, mas Feliz Ano Novo,
17:25que é um livro de contos, né?
17:28Que se passa na noite de Réveillon e é um crime, né?
17:31Um crime, mas você lê aquilo ali...
17:34Tô empolgado, você tá vendo que é um crime, uma coisa muito pesada,
17:36mas é uma forma literária tão interessante que você vai até o final
17:41e você sai do final daquele texto empolgado, sabe?
17:45Porque você vê uma literatura ali que ela se traduziu de uma forma pouco usual ali,
17:50uma coisa violenta, mas pintado com as tintas da literatura, né?
17:55Até o próprio Marcelo Rubens Paiva, né?
17:57Que é o Feliz Ano Velho, que é a experiência dele, que na verdade,
18:02ele até falou um tempo desse, que é uma baseado, assim, na história dele,
18:08mas não é totalmente assim, né?
18:09Tem muita ficção ali também.
18:12Então, esses autores da literatura, dessa literatura mais urbana,
18:16sempre me atraiu demais.
18:18D'Alto Trevisan, com os contos bem curtinhos, né?
18:21Aí depois, Machado de Assis, que eu já li na escola.
18:25Mas Machado, eu só fui começar a ler Machado,
18:28entender Machado, eu gostar de Machado depois de Maduro.
18:30Acho que quase todo mundo é assim, né?
18:32Você lê Machado de Assis na escola, não entende nada,
18:36e aí, quando volta ele já na vida adulta, é que você passa a gostar mesmo.
18:41É, porque eu acho que as escolas não sabem passar Machado de Assis
18:45da forma que vai passar.
18:47Porque é um escritor com um personagem complexo,
18:50e eu acho que em determinado período ali escolar,
18:54eu acho que não é tão interessante apresentar Machado,
18:57mas que esteja lá sendo bem apresentado de alguma forma.
18:59Mas Machado realmente é um brusco, não fala que é um brusco do Cosme Velho,
19:03porque ele fazia realmente bruxaria com as palavras, né?
19:06Você lê um conto, por exemplo, feito A Causa Secreta,
19:09onde a causa secreta do conto é de um homem que gostava de ver
19:12o sofrimento de outras pessoas.
19:14Ele ficava feliz com o sofrimento de outras pessoas,
19:17sem as pessoas saberem disso.
19:19Era um sádico.
19:20Era um sádico, mas é de uma forma tão assim
19:22que você começa a entrar na personalidade daquele homem doente, assim, né?
19:27E é interessante.
19:28Leia o Machado de Assis.
19:29Até recomendo aqui, leia o Machado de Assis, porque está tudo ali.
19:32E da literatura contemporânea, eu posso indicar Cícero Belmar,
19:37que é um autor que ele é jornalista, que é daqui,
19:40que assim, não para de escrever.
19:41Ele até escreveu um livro sobre Lolita,
19:43aquela personagem icônica daqui do Recife, né?
19:46Que é uma travesti.
19:47Vai lançar.
19:48Daqui a pouco ele está lançando esse livro, está inédito ainda.
19:52Mas também Cleito Cabral, é um escritor daqui de Pernambuco.
19:55Raimundo de Moraes, sabe?
19:58Conceição Rodrigues e Aranda Barbosa.
20:01São todos autores nossos.
20:02E para sair um pouquinho aqui do universo,
20:04eu gosto de muita gente.
20:05Eu gosto de Ale Mota, que é uma contista lá do Rio de Janeiro.
20:10Aí tem o Luiz de Richard, que é do Paraná.
20:12Tem o Andretin, que é de Chapecó.
20:16Santiago Nazareã, que eu citei aqui,
20:17que eu sempre li Santiago Nazareã.
20:19E assim, uma gama enorme, né?
20:21Ana Paula Maia, por exemplo, eu gosto muito.
20:24Literatura policial, Rafael Montes,
20:27que é um escritor aí que está bombando na mídia.
20:30Quando o Rafael Montes, inclusive, foi apresentado a mim,
20:33ele estava lançando Dias Perfeitos,
20:35que foi o segundo livro dele que fez sucesso,
20:37que vai virar até uma série agora.
20:39E Rafael Montes me escreveu,
20:42mandou o livro, eu fiz uma entrevista com ele.
20:44E depois, não é por conta de mim, né?
20:46Mas depois daquela entrevista,
20:49Rafael Montes cresceu e publicou outros livros.
20:52Então, assim, eu estou sempre lendo
20:54toda essa literatura contemporânea também.
20:57E de fora, sabe?
20:59Da literatura estrangeira,
21:01quem é que você gosta mais de ler?
21:02Olha, eu gosto muito da literatura latino-americana.
21:06Tem uma autora argentina,
21:08Samantha Schwembley,
21:09que ela é o mesmo universo, eu acho,
21:14da literatura brasileira contemporânea.
21:16É um universo grotesco,
21:17que é muito próximo também de Ana Paula Maia,
21:20que é outra escritora que eu gosto muito,
21:22que é lá de Curitiba,
21:23mas mora no Rio, se eu não me engano.
21:26Ela sempre com esse universo bruto,
21:28de homens,
21:29de suspense, de mistério,
21:31de sobrenatural, de certa forma.
21:33Então, a literatura latino-americana,
21:36começando por Gabriel Garcia Marques,
21:37eu acho que dá um eco muito grande no Brasil.
21:40Assim, eu acho que os escritores daqui,
21:42eles são pares nesse sentido,
21:44com a literatura que se faz na Argentina,
21:46no Chile, na Colômbia.
21:48E eu fico tentando ler isso tudo, né?
21:51Eu gosto da boa ficção, da boa literatura,
21:54até para poder também aprender
21:55e também ficar feliz enquanto leitor.
21:58E eu acho que às vezes é interessante
22:00a gente ver algum escritor
22:01que se baseou em outro, né?
22:04Que tem...
22:05E às vezes até lendo alguns escritores,
22:07eles próprios indicam algumas leituras, né?
22:09Para a gente fazer
22:11e passar a conhecer outros escritores.
22:14É uma coisa puxa a outra, né?
22:16Exato.
22:17Juan Rufo influenciou Gabriel Garcia Marques,
22:20influenciou Julio Cortaza,
22:23enfim, e Julio Cortaza influenciou alguém,
22:26Mário Levereiro também,
22:27que é um argentino,
22:29aliás, uruguaio,
22:30ele também é um autor
22:31que está ali naquela mítica ali.
22:33Então, é um influenciando o outro.
22:35Essa coisa da literatura pura
22:36que não influencia ninguém,
22:37eu acho que isso não existe, não.
22:39Exato.
22:39Vamos voltar a falar da sua literatura.
22:42Esse...
22:42O Espetáculo da Ausência
22:43foi o seu livro de estreia, né?
22:46Foi em 2020.
22:47E é nele que tem 33 histórias
22:49e não no outro,
22:50que eu fiz um pouco de confusão.
22:52Nele tem 33 histórias
22:54e aqui também os personagens
22:56são daqui, do Recife,
22:57são pernambucanos, né?
23:01O que é que tem de diferente?
23:04A gente pode dizer que o Apocalipse
23:05é uma continuação do Espetáculo da Ausência
23:08ou não?
23:09É outra coisa, é outra história?
23:11O Apocalipse, ele é uma expansão do universo.
23:15Do universo que foi iniciado
23:16com o Espetáculo da Ausência.
23:17Fernando, o escritor,
23:21ele sempre trabalha com o mesmo tema.
23:23Ele vai variando assim o formato, né?
23:26Mas eu creio muito nisso
23:28e eu já li muito isso, assim...
23:29Mudam as histórias,
23:30mas a temática é um pouco,
23:32mais ou menos, a mesma.
23:35Mistério, suspense, né?
23:37Exatamente.
23:38O escritor, ele tem as suas obsessões, né?
23:40Eu acho que a minha obsessão é essa, assim,
23:42de entender esses personagens
23:44que estão sempre na beira do abismo
23:47sempre ali a gente não sabe
23:49se ele vai se salvar de alguma coisa,
23:50de alguma situação, né?
23:52São personagens sofridos de alguma forma.
23:56E a diferença desse para o outro
23:57porque o Espetáculo da Ausência,
24:00eles são contos maiores.
24:01Eu escrevi mais um pouquinho assim,
24:03eu entrei mais na psicologia deles, sabe?
24:07Foi um livro que agradou bastante.
24:09Eu não vi nenhuma crítica negativa
24:11em relação a esse livro,
24:13que inclusive eu estava esperando receber,
24:14porque enquanto crítico literário,
24:16eu disse, bom, agora eu vou lançar um livro,
24:19vou levar porrada agora, né?
24:21Mas, ainda bem, se tivesse levado,
24:23estava tudo bem também, sabe?
24:24Mas não foi o que aconteceu.
24:27Agradou bastante,
24:28teve resenha em jornais de fora.
24:30E, enfim, foi um livro que teve um alcance legal
24:33e eu espero que outras pessoas
24:34sejam alcançadas,
24:35porque esse livro está esgotado, inclusive.
24:37E vai ter, talvez,
24:38a editora faça uma segunda edição dele,
24:40ainda sem data definida.
24:42Mas é um livro que me deu muito trabalho de fazer,
24:46mas foi um trabalho prazeroso.
24:48O que eu escrevi ele ao longo,
24:49esse aí foi ao longo de dez anos, assim,
24:51sabe?
24:51Sem pressa.
24:52Eu não tenho pressa para publicar.
24:53Eu costumo dizer que eu acho,
24:55que eu acho, né,
24:56agora, nesse momento,
24:57que eu vou ser um autor de poucos livros,
25:00mas poucos e bons livros ali,
25:01que você vai poder ler e vai dizer,
25:03não, são livros interessantes,
25:06livros que eu acho que podem agradar as pessoas, sabe?
25:08Agora, essa sua paixão pela literatura
25:11levou você também a ser crítico literário, né?
25:14Você foi crítico literário numa rádio aqui do Recife,
25:18né, durante algum tempo,
25:19não sei exatamente quanto tempo foi.
25:21Três anos.
25:21Três anos.
25:22E você tem, há 14 anos já,
25:25um site chamado Angústia Criadora, né?
25:29E como é que surgiu pra você,
25:32como foi que veio a ideia de criar esse site?
25:35Ó, o site Nessem 2011, como você falou,
25:37logo após de eu ter saído da oficina de carreiro.
25:41E eu senti a falta de ter um espaço
25:44pra eu poder produzir, né,
25:46sobre o que eu estava lendo,
25:47sobre o que eu estava querendo escrever,
25:50e não tinha espaço nos jornais,
25:51porque nesse período aí eu estava me formando.
25:54E eu encontrei dificuldade
25:55de encontrar jornais daqui e de fora
25:57pra escrever minhas coisas.
25:58Então eu disse, não,
25:59vou criar um blog,
26:00que eu dava o nome de blog na época,
26:02né, agora pensar o nome.
26:04Aí eu comecei a pensar no nome do site,
26:06no nome, não queria botar literatura,
26:08alguma coisa.
26:09Eu queria botar algo bem assim,
26:10bem misteriosa,
26:12bem literária mesmo.
26:13E o Angústia Criadora nasceu
26:14justamente quando eu saí da oficina.
26:16Por quê?
26:16Carreiro sempre usou uma expressão,
26:19que é a angústia do criador.
26:21Não é aquela angústia da página em branco.
26:23É a angústia de você ter muita coisa nas mãos
26:25e saber o que usar.
26:27O que é que vai usar agora?
26:28É a angústia criadora.
26:30Eu disse, poxa,
26:31isso daria um título muito bom.
26:33Eu botei,
26:34as pessoas a princípio estranham um pouco,
26:36mas depois compreendem a proposta do site,
26:39que agora eu chamo de site,
26:40que é um pouquinho mais completo,
26:41mais profissional, né.
26:43E a partir de então,
26:45eu venho publicando sistematicamente,
26:46e talvez seja um dos mais antigos no ar,
26:49desse perfil.
26:51É ativo até hoje, né.
26:52Outros surgiram antes,
26:53mas não há.
26:54Eu acho que ele é o mais antigo
26:55que está aí em circulação no Brasil.
26:56E é o meu cartão de visita, né.
26:57E além do site,
26:58você tem até o perfil no Instagram também,
27:00com arroba angústia criadora.
27:03É, que é uma expansão do universo.
27:05Isso.
27:05No site,
27:06eu publico meus textos autorais,
27:08resenhas, críticas.
27:10Eu sempre fiz isso.
27:11E de dois anos para cá,
27:13eu comecei a dar espaço para outras pessoas,
27:15porque eu recebo muita coisa de assessoria
27:18de escritores do Brasil inteiro,
27:20até de fora.
27:21Aí eu comecei a pensar,
27:22poxa, vou abrir também para essas pessoas, né,
27:24já que estão procurando o site,
27:26é publicado lá no meu site,
27:28agora eu passo por uma seleção, né,
27:30uma curadoria,
27:31que eu não boto tudo.
27:33Tem que ter a ver, assim,
27:34literatura contemporânea,
27:35lançamentos e tal.
27:36E é algo que deixa ele bem atualizado.
27:38Se você entrar lá agora,
27:39você vai ver o que está acontecendo,
27:40coisa no Rio de Janeiro,
27:41São Paulo, Bahia.
27:43É um site que ele se presta a esse serviço,
27:46sabe?
27:46E é o meu grande xodó,
27:48o Angústia Criadora.
27:48Eu acho que vou ter ele
27:50até enquanto o vídeo eu tiver.
27:51Para concluir,
27:53o Ney Anderson também está se aventurando
27:55na composição.
27:56Como tem sido essa experiência?
27:58Pois é.
27:59Além disso,
28:00que eu faço isso tudo que eu faço,
28:01ainda arrumei um tempo
28:02para começar a escrever música, né?
28:05E eu estou com uma música
28:06que foi em parceria com o Márcio Fly,
28:08eu escrevi a letra,
28:09e ele musicou,
28:09Márcio Fly,
28:10um cantor lá de São Paulo,
28:11e o nome da música se chama
28:12Dois Alguens,
28:14que está nas plataformas digitais,
28:16e tem um clipe no YouTube,
28:18e foi produzido por ele,
28:20por Osmar Rossetti,
28:21que é um produtor lá de São Paulo,
28:22muito bom,
28:22um cara já antigo,
28:23já que produziu muita gente,
28:25e foi um trabalho que está perfeito.
28:27Acessem lá no YouTube,
28:28no Spotify,
28:29e ouçam.
28:30Dois Alguens,
28:30que eu escrevi há um ano,
28:32e a música foi colocada
28:35nas plataformas digitais,
28:36agora em janeiro,
28:37de fevereiro,
28:38e está tendo uma carreira aí,
28:39está tendo,
28:40e eu estou escrevendo outras coisas
28:41para mandar para ele,
28:42e para outras pessoas também.
28:43Além disso,
28:44tudo que eu faço,
28:45ainda inventei de ser compositor.
28:48Pois é,
28:48mas não deixa de ser escrita também, né?
28:50É.
28:51Ney,
28:51muito obrigado pela entrevista,
28:53foi um prazer receber você aqui hoje,
28:55no Ponto de Vista.
28:56Fernando,
28:57prazer é todo meu,
28:58espero todos vocês lá no lançamento,
29:00dia 29,
29:01na Casa Estação da Luz,
29:03a partir das 19 horas,
29:05por favor,
29:05não me deixe sozinho,
29:06vão lá,
29:07porque o autor precisa do leitor.
29:09Vamos lá,
29:09e espero que isso aconteça.
29:11Obrigado.
29:12Obrigado.
29:13Obrigado a você também,
29:14que nos acompanhou até aqui,
29:15a gente volta na semana que vem.
29:17Obrigado pela companhia.
29:18Obrigado.

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