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  • 07/07/2025
Mães refletem sobre medos e aflições de ter bebês prematuros

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Notícias
Transcrição
00:00Uma gestação dura cerca de 40 semanas. Entretanto, ela é considerada a termo, ou seja, dentro ali dos padrões mais saudáveis e melhores
00:14entre a 37ª e a 42ª semana. Mesmo assim, só em 2023, cerca de 12% dos nascimentos que aconteceram no Brasil foram antes desse marco,
00:25o que resultou em mais ou menos 300 mil bebês prematuros no país. E aí fica o questionamento, como que a gente acolhe essas famílias?
00:35Como que essas famílias lidam com essa dor, o medo do amanhã, a incerteza do futuro, aquela dúvida do que vai acontecer e a sensação de total descontrole,
00:46como se a situação vazasse entre os seus dedos. Para falar sobre isso, a gente tem hoje aqui, não na volta a gente compra,
00:52duas convidadas muito especiais que vão compartilhar suas histórias com a gente. Eu estou aqui na minha frente com a Ana Paula,
01:00que é roteirista, produtora, editora e apaixonada por audiovisual. Ela é mãe do Diego, de 5 anos, e da Ana Júlia, que completa 5 meses amanhã.
01:09Ainda muito titiquinha. E do Teodorico também, que é o irmão mais velho, um cachorro vira-lata de 13 anos.
01:15Ela vai contar para a gente como que foi a chegada da Ana Júlia por volta da 31ª semana de gestação, pesando somente 940 gramas.
01:23Ana, muito obrigada pela sua presença. A gente está muito feliz de receber você aqui.
01:28Obrigada, obrigada. Para mim é uma novidade estar aqui, nesse lado aqui, né?
01:34Normalmente eu estou atrás das câmeras, então agradeço demais o convite, e é isso. Vamos contar um pouquinho dessa história.
01:42Com certeza, que é muito valiosa, muito rica, e que a gente viu que, infelizmente, é super comum também, né?
01:47Lu, apresenta a nossa outra convidada, também super especial.
01:51E antes de apresentar a nossa próxima convidada super especial, eu quero também celebrar a presença da Ana aqui,
01:56porque a Ana, ela é a roteirista desse programa, ela ajuda a gente a fazer a magia acontecer, o audiovisual tem disso, né?
02:01Então você também sempre está presente nessa mesa, mesmo não estando na frente das câmeras, viu, Ana?
02:06Obrigada também pela coragem de estar compartilhando esse tema, que é um tema sensível, né, aqui com a gente.
02:13E bom, quem completa essa mesa e divide a sua história é ela, Nádia Haddad, que é também jornalista.
02:19Essa mesa hoje só tem jornalista, viu, gente?
02:21É jornalista, é apresentadora, dona de casa, mãe de pets também, e mãe, né, do José.
02:29O José é o José que tem um aninho, o José que é um pequeno milagre, que nasceu com 23 semanas,
02:35e que ele entravou uma luta ali, só teve alta do hospital 190 dias, quase seis meses, gente, no hospital.
02:44E além de mãe do José, ela é mãe também de um anjo, que é o Antônio, que lutou também por 16 dias, né, e nos deixou.
02:53E ela vai dividir com a gente um pouco dessa luta, entre luta e luto, né, tudo muito misturado.
03:00Nádia, obrigada por estar com a gente aqui hoje.
03:03Obrigada a vocês por trazerem foco a esse tema, que precisa ser falado, expandido, a gente precisa se informar mais e informar mais as pessoas.
03:12E através das nossas histórias, a gente consegue fazer isso, né?
03:16Quando a gente compartilha a nossa vivência e nosso testemunho, a gente dá luz também pra outras mães.
03:21Sem dúvidas, porque no episódio anterior a gente falou sobre expectativa e realidade do parto, né?
03:27Como a gente já, né, a gente descobriu que tá grávida ali, já vem um filminho na nossa cabeça do que tudo que a sociedade nos traz
03:34e que a gente idealiza do que vai ser essa maternidade, do que vai ser o parto.
03:37E acho que aqui também tem muito disso, né, nessa situação da prematuridade, de uma expectativa que você tem,
03:43até de ir fotografando barriga, de viver todas as fases, de montar enxoval.
03:48Então, eu queria que vocês contassem, né, durante essa gravidez, que momento vocês descobriram?
03:56Como é que foi esse momento de descobrir que seria um parto prematuro?
03:59E que essa idealização de viver todos os meses ou as semanas, que é como se conta hoje, né, aconteceu pra vocês?
04:07Bem, no meu caso, foi cedo, né?
04:10Eu fui internada com 18 semanas, mais ou menos, com o colo curto, um encurtamento de colo.
04:17Eu não tinha conhecimento do que se tratava.
04:20Eu demorei alguns anos pra engravidar, eu fui tentante durante um tempo, então eu tinha muitas expectativas, né?
04:27Além dos sonhos óbvios, eu já alimentava esses sonhos há alguns anos.
04:30Eu já tinha uma playlist no meu Spotify pra hora do parto montada há anos.
04:38Eu já tinha a fotógrafa pra fazer o meu ensaio de gestante, também, tudo pago, porque eu sonhava em fazer foto com aquela moça.
04:47Enfim, então eu tinha muitos sonhos.
04:50Acho que talvez além do que uma gestante normal, né, que engravida naturalmente, que tem essa surpresa.
04:58Então, quando eu fui internada, esse choque já aconteceu.
05:04A minha vida ali foi interrompida.
05:06Os sonhos que eu tinha de trabalhar, inclusive, com barrigão, estavam sendo interrompidos naquele momento.
05:13Lidar com essas frustrações de cara, pra mim, foi muito difícil.
05:18Eu passei os meus dois, três primeiros dias de internação numa revolta muito grande.
05:23Revolta comigo, revolta com as circunstâncias, revolta com aquilo tudo que tava acontecendo e tentando entender.
05:31Onde Deus quer me posicionar?
05:33O que que eu preciso aprender com isso, né?
05:36E fui trabalhando o meu emocional e o meu espiritual, paralelamente, porque foi isso que me sustentou durante todo o período.
05:42Quando eu entrei em trabalho de parto, com 23 semanas, foi um susto muito grande, além de uma revolta.
05:51Porque eu tava fazendo tudo tão direitinho, um repouso absoluto.
05:55Puxa vida, eu já tinha deixado de viver aqueles sonhos.
06:01E mais o parto, um parto prematuro, no susto, cheio de medos.
06:05Então, eu até hoje lido com essas frustrações.
06:09Eu não vou dizer que elas estão 100% resolvidas, não.
06:13Eu tomei um susto danado, eu só gritava.
06:15Eu só gritava.
06:17Eu não aceitava.
06:18Porque eu sabia da gravidade, eu sabia que meus meninos chegariam muito pequenos e muito mais frágeis do que qualquer outro bebê.
06:27Eu sabia que saíriam fetos e não bebês de mim, né?
06:31Então, o curto espaço que eu tive, do meu quarto até o centro cirúrgico, eu fui trabalhando mentalmente pra entender.
06:41Eu não vou pegar os meus bebês no colo e ter aquele momento de ouro.
06:45Não vou trazer meus bebês no peito.
06:47Eu não vou ouvir o choro dos meus bebês.
06:50Então, eu fui me preparando pra isso.
06:53Não vou dizer que foi um parto traumático.
06:55Não foi.
06:55Não foi mesmo.
06:56Até porque cada gestação é da sua forma.
06:59Cada pessoa tem a sua história.
07:01E os meus meninos tiveram essa.
07:03E eu tenho essa história com eles, assim como o meu marido.
07:06Mas, foi muito duro.
07:08Muito difícil.
07:09Desculpa te interromper.
07:10Você chegou a entrar em trabalho de parto, né?
07:11Sim.
07:12Teve sintoma?
07:13Tive.
07:14Tive contração.
07:15Tive dilatação.
07:17Eu fiz a cerclagem por conta do encurtamento do colo no dia seguinte da minha internação.
07:22Que é aqueles pontinhos que a gente dá ali no colo do útero pra que ele segure mais.
07:26É isso, né?
07:27Isso, isso mesmo.
07:27Então, numa quarta-feira, no dia 24 de abril, eu comecei a sentir cólica no final do dia
07:36e percebi que as minhas contrações estavam ritmadas.
07:39Eu falei, isso não tá normal?
07:40Então, eu entrei em trabalho de parto e no dia seguinte, no dia 25, o meu colo já tava imensurável.
07:49Já não tinha mais medida do colo do útero.
07:51Mas, a minha cerclagem tava lá inteirinha.
07:54Então, não rompeu o colo do útero, não rompeu a cerclagem.
07:58A minha cirurgia foi ótima, foi efetiva, foi eficiente.
08:01Mas, eu entrei em trabalho de parto e eu o tempo inteiro, junto com o meu marido, eu orei muito pedindo a Deus que o parto acontecesse no momento em que ele achava que tinha que acontecer.
08:13No momento em que os meninos decidiram nascer, eu tive que aceitar.
08:17E, foi determinante, porque as placentas já estavam muito maduras.
08:22Depois, a gente entendeu por que o parto foi tão prematuro.
08:26As minhas placentas já estavam avisando, ó, é hora de nascer, porque elas amadureceram mais rapidamente.
08:32O porquê disso, não se sabe.
08:34Pode ser que seja um problema vascular, mas é algo também que a gente não consegue prever.
08:38Porque, durante todas as ultrassonografias, tava tudo normal.
08:43Os meninos crescendo, aumentando o peso.
08:46Então, você entende que as placentas estavam normais.
08:50Mas, eu entrei em trabalho de parto.
08:52Que loucura.
08:53Nossa.
08:54Ana, e pra você?
08:56Como foi esse descobrir que seria?
09:00Então, pra mim tinha, primeiro, a idealização de ter uma menina.
09:04Porque eu já sou mãe de um menino.
09:05Então, tinha toda uma questão de, ah, é uma menina, agora é uma menina, princesa e tal.
09:10E aí, quando eu tava com 25 semanas de gestação, começaram a vir exames não muito bons.
09:21De perda de líquido, de um, não sabe direito o motivo, mas a minha pressão não conseguia controlar de jeito nenhum.
09:28Eu tava já com três medicamentos de pressão e a minha pressão não conseguia baixar, não regulava.
09:33Então, passado esse susto inicial de ir agora, começaram os cuidados.
09:40E aí, repouso.
09:41Não entrei em repouso total, mas um repouso forçado.
09:45Comecei a comer proteína alucinadamente.
09:48Eu cheguei a comer, tipo, seis ovos por dia.
09:50Pra poder tentar que algum nutriente passasse pra ela.
09:54Porque junto com a redução do líquido, veio a...
09:58Ela não tava mais crescendo, ela não tava mais ganhando peso.
10:01E aí, começou essa corrida.
10:03Tem uma questão do tempo, né?
10:04O tempo é muito louco quando você tá grávida.
10:07Porque é um dia...
10:09A gente vive vários dias em um dia só.
10:11É assim também na UTI neonatal.
10:13Então, ali na gravidez, eu já pude experimentar um pouquinho desse tempo.
10:18Dessa mudança de perspectiva temporal.
10:21Mas eu lutei bastante.
10:23Até chegar na 31ª semana.
10:26E há duas semanas ela já não crescia mais.
10:30Existe uma tabela de percentil.
10:33Em que o percentil dos bebês, o ideal é 2.
10:36No mínimo, na verdade, 2.
10:38E fica ali 8 já é baixo.
10:40Ana Júlia tava com 0,5.
10:420,5 de percentil.
10:44Então, assim, era ou fazer a cesárea de emergência ou fazer.
10:49Não tinha opção.
10:50Ela tava já em...
10:54Com problema.
10:55Já tava tendo o que eles chamam de sofrimento fetal.
11:01E eu também tava correndo risco de vida.
11:04Porque ali, né, tem essa questão...
11:07A morte fetal é ainda muito pouco entendida.
11:11Mas ali naquele momento tava...
11:13Eu corria risco de uma pré-eclâmpsia a qualquer momento.
11:16E aí o meu médico resolveu interromper a gestação.
11:19Eu não entrei em trabalho de parto.
11:22E foi uma cesárea de emergência.
11:24Passei um dia internada no hospital.
11:27E fiz a cesárea no domingo de manhã.
11:30A Nádia comentou a questão da revolta.
11:35Eu queria puxar por esse lado.
11:36E foi pouco...
11:37Pra você, muito pouco tempo.
11:39E pra você também um tempo curto, a gente pode dizer.
11:43Nesse período.
11:44Entre vocês descobrirem...
11:46E não talvez assim com todas as letras.
11:49Você já tava sabendo que no seu caso...
11:51Já tava ali com uma questão...
11:52Que já podia ir indicando.
11:54Seu médico deve ter conversado com você.
11:55Que olha, pode ser que venha antes.
11:57Você já tava internada.
11:58E falou que tava preparando o mental e o espiritual.
12:02E preparar realmente pra essa questão das informações.
12:05Do que que seria esse bebê prematuro.
12:08Vocês tiveram tempo de estudar.
12:10Porque a gente na gestação se debruça sobre muitos livros, né?
12:13Ai, quando o bebê nascer.
12:14Como é que vai ser?
12:14Como é que põe pra lá?
12:15Aquelas coisas.
12:16Vocês conseguiram...
12:16E ainda assim quando chega você fala.
12:17Meu Deus, não tava preparado pra isso, né?
12:19É isso.
12:20Então vocês tiveram tempo de se preparar.
12:22Ou vocês estavam em revolta, em negação.
12:25E não foram atrás dessas informações.
12:26Porque não quer lidar com aquilo naquele momento.
12:29Como é que foi pra vocês o ter acesso a informações sobre o que que era de fato a prematuridade?
12:34Então, eu não sei no caso da Ana Paula que o médico já tinha alertado.
12:39Olha, pode ser.
12:40No meu caso, não.
12:42No meu caso, eu sabia que provavelmente gêmeos, né?
12:46Não chegam muito.
12:47É raro chegar a 40 semanas.
12:48Então, eu já imaginava que eu não fosse chegar.
12:51Mas não que fossem ser tão prematuros.
12:53Então, eu não entrei numa negação.
12:56Porque eu acreditava que fosse dar certo.
12:59Eu acreditava que fosse chegar até o fim.
13:01Até, sei lá, 31.
13:02Que se chegasse a 31 semanas, pra mim, ia estar excelente.
13:06Mas, então, eu não me preparei porque eu achei que não fosse necessário.
13:11Ao contrário, eu fui me preparando com informações sobre cuidados de uma maneira geral.
13:16De um bebê e não de um feto.
13:19E eu só pude ser mãe, efetivamente, depois que meu bebê foi pra casa.
13:24O José foi pra casa com seis meses, sete meses quase.
13:28Então, eu não tive um recém-nascido.
13:29Esses cuidados todos, eu fui impedida de ter.
13:32Porque ele tava internado e ele ficou muito tempo numa incubadora.
13:36Então, eu fui uma mãe passiva.
13:38Eu fui mãe que ora a mãe que intercede pelo seu filho.
13:43Mas que eu não podia fazer mais nada além disso, né?
13:46Eu lembro que quando eu pude trocar a fralda do meu bebê pela primeira vez.
13:51Foi uma festa.
13:52Quando eu pude pegá-lo no colo sem pedir autorização.
13:56Uma festa.
13:57Então, eu não me preparei, não porque eu neguei.
14:00É porque eu acreditava que eu fosse chegar até o fim.
14:03E mais que o fim, fosse ser saudável.
14:06E não no susto com 23 semanas, né?
14:08Que 23 semanas é considerado aborto.
14:11Tem hospitais que não tem estrutura e nem uma ideologia de salvar a vida do bebê.
14:16Que consideram lixo biológico.
14:19Então, até 24 semanas é considerado aborto.
14:23Então, eu não esperava que isso fosse acontecer.
14:25Não, e aí quando você também entrou em trabalho de parto.
14:28Não tinha nem tempo pra isso, né?
14:29Porque foi assim, foi muito rápido.
14:31É agora, você começou a sentir, vamos ter que fazer e tirar isso.
14:35Quando a médica falou pra mim, né?
14:37Que foi fazer ultrassonografia no leito.
14:39Eu não podia sair da cama.
14:41E ela falou colo imensurável.
14:44Eu falei, peraí, o que que tá acontecendo?
14:47E daí a obstetra que tava de plantão, ela falou.
14:50E aí que os bebês...
14:51Eu falei, e agora o que? Repouso absoluto de novo?
14:54Perna pra cima?
14:55Eu já tava em repouso absoluto, mas eu falei perna pra cima?
14:57O que que é?
14:59Ela falou, agora os meninos vão ter que nascer.
15:01Agora não tem outra opção.
15:03Então, foi um susto muito grande.
15:05Como assim?
15:06Eles estavam ali guardadinhos.
15:07Eles ainda estavam se desenvolvendo.
15:09Então, eu acompanhei a minha gestação extraútero, né?
15:13Fora do útero.
15:15Em incubadoras que simulavam o meu útero.
15:17Como eu tive um problema na placenta, eu tive uma má formação na placenta por conta justamente da pressão alta.
15:26O que aconteceu?
15:27Pra mim, veio tudo muito carregado de uma culpa.
15:31De assim, no fim das contas, o forno não funcionou.
15:34Sabe?
15:35Então, você fica naquela de o que foi que eu fiz errado?
15:38Onde é que eu poderia ter mudado alguma coisa?
15:42Nesse momento entre você entender, eu entendi com 25 semanas que poderia vir antes, mas a prospecção era que viesse com 34 semanas.
15:5236 e não com 31.
15:54Eu tinha acabado de completar 31 semanas, né?
15:57Foi 31 semanas e um dia.
15:59Gente, cada semana conta muito, né?
16:00Muito.
16:01Cada dia conta muito.
16:03Conta muito.
16:05Parece mais uma semana de diferença.
16:07É uma eternidade dentro dessa semana, né?
16:09Então, assim, eu comecei...
16:11E assim, quando você entra no Dr. Google, ali que você vai pesquisar, as primeiras coisas que aparecem são as sequelas que o seu bebê vai ter.
16:20E não o que pode vir de bom.
16:22E não o que ele pode superar.
16:24Vem questão de hemorragia cerebral, vem questão de consequências a longo prazo, que não vai andar, que não vai falar, que não vai...
16:33Então, você começa a ficar meio neurótico.
16:36E aí, dentro disso, eu preferi me resguardar.
16:40Eu falei, não, peraí.
16:41Eu tenho um dia...
16:43Era um dia.
16:43Eu internei no sábado e tive Ana Júlia no domingo.
16:48Eu tinha um dia pra entender tudo, engolir e ir pra frente.
16:54Além de tudo, como eu tenho o mais velho, eu tava muito mal, mas eu também não poderia ficar tão mal.
16:59Porque eu tinha ele pra...
17:01Não, mamãe tá bem, irmãzinha vai chegar.
17:04Era assim, rindo as lágrimas por dentro.
17:07Mas eu tinha que estar bem pra ele.
17:10Eu também tinha ele pra dar um apoio ali e falar, vai dar tudo certo e tal.
17:15Por mais que eu tivesse medos infinitos.
17:18Inclusive de ela não nascer.
17:20De ela não sobreviver ao nascimento.
17:22Que foi uma questão que o meu médico foi muito taxativo.
17:26Falou, olha, a gente vai fazer, mas você tem que entender que tem um percentil muito baixo.
17:32Que tem um risco muito alto de que estamos no 50% agora.
17:37Vamos se segurar nesse 50% de que vai dar certo.
17:41E ainda bem deu certo.
17:42Mas assim, quando você começa a pesquisar essas coisas, como eu falei.
17:46Vem tudo do ruim, do negativo.
17:48Tudo do que pode dar errado.
17:49Eu também não olho, assim, hoje, né?
17:52Eu não olho o Google.
17:53Pra isso eu não olho.
17:55Quando meus meninos nasceram, com essa gravidade toda, com a prematuridade extrema.
18:01Eu conversava muito com as outras mães.
18:04Só existia eu e mais uma mãezinha que teve bebê, acho que três semanas depois de mim.
18:10Que também era de 23 semanas.
18:11Então a gente trocava muita informação.
18:13E com outros médicos.
18:15Mas eu evitava de olhar.
18:17Porque se a gente olhar...
18:18Ai, meu Deus.
18:19A gente se impregna de um medo que é desnecessário.
18:25Já existem os nossos medos.
18:26A gente já tem que conviver com as nossas inseguranças.
18:29Com aquilo que a gente vê.
18:30Então essas informações só impregnam ainda mais.
18:34Só limitam ainda mais a nossa fé e nosso otimismo.
18:37Então eu evitava de olhar.
18:40Não, e quando é pra gente, né?
18:42Ai, tô com uma dorzinha aqui.
18:43Você procura, você fala.
18:44Ai, você pode morrer.
18:45Ai, você fala.
18:45Ai, meu Deus.
18:46Que notícia ruim, né?
18:46Mas quando é no filho da gente, aquele negócio, você toma uma proporção muito maior, né?
18:51Aí você fica assim.
18:52Ai, apareceu.
18:53Vira e mexe.
18:53Eu faço isso com o Levi.
18:54Eu tenho um bebezinho de um ano.
18:55Aí eu falo.
18:56Ai, é alergiazinha na perna.
18:59Se aparece alguma coisa lá, é melhor ir ao médico.
19:01Eu já fico.
19:02Ai, meu Deus.
19:03Essa alergia é muito grave.
19:04Eu preciso ir ver agora.
19:05E assim, né?
19:06No filho da gente, toma uma proporção muito maior, né?
19:09Então, realmente é o tipo de notícia que a gente não quer.
19:11Não precisa ficar ali.
19:12E os médicos, eles têm que trabalhar com a realidade.
19:15E nem todos são tão empáticos ou delicados ao falar.
19:19E beiram a crueldade de dar uma informação.
19:22Olha, talvez sua bebê não sobreviva.
19:25Olha, talvez...
19:26Tem que, obviamente, não pode mentir.
19:29Mas saber como vai comunicar aquilo
19:32para aquele desafio virar para você um foco de força.
19:37Não é todo médico que consegue.
19:38Eu lembro...
19:39A minha médica, a minha obstetra, ela é incrível.
19:41Ela foi muito dura quando eu fui internada.
19:44Hoje eu agradeço.
19:45Mas eu lembro que ela virou para mim e ela falou.
19:47Eu não estou preocupada com você.
19:48Eu estou preocupada com esses dois meninos que estão aí dentro.
19:50Você, você faz terapia.
19:52A gente chama aqui seu psiquiatra, seu terapeuta.
19:55Meu, psicólogo.
19:56Seus meninos, não.
19:57Eles estão sob o nosso cuidado aqui.
20:00Isso, na hora, para mim, me chocou.
20:02Porque eu tinha e tenho um trato comigo
20:04de não me anular enquanto ser humano, enquanto mulher,
20:08apesar de ter virado mãe.
20:09Porque o meu filho precisa de mim inteira.
20:12Então, não dá para eu ser meio mulher.
20:14Eu preciso ser inteira para ele.
20:16Para ele, para mim, para o meu marido, para a minha mãe, para a sociedade.
20:20Então, eu tinha esse trato comigo.
20:22Eu falava, como assim?
20:23Mas e eu?
20:24E os meus sonhos?
20:25E as minhas expectativas?
20:26Eu sonhava em ficar com barrigão.
20:28Eu fui ficar com barrigão no hospital.
20:31Enfim, eu demorei muito para ter barriga.
20:34Mesmo grávida de gêmeos.
20:36E aí, eu estava de barrigão no hospital, mas eu não podia levantar para fazer uma foto.
20:39Eu lembro que, no momento que eu fui no banheiro, eu pedi para levar...
20:43Eu estava tentando fazer aquela foto mês a mês, né?
20:46No mesmo lugar, aquela coisa.
20:48E aí, eu pedi para levar a roupa que eu estava usando na tal foto.
20:51Quer dizer, eu só fiz três fotos, né?
20:54Daquela.
20:54Com um, dois, três meses.
20:56Depois, eu já fui internada.
20:57E aí, eu tirei a foto.
21:00Na hora que eu fui no banheiro, eu falei, eu aproveitava muito o carro, tirei foto.
21:03Minha médica me deu uma bronca tão grande.
21:05Eu falei, mas eu só fui fazer um xixi e tirei uma foto.
21:08Foi só isso.
21:09Por que eu não podia?
21:10Então, imagina.
21:11Uma mulher como nós.
21:12Tenho certeza que posso falar por vocês.
21:14Ativas.
21:15A gente faz tudo.
21:16Ajuda todo mundo.
21:17De repente, virar paciente em todos os sentidos.
21:20É um desafio também.
21:22Não, super desafiador.
21:24E eu acho que, então, já ficou, assim, uma dica para quem está passando por uma situação parecida.
21:28De não buscar informações, né?
21:31Nas redes sociais.
21:32Pior ainda.
21:33Pior ainda que o Google são as redes sociais.
21:35É você buscar essa rede de apoio.
21:36E você falou que foi na UTI que você encontrou o primeiro apoio.
21:39Ali é a outra mãe.
21:40Na mesma situação que você.
21:42Eu queria que vocês contassem, então, como é que foi esse parto.
21:45Teve esse encontro com as crianças.
21:49Quanto tempo levou.
21:50É, quanto tempo você teve.
21:51Quando que foi esse encontro.
21:53E essa entrada na UTI neonatal, assim.
21:55Como é que foi para vocês ter esse primeiro contato e ficar olhando ali do vidro?
21:58Olha, eu não sei para você, Ana.
22:01Mas, para mim, os meus meninos nasceram.
22:05Eu pude dar um beijinho na cabecinha de cada um.
22:07E eles tiveram que correr para a incubadora, né?
22:12E serem entubados rapidamente.
22:13Então, foi muito assustador.
22:18Mas, era aquilo que eu tinha.
22:20Então, no lugar de eu me desesperar e enxergar esse cenário horrível.
22:26Eu pensei, é essa a minha história.
22:28É essa a minha realidade.
22:29Então, eu lembro que o Antônio foi o primeiro a ser apresentado para mim na incubadora.
22:33Eu olhei e falei, ah, que bonitinho, que fofo e tudo mais.
22:36Ele era muito perfeito.
22:37Ele já estava muito formadinho.
22:39Quando o José apareceu, tadinho, eu lembro que eu olhei e falei, ah, que bichinho feio.
22:46Aí, as enfermeiras, na mesma hora, recolheram.
22:48Acho que elas ficaram meio chateadas porque o Antônio pressionava muito ele na minha barriga.
22:53Então, ele nasceu com uma coloração diferente, mais roxo.
22:59E ele não estava muito formado.
23:01Então, ele foi um pouco mais assustador.
23:04E aí, eles foram recolhidos para a UTI NEO.
23:07Eu fui para o quarto, né?
23:09Fui para o repouso.
23:11Depois, eu fui para o quarto.
23:12Eu só fui liberada para vê-los à noite.
23:14E eu fui me preparando.
23:16Eu pensei, eu não posso me render ao meu desespero, aos meus traumas.
23:21Não.
23:22Eu sei que eu não vou ver um bebê.
23:24Eu não sei o que eu vou ver.
23:26Mas, são meus filhos.
23:28E agora, eu preciso passar para eles toda a força do mundo.
23:32Eu preciso ser otimista, passar para eles palavras de força, de empoderamento, de coragem.
23:38Porque eu quero que eles sejam essas pessoas.
23:41Quero que eles queiram viver também.
23:43Então, eu não posso...
23:44Não, Sanadio, mas você estava numa evolução espiritual que eu estou aqui te ouvindo falando.
23:47Meu Deus do céu, que maturidade, né?
23:51Que você estava, que força.
23:52E eu acho que isso também é muito...
23:54Assim, com certeza acredito muito nisso.
23:56E fruto também de um investimento que você sempre fez em você.
24:00Que você fala que você sempre fez também, né?
24:01De cuidar físico, emocional, espiritual, trabalhar isso.
24:05Porque você vê que quando um momento de muita crise chegou,
24:08você poderia estar mais abalada do que você já estava, né?
24:12E assim, de alguma forma...
24:12Ele fala para mim que ficou com muito medo.
24:16Ele falou, meu Deus do céu, como que ela vai reagir quando vê?
24:18Porque ele já tinha visto, ele ficou ali o tempo inteiro de pertinho, acompanhando todo o processo.
24:24Ele conta para mim que ele ficou muito preocupado com a minha reação.
24:27E que ele se surpreendeu.
24:29Mas eu não tinha opção, sabe?
24:31Eu fui tomada por uma força que eu acho que só existe quando a gente se torna mãe.
24:38Quando a gente, obviamente, tem uma fé.
24:41No meu caso, eu tenho uma fé imensurável e inabalável.
24:44No meu Deus, no meu Jesus.
24:46Mas quando a gente se torna mãe, é uma força.
24:50Que você não sabe de onde você tira, sabe?
24:53Quando você também é uma mulher segura, você entende qual é o seu papel ali.
24:56E o meu papel ali era de fortaleza para os meus meninos.
25:01E eu podia me cuidar.
25:03Podia ir lá fazer terapia.
25:05Imagina, eu fazia terapia.
25:07Tinha a psicóloga do hospital, o psicólogo da minha obstetra, que ia me atender.
25:11E mais a minha terapeuta, que trabalha com hipnose.
25:13Então, assim, eu estava resguardada.
25:15E fora todos os meus irmãos da igreja, que eu sou evangélica,
25:18todo mundo ia lá também orar e ajudar.
25:21Então, eu sabia que eu podia me cuidar.
25:22Mas e eles?
25:23Eles tinham, sim, uma equipe médica sensacional.
25:26E enfermeiras, técnicas, com muito amor.
25:31Mas eles precisavam ser encorajados.
25:34Elas não estavam.
25:35Elas estavam ali para cuidar tecnicamente.
25:37Mas eles precisavam dessa enxurrada de coragem.
25:40Então, eu deixei a minha roupinha do medo do lado de fora da UTI NEL.
25:45Eu devia ter deixado a minha também.
25:46Esqueci.
25:48A minha veio comigo.
25:50Ficou presa, estava amarrada.
25:51Ficou presa, estava amarrada.
25:53É, é isso.
25:53Não, mas acho louvável, incrível.
25:57Eu confesso que até a minha fé, eu questionei.
25:59Sou uma pessoa de muita fé também.
26:01Mas, assim, até, sabe o...
26:04Sério, Deus?
26:04É isso aí que você está fazendo?
26:06E quando eu vi a Ana Júlia, foi muito chocante.
26:09Eu acho que eu também tenho essa questão de ter tido um Diego.
26:13E aí, aquela idealização, o Diego nasceu grande, nasceu gordinho, nasceu a termo, nasceu...
26:19Eu peguei, desculpa.
26:21Eu peguei, coloquei no peito, teve aquela hora, teve tudo.
26:25E aí, com ela, não teve nada.
26:28Sabe?
26:28Simplesmente, ela nasceu, teve uma correria no centro cirúrgico, levaram ela.
26:37Eu só consegui olhar para o meu marido e falei, vai atrás, vai atrás.
26:40Pelo amor de Deus, não deixa ela sozinha.
26:42Vai atrás, eu estou aqui, estou bem.
26:44E aí, ele foi atrás, assim...
26:47Ela não teve nenhuma intercorrência mais firme.
26:50Mas, assim, as primeiras fotos dela, você vê que, pela diminuição extrema do líquido,
26:57a pele dela tiveram várias escoriações, assim, no pescocinho.
27:02Você vê que está praticamente em carne viva, sabe?
27:05Então, a primeira vez que eu vi minha filha, foi uma foto que o meu marido tirou.
27:09Quando eu consegui, quando eu tive autorização para subir na UTI NEL,
27:14já era no fim da tarde, assim...
27:16Eu me deparei...
27:18Veja, eu tive o Diego em 2020.
27:21Embora fosse pandemia, ele chegou lindo, num carrinho, num becinho,
27:25para ficar comigo no quarto e tal.
27:27Eu não tive essa experiência de chegar na maternidade e ver vários bebês.
27:32Mas aí, quando você chega na UTI NEL, é aquele lugar todo branco, com luz branca,
27:37todo mundo de máscara, todo mundo de touca, todo mundo de avental.
27:42E aí, você chega e olha, são vários cubículos, assim, um do lado do outro,
27:46com vários pais e mães, com cara de desespero.
27:50E aí, bateu uma coisa, assim, eu fui de cadeira de roda, porque ainda não podia andar.
27:55E aí, bateu aquele de, nossa, essa é a minha realidade agora.
27:59E aí, o medo veio comigo.
28:01Eu não consegui deixar o medo de lado, eu não consegui trazer toda a força que eu podia.
28:06Não, eu fiquei louca, desesperada.
28:08Falei, pelo amor de Deus, aí minha fé voltou.
28:10Aí, a fé voltou com tudo.
28:14Eu comecei, assim, num culto ecumênico, todo mundo que eu conhecia, seja de quaisquer religião,
28:20eu, pelo amor de Deus, reza pela minha filha.
28:23E comecei naquele processo de pedir, implorar, porque tem aquelas 72 horas,
28:30acredito que seus bebês entraram nisso também, que são as 72 horas de mínimo toque, né?
28:35Que eles não fazem nenhum procedimento no bebê, deixa lá pra, justamente, o bebê reagir e tal.
28:41São procedimentos mínimos.
28:43E fica naquela incubadorazinha.
28:46Enfim, deve ter sido a mesma coisa, que eles chamam de frog, né?
28:49Que é o, aqui é toda úmida.
28:53E aí, enfim, eu vendo aquilo, só que assim, na UTI que eu tava, na sala,
29:00tinham vários bebês, nenhum era tão pequeno quanto o meu.
29:04Embora tivessem pessoas que tiveram filho com menos semanas,
29:10mas não era esperado 940 gramas.
29:13No segundo dia, a Ana Júlia pesou 800 e poucos gramas.
29:17Então, assim, ao invés de, embora eu já tivesse preparada,
29:19porque as pessoas vinham e falam, olha, vai perder um pouco de peso no início e tal,
29:24você não tá preparada pra sua filha ter 800 gramas, sabe?
29:27Pra olhar ali, eu não conseguia nem ver o rosto dela,
29:30de tanto equipamento que tinha no bebê.
29:33E você olha, você não vê uma criança, você vê um monte de equipamento
29:36com uma pessoa ali embaixo que você mal identifica.
29:39Então, foi muito chocante.
29:41Eu senti, foram muitas sensações controversas.
29:46E a culpa, né?
29:47Que eu não consegui ter essa evolução, pelo menos no início.
29:52E aí, veio aquela culpa gigante de o que é que eu fiz de errado.
29:56Mas, passou.
29:59E aí, eu acho que, à medida que você vai entrando de novo naquele ambiente,
30:03vai conversando com outras mães, as enfermeiras,
30:06pra mim, as técnicas de enfermagem são seres completamente iluminados,
30:11porque foi quem me ajudou.
30:13Tem um momento ali que você sai da UTI, né?
30:16E você não pode mais fazer nada.
30:20Assim, o bebê tá ali, é o melhor, a melhor estrutura que pode ter.
30:25Tem várias pessoas preparadas, mas você é mãe, não quer sair dali.
30:29Mas aí, nesse processo, chegou uma técnica de enfermagem,
30:33segurou na minha mão e falou,
30:34Ana, não adianta você ficar aqui sentada 24 horas por dia.
30:38Você tem que viver também.
30:39E aí, eu peguei lá a coragem que eu tinha deixado do lado de fora
30:44e conversei com a Lu, que me ajudou muito também no processo.
30:49E falou, Ana, vamos, o que você puder, as entregas que você puder fazer,
30:56o que a gente conseguir.
30:58E eu falei, ai Lu, vamos, vamos junto, porque tá difícil,
31:02mas eu não posso ficar o dia todo no hospital.
31:05E se eu não tivesse uma ocupação, eu passaria o dia todo no hospital.
31:08Então, foi meio que assim, eu pedi, quase que pedi, pra voltar a trabalhar.
31:14Eu falei, pega só assim, o que você gosta mais, de todos os conteúdos,
31:19e ali faz um pouquinho de manhã, e é isso, né?
31:22Mas é, porque é muito fácil você passar o dia todo lá.
31:26A Nádia deve saber disso muito bem.
31:28É muito fácil você ficar dentro do hospital e viver somente a rotina do hospital,
31:33mas eu não podia fazer isso.
31:34Eu tinha outro filho, eu tinha marido.
31:36Meus pais estavam aqui, então assim, meus pais moram em Recife, mas estavam aqui.
31:41Então, eu tinha que dar atenção, principalmente pro meu filho,
31:44pra ele entender que tava difícil a situação, mas que ia melhorar,
31:50que a irmã dele tava viva, que tava tudo certo, que a mãe dele tava bem.
31:53E tinha que dar o suporte emocional pra ele.
31:55Então, eu acho que é isso, é assim, se tem uma coisa pras mães que tão passando por isso,
32:03é não se anule e não entre na UTI e fique o dia todo e com esse mãe que dormia lá,
32:12que fazia tudo lá.
32:13Isso é muito louco, assim.
32:15Não dá pra você viver como se só tivesse aquilo na sua vida.
32:19Você tem que abrir outros olhares também.
32:23Até pra você mesma, né?
32:24Acho que o principal.
32:25Sim.
32:26Eu tive muito apoio das outras mães e foi interessante porque muitas viviam isso, assim.
32:33Chegavam de manhã muito cedo e saíam muito tarde e só ficavam lá o tempo inteiro.
32:39E eu tinha vontade de ser essa mãe.
32:42Olha que louco, né?
32:43Porque eu tinha outras ocupações, apesar de eu não ter outro filho.
32:48Eu imagino, eu via outras mães com filhos e eu falava, meu Deus, como que se divide?
32:52Que difícil.
32:54Eu queria, mas eu tinha outras coisas pra fazer.
32:58E aí uma passou a ajudar a outra, sabe?
33:02E assim, perto do hospital onde a gente ficou, da maternidade, tinha uma loja de maquiagem
33:06que dava aula de automaquiagem.
33:08Ah, vamos fazer.
33:09Ah, vamos tomar um café não sei aonde.
33:10Vamos, então a gente procurou ocupação, assim.
33:13Então, ah, vamos, noite da pizza.
33:16Aí uma das mãezinhas, ah, então toda terça-feira, noite da pizza.
33:19E todos os pais e mães de UTI se reuniam no refeitório e a gente pedia pizza e era um
33:24momento mais leve, digamos assim, né?
33:27Então eu tive, até hoje tenho essa rede de apoio dessas mães de UTI, que são minhas
33:33amigas e a gente se ajuda muito.
33:35Agora, você comentou da pele, né?
33:38Foi uma das coisas que mais me assustou.
33:42Eles tinham muitas...
33:44Pareciam escoriações, né?
33:45Porque não tá formado ainda.
33:47E não é uma pele, é algo gelatinoso.
33:49No caso dos meus meninos, então, eles não estavam formados.
33:53Então era...
33:54De fato, pareciam duas lagartixinhas.
33:56Eu falava, ai, meu Deus, minhas lagartixinhas.
33:59Porque não tem pelo, não tem nada.
34:02Eu falei, meu Deus, eles vão ter orelha torta?
34:04Até eu entender...
34:05Calma, eles estão indo a informação.
34:07Que a orelha era deitada.
34:10Parecia que eles tinham muitas feridas.
34:12Qualquer coisinha que você...
34:13A gente encostava naquela micro mão, a gente sentia a pele grudar.
34:17Então não tá formado.
34:19Então, realmente, é muito assustador.
34:21O trabalho da equipe de UTI NEL, das enfermeiras, das técnicas, olha...
34:27É algo muito surreal.
34:28Como é que consegue pegar uma veia, um acesso ali?
34:31Nossa, tem que ter uma sensibilidade, né?
34:33Nossa!
34:33O José, ele nasceu com 650 gramas e o Antônio com 580.
34:38E o José...
34:39Os dois pegaram uma bactéria e foi a bactéria que acabou provocando algumas intercorrências
34:44que levou o Antônio embora.
34:46O José chegou a 380 gramas.
34:48Nossa!
34:49Então, sim, talvez seja o peso...
34:52Aliás, esse copo é o mais pesado.
34:54Então é muito assustador.
34:56Muito!
34:56E as pessoas acabam agindo com descrença.
34:59Não vai aguentar.
35:01E eu queria até, se você me permite, entrar nesse assunto também.
35:06Como que foi pra você?
35:07O Antônio lutou por 16 dias, né?
35:09E você ali acompanhando.
35:12E, infelizmente, acabou nos deixando.
35:15Mas aí você fica dividida, né?
35:17Você não consegue nem viver o luto 100%,
35:19mas você precisa estar ali lutando 100%
35:21porque tem o José que precisava muito de você.
35:23Como é que fica a cabeça nessa hora?
35:25A fé foi o que te sustentou mesmo nesse momento?
35:30Como é que você conseguiu encontrar a força pra continuar lutando pelo José e não se abalar?
35:35Ou se abalou, talvez, também, né?
35:36Não, eu me abalo todos os dias, assim.
35:39Eu acho que eu sofro em doses homeopáticas porque eu não pude viver esse luto, né?
35:43Eu fiquei entre o luto e a luta, o luto e a esperança.
35:47Então, no dia do falecimento do Antônio, ele faleceu no meu colo.
35:51E eu tive que entender que eu tava entregando de volta o meu filho a Deus.
35:57E que aquela era a história dele.
36:00E que ali, dali em diante, eu viveria os piores dias da minha vida,
36:04mas que eu não podia fraquejar.
36:06Porque tinha um outro serzinho precisando da minha força.
36:09E eu não poderia ser egoísta de me render ao luto e à dor
36:12se o José precisava de mim.
36:14Então, eu não pude viver esse luto.
36:18Eu vivo hoje muitos momentos de luto, né?
36:22E de culpa, muitas vezes.
36:24Como que eu tô feliz se eu perdi um filho?
36:27A gente se culpa.
36:29Mas aí a gente tem que lembrar.
36:31Eu tô feliz porque Deus permitiu que meu outro filho estivesse aqui saudável,
36:37sobreviveu, ele tá bem.
36:39Então, ok.
36:40É a minha história e a história deles.
36:42Mas eu lembro muito que no dia que eu fui, o Antônio faleceu.
36:48E eu fui ver o José.
36:50Foi horrível.
36:52Entrar naquela UTI, olhar a incubadora do Antônio vazia.
36:56E a do José, com ele no estado em que estava, com 380 gramas.
37:01E eu podendo perder aquele meu outro filho também.
37:05Eu me humilhei, eu clamei.
37:08Pedi muito, muito a Deus.
37:10Chorei muito com Deus.
37:11Em momento nenhum eu me revoltei.
37:14Porque todo mundo tem um propósito, uma história.
37:17Mas eu clamei muito.
37:18E também recorria todo tipo de gente pra pedir oração pelos meus bebês.
37:24Tanto pela partida do Antônio, quanto pela luta do José.
37:26Mas esse luto eu vivo todos os dias.
37:31Eu costumo dizer que eu entendi isso.
37:33Tem dias que eu só sobrevivo.
37:38Nádia, eu sinto muito.
37:40Acho que todos nós aqui, como mães também, a gente sente muito pela perda.
37:45E aí, o que eu quero trazer agora, esse exercício final, a gente poderia falar aqui sobre como foi essa rotina que se seguiu na UTI.
37:55A gente poderia falar sobre todas as necessidades que essas crianças têm após sair do hospital.
38:02A gente poderia falar de muita coisa.
38:04Mas eu tô com o tempo super reduzido.
38:05Eu quero olhar pra vocês mães mesmo.
38:07Como tem sido agora, com as crianças em casa, crescendo, lindas, saudáveis.
38:14Mas ainda assim, imagino que sejam necessários alguns cuidados, alguns acompanhamentos.
38:20Enfim, como que tem sido pra vocês?
38:22Como é que vocês estão juntando esses cacos?
38:25E ao mesmo tempo, ali acompanhando, eventualmente, uma fono, uma terapia ocupacional.
38:30Eventualmente, consultas com mais frequência.
38:33Então, como é que tá sendo esse maternar, essas crianças que estão aí, crescendo e ganhando o mundo?
38:39Olha, intenso.
38:41A agenda do José é mais cheia do que a minha.
38:45A prematuridade, a gente não vence na hora em que a gente tem alta.
38:48A gente vence no dia a dia.
38:51A gente vence com cada etapa de evolução da criança.
38:54O José, ele faz fisioterapia todos os dias.
38:57Ele tem acompanhamento e faz também as sessões com a terapia ocupacional e com o fonoaudiólogo.
39:02Ele tá indo muito bem, graças a Deus.
39:05Ele teve a hemorragia cerebral nível 1, que foi reabsorvida.
39:10Então, hoje ele trabalha a parte de mobilidade pra não ter sequelas.
39:14Se ele vai ter, a gente não sabe.
39:16Mas, até o momento, ele tá indo super bem.
39:20E é interessante porque agora que eu tô perto de voltar a gravar,
39:25é que eu tô preocupada.
39:27Ai, meu Deus, e agora ele não vai mais me reconhecer como mãe?
39:30Eu tô numa nóia, gente, tão doida.
39:33A volta é sempre um sofrimento.
39:35Mas olha que louco.
39:36Olha como é que eu sou meio biruta.
39:38Eu viajei pra trabalhar, fiquei quase 10 dias gravando em Santa Catarina.
39:43E foi excelente.
39:44Foi maravilhoso.
39:45Eu me senti mais mãe ainda.
39:47Eu me senti poderosa, eu me senti feliz.
39:49Meu bebê ficou bem.
39:50Foi tudo lindo.
39:52Ai, eu viajei e fiquei 5 dias com meu marido.
39:54Quando eu voltei, o José já tava, tipo assim, nem senti sua falta.
39:59Eu falei, cara, ele não me reconhece mais, ele tá me estranhando.
40:02Ele tá me estranhando.
40:03Aí, pronto, já deu aquele gatilho.
40:06Agora que eu vou trabalhar, vou ficar o dia inteiro fora, o menino vai querer saber de mim.
40:10Enquanto com o pai, ele volta e fica todo sorridente.
40:13Mas isso acontece em qualquer situação.
40:16Eu saio de manhã e aí, quando eu volto, às vezes o Levi fica super, mamã, mamã, super feliz.
40:22Mas ontem mesmo, eu cheguei em casa e ele, tudo bem, querida, tudo bem.
40:26Eu fiquei assim.
40:27Eu passei o dia sofrendo de saudade de você, assim que você me recebe.
40:32Acho que em qualquer situação, a mãe nunca vai se livrar desse sentido.
40:34Então vai ser mais uma etapa pra eu vencer.
40:36E eu acho muito gostoso isso, assim.
40:39Esses novos sentimentos, essas novas emoções.
40:41A gente gera um autoconhecimento, uma autoanálise muito legal.
40:45Eu curto viver, ainda que seja algo perturbador.
40:48Eu acho que é muito bom pra nossa evolução.
40:50O spoiler é piora.
40:52O meu de cinco anos chega da escola e eu, filho, vem dar um abraço na mamãe.
40:58Ele, tá.
41:00Tá nem aí.
41:02Ele quer os brinquedos, ele quer a escola, ele quer os amigos, ele quer tudo.
41:07Mas a mãe só quer naquela horinha, né?
41:10Que machuca, que tá querendo dormir.
41:14É, mas assim, piora.
41:16Vamos por aí que piora.
41:17Socorro.
41:17Com o Jujuba tá sendo uma delícia.
41:21Eu passo a maior parte do tempo em home office, então tô com ela.
41:24É, mas assim, é um, eu acho que é descobrir um bebê diferente a cada dia.
41:32Porque cada dia que eles evoluem, a evolução, volta a questão do tempo.
41:37O tempo na prematuridade é muito diferente.
41:39Então, tem um momento em que ela já, ela começou agora, vai fazer cinco meses amanhã, a querer segurar o pescoço.
41:48Olha quanto verbo, né?
41:49Querer segurar.
41:51É, é muito diferente do meu primeiro, que com três meses eu já tava firminho.
41:56Então, assim, é descobrir, é redescobrir.
42:00Um dia ela tá melhor, outro dia ela dá uma, uma titubeada.
42:05E aí, qualquer coisa é uma questão muito grande.
42:08Uma dor de barriga vira uma questão muito grande.
42:11Um espirro vira uma questão muito grande.
42:13Às vezes eu brinco, assim, com meu marido, com minha mãe que tava aqui.
42:16Ah, e Ana Júlia tá se mexendo muito.
42:19Ainda bem que ela tá se mexendo, né?
42:21Isso só demonstra que ela tá viva.
42:24Ainda bem que ela tá mexendo.
42:26Mas, assim, cada pequena coisa você vai redescobrindo aquele bebê.
42:30E nisso é muito gostoso.
42:31Eu tava comentando aqui com a Braz antes, que, assim, no início eu ficava muito cansada.
42:37Quando ela chegou, ela acordava muitas vezes de madrugada.
42:40Ela tinha uma necessidade de atenção constante, de colo, de afeto.
42:46E aí eu tava podre, mas eu falava, ela tá em casa.
42:51Ela tá aqui.
42:52Quantas madrugadas eu passei chorando, olhando e falando, queria estar com a minha filha.
42:57Eu sou uma péssima mãe por eu não estar dormindo no hospital do lado dela.
43:01Mas, assim, hoje eu vejo que é um milagre.
43:09Dentro do meu escopo de entendimento, é um milagre ela tá ali.
43:14É um milagre cada vez que ela tenta segurar o pescoço.
43:17Cada vez que ela olha pra mim com os dois olhinhos firmes.
43:20Cada vez que ela dá um sorriso por me reconhecer.
43:23São, tem lógico, né?
43:25Essa questão de, a gente sempre tem que dizer, ah, ela vai fazer cinco meses.
43:28Mas, na verdade, ela tá fazendo três.
43:30Mas, assim, são dois meses que mudam a percepção da gente de tempo, de maternidade, de prioridade.
43:39A prioridade muda e ela hoje é, com certeza, a minha prioridade.
43:45E aí a gente aprende a comemorar cada gotinha de evolução, né?
43:50Eu lembro quando o José abriu o olho.
43:52Eu lembro o quanto eu chorei, agradeci.
43:55Eu lembro o primeiro cocô.
43:57Primeiro cocô.
43:58Coisa que uma mãe que tem bebê a termo, não dá atenção.
44:02Então, nós somos muito abençoadas por termos vivido uma UTI.
44:06Porque a gente aprendeu a enxergar tudo com outro olhar.
44:10Com a outra sensibilidade.
44:12A dar muito mais valor a tudo que a gente vivencia com ele, sabe?
44:17O José também, imagina, ele fez um ano e um mês, mas ele tem nove meses.
44:20Aí as pessoas esperam, as pessoas não têm informação.
44:24Por isso que eu acho que a gente tem que falar cada vez mais.
44:26Ele tá ótimo pra um bebê de nove meses.
44:29Ele tá dentro do padrão, né?
44:31E aí as pessoas esperam que ele esteja como um bebê de...
44:35Ah, mas não tá falando ainda, gente.
44:36Ele tem nove meses.
44:38Gente, ele rolar já é suficiente, né?
44:40Nossa Senhora, no dia que ele rolou, eu chorei tanto, gritei.
44:44Então, a gente aprende a valorizar tanta coisa.
44:46E que vocês tenham sabedoria e serenidade pra não precisar lidar com a expectativa dos outros.
44:53Porque a gente, como mãe, a gente é muito afetada, né?
44:55Por sogra, no normal, assim, todo mundo dando palpite.
44:58E imagina vocês, né?
44:59Que já vêm dessa experiência muito diferente.
45:02Então, que vocês tenham essa sabedoria de tipo...
45:03Ah, a sua expectativa é a sua expectativa.
45:05Eu tô aqui com o time de profissionais, com a família, todo mundo reunido pra esse desenvolvimento deles.
45:11E que vocês também sejam acolhidas, que tenham um colo, né?
45:14Da vida, da família, dos amigos, né?
45:16Pra continuar vendo eles crescerem, lindos, se desenvolvendo.
45:20Quero agradecer muito, gente, por essa conversa.
45:23Eu e a Bresa aqui, muito de ouvintes, né?
45:25Nossa, é emocionante, com certeza.
45:28E emocionadas, assim.
45:29Vocês querem deixar algum recado final?
45:32Ou assim, a gente...
45:33Mamães, não sofram.
45:35Porque a gente já sofre demais, naturalmente.
45:37Se preparem pra valorizar cada etapa do nascimento, da gestação, do crescimento.
45:44Enxerguem com esses olhos cheios de sensibilidade.
45:47E, sobretudo, agradeçam.
45:49Agradeçam pela história que Deus escreveu pra vida de cada uma de nós.
45:52E é com isso que a gente tem que saber lidar.
45:55E não com um olhar de vítima.
45:58Ninguém é vítima de nada.
45:59Ao contrário, a gente tá num processo evolutivo.
46:01E é isso que Deus quer da gente.
46:03Nossos filhos precisam ver da gente a força que a gente quer que eles tenham.
46:06Então, se eu posso dizer isso, é...
46:09Não sofre, não.
46:11Entrega pra Deus.
46:12Confia.
46:14É isso, gente.
46:17Depois desse discurso maravilhoso, guardem suas culpas.
46:22Esqueçam elas.
46:23É isso.
46:25Obrigada, gente.
46:26Um beijo e até o próximo episódio.
46:28Obrigada, meninas.
46:28Obrigada a vocês.
46:29Foi ótimo.
46:30Tchau, tchau.
46:31Tchau.
46:36Tchau.
46:38Tchau.
46:39Tchau.
46:40Tchau.
46:43Tchau.

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