A quarta edição da feira em São Paulo juntou mestres e discípulos em exposição e conversas: Thiago Honório e Julia Gallo; Dora Longo Bahia e o grupo de pesquisa Depois do Fim da Arte; Santídio Pereira e Fabrício Lopez; e Genor Sales e Dalton Paula
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CriatividadeTranscrição
00:00As minhas obras são um desdobramento de uma série que eu fiz, que se chama Dos Peixes.
00:27É uma nova história a partir do Jogo do Bicho, então é um jogo do bicho só de peixe.
00:31E aqui é uma série que se chama Bacia da Fartura, é uma série inédita, em que eu apresento duas bacias,
00:38a bacia amazônica e a bacia do Rio de São Francisco, sempre representando a cabeça do peixe,
00:43pensando nesse lugar da vulnerabilidade alimentar da população negra indígena, a partir do descarte da cabeça desses peixes.
00:57Acho que ao longo desses quatro anos a gente conseguiu se solidificar bastante no mercado de arte,
01:04no calendário cultural da cidade de São Paulo, mas também de feiras internacionais e latino-americanas.
01:12A ideia do setor base surgiu de trazer um foco para uma prática dos artistas na dimensão pedagógica e de construção de comunidade.
01:21Esses artistas muitas vezes são conhecidos pelos seus trabalhos, mas não por essas práticas pedagógicas.
01:28E eles são responsáveis por formar gerações de artistas, guiar, orientar.
01:33Aí a gente convidou quatro artistas que têm esse trabalho nessa dimensão,
01:38e eles convidaram outros artistas para que juntos eles fizessem um projeto expositivo,
01:43e depois desdobrassem isso numa conversa que vai ser mediada por um profissional escolhido por eles.
01:51A série que eu trouxe para a ARPA, para esse projeto base, ela é intitulada Estudo para Visto.
02:02São olhos monoculares que eu desenhei com um lápis aquarelável,
02:08e envoltos por espécies de volutas, a partir da observação de talhas do barroco e do rococó mineiro,
02:17que adornam esses olhos monoculares, que são espécies de talismãs, amuletos,
02:25algo que pode tanto ser, em teoria, vestido, como algo visto.
02:30O Tiago foi meu professor na faculdade, foi meu orientador, e aí depois eu segui com ele em grupo de acompanhamento,
02:37então a gente já tem uma relação de mais de dez anos,
02:39eu estou muito feliz de estar aqui compartilhando esse momento com ele.
02:43Eu estou aqui apresentando esse trabalho que chama Armadura de São Sebastião,
02:47e ele é um trabalho livremente inspirado no santo da minha cidade de Natal, que é o Rio de Janeiro,
02:52e aí eu trabalhei com umas folhas de alumínio.
02:56O alumínio é muito maleável, então eu fui riscando o alumínio,
03:00e aí criando esses veios que quando você passa a tinta, a tinta fica presa dentro do veio,
03:06então isso cria uma textura como se fosse uma gravura, e aí eu fui trabalhando, desenhando dentro disso.
03:10Eu trabalho com esses corpos inventados, são sempre essas anatomias fictícias.
03:16Sempre tivemos o desenho como ponto de contato entre nossas práticas,
03:22e também a relação com o corpo, a partir de um imaginário que no caso dela está mais relacionado
03:30a uma dimensão gótica, medieval, e no meu caso mais relacionada ao barroco e ao rococó mineiros.
03:38É um trabalho coletivo que chama História da Classe Trabalhadora,
03:49feito junto com um grupo de pesquisa Depois do Fim da Arte,
03:54que é um grupo que eu coordeno, de artistas, professores, estudantes, pesquisadores.
04:00Trabalho é uma homenagem ao meu professor,
04:02que foi um professor super importante, que é o Nelson Lerner.
04:06E o Nelson Lerner fez um trabalho que se chamava Projeto Aula,
04:10em que ele pedia para várias pessoas fazerem um desenho de uma flor com caneta bique.
04:15Uns eram artistas, outros não.
04:17E o que ele queria era ver como que esse trabalho,
04:20se você põe todo mundo um do lado do outro, você não consegue identificar,
04:25quer dizer, o que configura o trabalho de um artista.
04:27A gente ficou muito animado e achou um gesto de super generosidade dela,
04:31porque ela podia ter escolhido um artista único,
04:34e ela trouxe um grupo de 23 pessoas para a Arpa,
04:37que para a gente, como artista iniciante, para a gente é muito legal estar em um espaço como esse.
04:40A gente fez 330 desenhos de caneta bique,
04:43todas as folhas são cobertas 100% com caneta bique.
04:47A gente chegou nesse valor de R$ 51,83,
04:50a partir do valor do salário mínimo,
04:52porque a ideia é reverberar a história da classe trabalhadora,
04:55não só como trabalho, não só como não autoria,
04:59porque aqui não tem autora, aqui não faz diferença um desenho do outro,
05:02e da questão também da baixa remuneração que essa classe recebe pelo trabalho.
05:07Ela é uma espécie de mimetismo do trabalho industrial,
05:11feito de uma maneira artesanal.
05:13Então a gente tem essa tensão muito interessante
05:15entre a dimensão artesanal, criativa, individual,
05:19da produção artística, que normalmente é própria da produção artística,
05:23e o anonimato, a produção em série,
05:27o apagamento do gesto individual,
05:29que são próprios da produção industrial do capitalismo.
05:42Essas aqui são umas guachas, né,
05:45que eu venho fazendo recentemente, faz uns dois anos.
05:47É uma experimentação de materialidade de cor,
05:50porque eu acho que a guacha é um trabalho que, de certo modo,
05:54ele é mais convidativo ao olhar,
05:56de certo modo, talvez um pouco mais imantado do que a gravura,
05:59no sentido visual mesmo.
06:01Porque a gravura é feita a parte de tinta óleo, né, a xilogravura.
06:06Então ela tem uma relação visual com quem olha,
06:08e a guacha tem outra relação completamente distinta.
06:11Então é o mesmo assunto, tratado as bromélias,
06:14mas em duas materialidades de cor e de tinta diferente.
06:18São duas xilogravuras em grande formato,
06:20eu trabalho com papel coso,
06:22e são xilogravuras que têm um caráter pictórico também,
06:24pela sobreposição e anulação de planos, né, pela cor.
06:28Então são duas matrizes perdidas,
06:30que é esse processo onde você grava uma madeira,
06:33imprime sobre menos papel sucessivas vezes,
06:36então é uma matriz de redução.
06:37E uma outra xilogravura aqui,
06:39de uma série intitulada Budas da Varze,
06:42que é uma homenagem a um mestre da xilogravura japonesa,
06:46que é o Shiko Munakata.
06:47São trabalhos impressos em papel,
06:49mas eles são colados numa superfície rígida.
06:52Então o Fabrício, ele lida com o assunto,
06:54por exemplo, da serra, do mar,
06:57ou da poética dele, de uma maneira.
06:59Várias memórias sobrepostas que organizam a ideia.
07:03O meu é uma coisa mais chapada,
07:04eu acho que tem uma coisa assim de complementar mesmo.
07:06Eu acho que tem uma origem que é o gosto pela madeira mesmo,
07:11o gosto pela materialidade, o gosto pelo corte,
07:14essa relação com o material,
07:17que ele é responsivo, vamos dizer assim.
07:36E aí