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O economista Henrique Meirelles, ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central, analisa os efeitos do shutdown nos Estados Unidos, as pressões sobre o Federal Reserve e a medida do governo brasileiro que proíbe beneficiários do Bolsa Família de apostarem em bets.

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Transcrição
00:00A gente vai conversar com o economista Henrique Meirelles, que já foi ministro da Fazenda,
00:04presidiu o Banco Central.
00:06Ministro, boa noite.
00:07É bom demais ter o senhor aqui com a gente sempre.
00:10Espero que agora eu consiga te ouvir e o senhor também consiga me ouvir.
00:13Então, vamos lá.
00:14Minha primeira pergunta é se o shutdown lá nos Estados Unidos pode impactar o Brasil.
00:20Olha, evidentemente que o shutdown na economia da Unicara tem reflexo bastante importante,
00:28inclusive foi colocado pelo Vinícius, a questão dos dados de emprego, da economia como um todo,
00:37que seriam divulgados até sexta-feira e que podem não ser divulgados.
00:41Então, o shutdown pode fazer duas coisas.
00:46Primeiro, não ser possível divulgar, quer dizer, acabar, pelo menos temporariamente,
00:56com a divulgação de números importantes para a análise da economia.
00:59Segundo, para serviços essenciais do governo.
01:03Apesar que muitos desses serviços já estavam sendo atacados pelo Donald Trump
01:09e já num processo de demissão bastante importante no setor público.
01:14Então, é algo que realmente complica muito, de um lado, a análise,
01:20e de outro lado, obviamente, o funcionamento do governo americano.
01:25Mas, em termos de reflexos para o Brasil, existe alguma coisa das empresas que têm interação com os Estados Unidos,
01:33estão importando, estão exportando, ou que dependem de alguns dados americanos para fazer as suas análises.
01:39Mas, eu não acredito em grande impacto pelo Brasil, para o Brasil, com esta paralisação que é o shutdown.
01:48Agora, vamos ver quanto tempo vai demorar isso.
01:52Normalmente, e essa é a razão porque não houve um impacto tão grande nos mercados,
01:57isso aí é resolvido dentro de alguns dias.
02:00Num primeiro momento, todos aí ficam muito firmes, arregados à sua posição,
02:06mas depois que há o shutdown em função disso, evidentemente,
02:11que prevalece a responsabilidade das pessoas de tentar achar uma solução
02:18para o governo do país voltar a funcionar.
02:21E também não deve ter grandes impactos para outras economias aí ao redor do mundo?
02:26E queria te ouvir pela expectativa para o fim desse shutdown.
02:30O senhor aposta no quê?
02:31Olha, eu não acredito em impactos muito grandes para outras economias,
02:38na medida em que os Estados Unidos continuem exportando, continuem importando,
02:44e as companhias que operam, por exemplo, a companhia americana que tem subsidiária no Brasil,
02:51ela tem um certo impacto da economia americana, etc.,
02:54mas não será o shutdown especificamente que vai ter um impacto muito grande
02:59nas operações brasileiras, nessa companhia de capital americana,
03:03e a mesma coisa, então, acontece em outros países.
03:07Agora, é uma coisa séria, evidente, o governo americano começa a parar praticamente em todos os lados,
03:14é impossível se manter isso por muito tempo, quer dizer,
03:16que os dois partidos políticos dos Estados Unidos terão que chegar a um acordo
03:21e aprovar um orçamento, seja esse exatamente o orçamento apresentado pelo Trump,
03:30do beautiful budget, etc., da maneira como ele colocou,
03:36mas vai ter que se chegar a um acordo, certamente,
03:41inclusive porque o governo não vai continuar parado.
03:45Agora, se você olhar, ver o que as pessoas estão dizendo,
03:49o próprio Trump, dá uma dura, etc.,
03:52mas, na realidade, não há um sinal, digamos assim, de desespero.
03:58Tem que se chegar a um acordo, é um acordo que se chega no Congresso,
04:03e, normalmente, em momentos, em anos anteriores,
04:08depois de alguns dias, se achou a solução.
04:11Vamos passar para a pergunta do Vinícius Torres Freire.
04:13Vinícius.
04:15Ministro, hoje a Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu que não vai haver demissão imediata
04:24da diretora do FED, a Lisa Cook,
04:27que, pelo menos, vai ter que ser esperado, pelo menos, o julgamento,
04:30o processo lá em janeiro.
04:33De certo modo, isso tranquiliza, pode tranquilizar no curto prazo o pessoal do FED,
04:38porque não vai ter demissão à vontade do pessoal de lá,
04:43o que poderia ser o caso se fosse aberto o presidente de demissão já imediata da Lisa Cook.
04:48Agora, o senhor acha que, daqui por diante,
04:53ainda o presidente Donald Trump vai tentar manter a sua campanha de fazer um FED dele?
05:03Vai tentar conseguir cabeça de algum modo para ter uma maioria na bancada do FED?
05:09Olha, o que ele vai tentar, não há dúvida.
05:13Ele realmente tem dito isso, claramente.
05:18E, nesse aspecto, a própria demissão da Lisa Cook seria já um passo muito grande,
05:26não só como um precedente para os outros, etc.,
05:29a questão da formação da maioria na diretoria do FED.
05:34Já existem alguns diretores que apoiam uma certa moderação nos juros, etc.,
05:41como que é o Trump.
05:43Então, a saída dela, e ele nomeando uma pessoa no lugar,
05:48já é um fator relevante, somado ao fim do mandato de Arrumpal no próximo ano.
05:56Então, essas são as consequências mais importantes.
06:00Agora, ele está tentando operar usando as regras do jogo.
06:08Ele não está quebrando as regras do jogo, dizendo,
06:10olha, eu vou demitir, ponto final.
06:11Não.
06:12Ele acusa a diretora de ter falsificado dados para conseguir uma hipoteca lá, etc.,
06:22que ela fez, tomou em próximo hipotecário, etc.
06:27Em resumo, ele acusa a diretora de crimes reais,
06:34de crimes que, em tese, justificariam casos provados,
06:39justificariam a saída dela.
06:43Agora, evidentemente, o que causa extremo desconforto
06:48é o fato de que ele está atacando isso primeiro
06:51com a diretora do tipo mais hawkish,
06:55quer dizer, que acredita numa política mais firme do Fed, etc.,
07:01não cede ao desejo do Trump de nenhuma maneira.
07:04E essa ideia dele de procurar justas causas,
07:12acusando ela de procedimentos criminais, etc.,
07:16essa, sim, é um dado perigoso,
07:19porque a Suprema Corte, para manter a integridade das instituições americanas,
07:24ela precisa levar isso muito a sério
07:26e fazer um julgamento aí muito detalhado,
07:32olhando todas essas supostas alegações do Trump,
07:35para que ele não prevaleça no final,
07:37simplesmente, uma vontade do Trump de ter o controle maior do Fed,
07:42apesar de que, na medida que os mandatos forem vencendo,
07:47lá na frente, não por mágica,
07:50para o Força Abarra, que criar, acusar, crime, etc.,
07:53mas, na medida que os mandatos forem, de fato, vencendo,
07:58ele vai ter o direito de nomear primeiro o Chairman
08:03e depois os demais governos do Fed.
08:07Eu vou passar para a pergunta agora do nosso analista de política,
08:10Eduardo Geyer, lá em Brasília.
08:12Geyer, fica à vontade.
08:17Ministro, boa noite.
08:18Boa noite, Cris Vinícius e a todos que nos assistem.
08:20Ministro, hoje o governo federal lançou uma instrução normativa
08:24que proíbe as Betes de aceitar beneficiários do Bolsa Família
08:28como usuários, como integrantes dessas plataformas.
08:31É um tema do dia que eu queria muito ouvir o senhor,
08:34porque tem uma divisão aqui em Brasília sobre isso.
08:37Uma parte diz que seria como mais uma das contrapartidas
08:40do programa Bolsa Família,
08:42como levar os filhos à escola, vacinação em dia,
08:45e que, portanto, seria razoável o governo utilizar
08:48essa política pública para frear os usuários das Betes,
08:51que, enfim, tem causado um problema para algumas famílias brasileiras,
08:55enquanto uma outra parte do governo diz que não,
08:57na verdade, isso aí é uma forma de regular a liberdade
09:01de quem é beneficiário do Bolsa Família
09:03e que isso feriria um pilar do programa.
09:06Queria ouvir o senhor, como ex-ministro da Fazenda,
09:08o que o senhor achou dessa iniciativa do governo federal
09:12e quais impactos nós podemos esperar na economia brasileira,
09:16se é que haverá algum, com essa medida anunciada hoje?
09:20Olha, é de fato um assunto muito controverso.
09:23Agora, de fato, restringe o livre-arbítrio
09:28e a capacidade de decisão de uma pessoa
09:32de fazer aposta, se quiser mesmo,
09:36que isso prejudique a própria família.
09:38Por outro lado, aí que é um ponto importante,
09:42desde que foi criado o Bolsa Família,
09:45nem se fala mais muito nisso hoje,
09:48o Bolsa Família era condicionado a algumas coisas.
09:53Por exemplo, ter uma criança na escola, etc.
09:56O Bolsa Família, ele, quando foi concebido,
09:59ele não foi concebido apenas no sentido de ajudar as pessoas.
10:07Mas, tinha uma contrapartida.
10:10A ideia é que ajuda as pessoas, sim,
10:13dá condições ao indivíduo,
10:14mas dá condições para as famílias
10:16mandarem os filhos para a escola, etc.
10:20Existia aí, no início do processo,
10:23na concepção, alguns condicionantes.
10:26E esse é um condicionante que eu até acho
10:29que poderia ser considerado razoável,
10:31no sentido de que o cidadão que recebe o auxílio
10:37para, basicamente, alimentar a própria família,
10:40a si mesmo, etc.,
10:42ele começa a apostar esse dinheiro.
10:45Não há dúvida que,
10:47do ponto de vista de Lívia Vítor,
10:48ele pode fazer isso.
10:50Agora, ele vai acreditar que vai ganhar muito
10:55e que vai melhorar as condições.
10:57Mas, na realidade, eu acho até compreensível,
11:00porque isso é uma injeção de recursos do governo.
11:05Não é assim.
11:06Os cidadãos estão trabalhando,
11:08tem lá um emprego,
11:09recebe o salário e gasta como quiser.
11:12E tentar interferir nisso seria um absurdo completo,
11:15do ponto de vista de livre-arbítrio.
11:17Agora, no momento em que o governo faz um auxílio
11:20tentando melhorar a vida das pessoas,
11:24desde o início, como eu disse,
11:26já havia condicionantes aí.
11:29E esse me parece um condicionante razoável.
11:33Evitar que o cidadão receba o dinheiro fundamental
11:37para a sua própria subsistência
11:40e da própria família
11:41e vai apostar isso
11:43dentro de uma ilusão que vai ganhar muito.
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