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00:00:00Música
00:00:02Música
00:00:30Música
00:01:00Música
00:01:30Música
00:02:00O que é isso?
00:02:13É um chubá
00:02:14Um chubá, uma árvore noturna
00:02:17Música
00:02:30Olha lá, é ele
00:02:37Ele quem?
00:02:39Ele está sempre ali pescando
00:02:41Música
00:02:42Música
00:03:00Música
00:03:30Aflição de ser eu e não ser outra
00:03:40Aflição de não ser amor
00:03:42Aquela
00:03:43Que uma filha te deu
00:03:44Casou donzelo
00:03:45E a noite se prepara e se adivinha
00:03:48Objeto de amor
00:03:50Atenta e bela
00:03:52Aflição de não ser a grande ilha
00:03:54Que te retém
00:03:55E não te desespera
00:03:58A noite como fera
00:03:59Se avizinha
00:04:01Aflição de ser água em meio a terra
00:04:03Ter a face conturbada
00:04:05Imóvel
00:04:06E a um só tempo múltipla
00:04:08Imóvel
00:04:09Não saber se se ausenta
00:04:11Ou se te espera
00:04:12Aflição de te amar, amor
00:04:15Se te comove
00:04:17E sendo água o amor
00:04:19Querer ser terra
00:04:21Parabéns
00:04:26Eu gostei
00:04:29Gostou?
00:04:31Gostei
00:04:32A traquejo
00:04:34A sorte
00:04:37A espírito
00:04:40E você fala sempre assim?
00:04:42Não, não
00:04:43Tô brincando
00:04:45Eu gostei mesmo
00:04:48Vocês são muito boas atrizes
00:04:52Vocês estão juntas há muito tempo?
00:04:57Nos encontramos pelo caminho
00:04:58Amanda fazia um monólogo meio sem graça
00:05:02Ah, Amanda
00:05:04Claro, Amanda
00:05:05Bonito nome
00:05:07Boa atriz também
00:05:09E o teu?
00:05:10Sônia
00:05:12Eu tenho uns discos no meu quarto
00:05:15São as minhas músicas
00:05:19Quer ouvir?
00:05:25Vamos pro meu quarto
00:05:27Você gostou da cena, não gostou?
00:05:37A peça nos expõe um pouco
00:05:39Por vias tortas
00:05:41Você não acha?
00:05:46Chama
00:05:46Encontrei um homem pra nós duas
00:05:51Amanda
00:05:54Vem, Amanda
00:05:58Amanda ainda tá amamentando
00:06:05Deve um filho a pouco
00:06:07Anda
00:06:11Tira a roupa
00:06:13Tira a roupa
00:06:15Tira a roupa
00:06:16Tira a roupa
00:06:17Tira a roupa
00:06:18Tira a roupa
00:06:19Tira a roupa
00:06:20Tira a roupa
00:06:21Tira a roupa
00:06:22Tira a roupa
00:06:23Tira a roupa
00:06:24Tira a roupa
00:06:25Tira a roupa
00:06:26Tira a roupa
00:06:27Tira a roupa
00:06:28Tira a roupa
00:06:29Tira a roupa
00:06:30Tira a roupa
00:06:31Tira a roupa
00:06:32Tira a roupa
00:06:33Tira a roupa
00:06:34Tira a roupa
00:06:35Amanda, ela está com fome, hein?
00:07:02Deixa ela mamar o teu peito.
00:07:04Amanda, eu estou todo suado.
00:07:07Vem dar banho nela, vem.
00:07:33Ela se chama Cristina.
00:07:50Cris, não gosta de Cris?
00:07:55Não gosta, gosta de Cris.
00:08:00Não gosta de Cris.
00:08:01Não gosta de Cris.
00:08:05Não gosta de Cris.
00:08:10Não gosta de Cris.
00:08:11Não gosta de Cris.
00:08:15Não gosta de Cris.
00:08:16Não gosta de Cris.
00:08:20Cris.
00:08:21Cris.
00:08:22Cris.
00:08:23Cris.
00:08:24Cris.
00:08:25Cris.
00:08:26Cris.
00:08:27Cris.
00:08:28Cris.
00:08:29Cris.
00:08:30Cris.
00:08:31Cris.
00:08:32Cris.
00:08:33Cris.
00:08:34Cris.
00:08:35Cris.
00:08:36Cris.
00:08:37Cris.
00:08:38Cris.
00:08:39Cris.
00:08:40Cris.
00:08:41Cris.
00:08:42Cris.
00:08:43Cris.
00:08:44Cris.
00:08:45Cris.
00:08:46Cris.
00:08:47Cris.
00:08:48Cris.
00:08:49Cris.
00:08:50Cris.
00:08:51Cris.
00:08:52Cris.
00:08:53Cris.
00:08:54Cris.
00:08:55Cris.
00:08:56Cris.
00:08:57Cris.
00:08:58Cris.
00:08:59Cris.
00:09:00O leite da tua carne, a minha fugidia.
00:09:06E sobre nós esse tempo futuro, urdindo a grande teia.
00:09:11Sobre nós a vida, a vida se derramando, cíclica, escorrendo.
00:09:23Fora, fora!
00:09:25Isso é sem vergonha e se cura.
00:09:26Ora, ora, ora, sem vergonha e se cura.
00:09:30Há algum escândalo por aqui?
00:09:33Há uma voz discordante na plateia?
00:09:37Há um senhor?
00:09:39Ah, está ali, que discorda do mavioso texto dito por essas duas senhoritas aqui presentes?
00:09:45Pra mim isso é merda.
00:09:49Isso é teatro, senhores.
00:09:51O conflito iminente.
00:09:54Nem sempre.
00:09:56Vamos entrar num acordo.
00:09:58Isso é bom para o teatro.
00:10:00Diga merda para o povo e seja sempre novo.
00:10:07Ah, nossa boca de vento.
00:10:09Blá, blá, blá.
00:10:11Boca de vento.
00:10:13Boca de vento.
00:10:15Deixa eu ver.
00:10:15A nossa boca de vento, que aparentemente é vazia, seria o primeiro momento de uma escatologia comparada.
00:10:27A nossa boca de vento, na verdade, são duas bocas de vento.
00:10:35Boca do nada.
00:10:38Partindo do nada, nós chegaremos a infinitas conclusões.
00:10:44Caro senhor, depois do nada, vem tudo de mão beijada.
00:10:50сидião, depois do nada, vem tudo de mão beijada.
00:10:52Forma, fora!
00:10:54Fora!
00:10:55Fora!
00:10:56Fora!
00:10:56Fora!
00:10:56Fora!
00:10:57Fora!
00:10:58Ah, eles piraram. Nós enlouquecemos a população da sociedade.
00:11:04Louco, sim. A minha loucura, outros que me atomem com que nela ia.
00:11:09Se é loucura o que é o homem, mas que besta sadia.
00:11:12Cadáver adiado que procria.
00:11:15O teatro é arte do agarro. O imprevisível já está no roteiro.
00:11:25Mas o que está acontecendo?
00:11:28Parece que nós atingimos o nervo exposto dessa simpática sociedade.
00:11:36Chutamos o saco deles. Todo mundo gostou.
00:11:42Uma catarse. Nós provocamos uma catarse nessa gente.
00:11:49Não é essa a nossa função?
00:11:52Nós liberamos os fantasmas, as forças sobrenaturais, os ódios reprimidos,
00:11:57Os desejos recalcados. Nós dividimos a plateia.
00:12:03Nós enlouquecemos o público.
00:12:06Que maravilha!
00:12:12Que belo exemplo esse que vocês dão.
00:12:14Um bando de vagabundos querendo me convencer que faz teatro.
00:12:19Que merda de teatro é esse que vocês fazem?
00:12:21Senhor delegado, nós não poderíamos transferir a discussão estética para depois?
00:12:27Do que somos acusados?
00:12:31Atentado ao pudor.
00:12:34E vamos ficar muito tempo aqui?
00:12:37Tempo suficiente. O suficiente.
00:12:41Tem comida e roupa lavada, pelo menos?
00:12:43A criança é de vocês?
00:12:49Esqueceram, pô?
00:12:50A criança é de vocês.
00:12:52Senhoras e senhores!
00:13:20Passando por aqui, resolvemos alegrar esse distinto público e contar um pouco da história
00:13:29de nossas vidas.
00:13:32Nós fazemos teatro!
00:13:34Você sabe o que é o teatro?
00:13:38O teatro é como se fosse um espelho.
00:13:45Entende?
00:13:46A gente se olha e se vê refletida, com um bonito cenário por trás.
00:13:50Luzes, roupas coloridas, música!
00:13:53Tudo como se fosse a vida.
00:13:58Refletida no espelho e vocês são o nosso cenário.
00:14:03É a vida desajeitada, isso sim, e feita aos pedaços.
00:14:08Respeitável público, a Companhia dos Artistas Mbembe apresenta o espetáculo intitulado
00:14:16a história dos pedaços de nossas vidas e como fomos proibidos de exercer a nossa profissão.
00:14:23Com Amanda, Sônia, Santiago, esse que vos fala e a pequena Cris, é claro.
00:14:43Já se ouve o ruflar do tambor.
00:14:46Chegou a hora de rir.
00:14:48Chegou a hora de chorar que o espetáculo vai começar.
00:14:54Enquanto eles arrumam o cenário lá atrás, permitam-me apresentar.
00:15:00Eu sou o poeta.
00:15:03Eu que crio os personagens, eu crio os diálogos, eu invento...
00:15:08Você quer fazer um favor de calar a boca, você tem que dizer, o espetáculo vai começar
00:15:13e pronto.
00:15:14Sim, senhor.
00:15:16E você não tem o direito de ficar revelando os nossos segredos?
00:15:20Sim, senhor.
00:15:22Eu não lhe pago muito bem?
00:15:24Quanto a isso, tenho minhas dúvidas, meu senhor.
00:15:26Cala a boca, eu vou aí e quebro a sua cara.
00:15:29Cala, senhor.
00:15:31Não, senhor.
00:15:32Diga o que tem que ser dito pro público saber qual é a verdade.
00:15:38Distinto público, o teatro é uma atividade muito bem paga e a mais honrosa das profissões.
00:15:47E não pode ser mau exemplo pra ninguém.
00:15:50E não pode ser mau exemplo pra ninguém.
00:15:53E não pode ser uma merda, como disse o nosso delegado.
00:15:56E não é uma merda, como disse o nosso delegado.
00:15:59Muito bem. Quanto eu lhe devo?
00:16:02Cinco moedas, senhor.
00:16:04Eu lhe dou uma.
00:16:06E agora, vamos começar.
00:16:09Abre a janela, minha querida comédia. Vamos entrar em função?
00:16:21Peraí, meu poetinho. Eu ainda tô me maquiando.
00:16:24Cara, tragédia. Estamos esperando?
00:16:27Eu sempre entro por último. Quem é que vai me dar a deixa?
00:16:30Dessa vez, vamos improvisar.
00:16:32Que papel vou fazer, meu amor?
00:16:34O seu próprio.
00:16:35Vai contar a minha história?
00:16:36Mais ou menos.
00:16:37Ah, não. Eu não quero saber de drama.
00:16:41Não quero ver ninguém chorando na minha frente.
00:16:43Não tem perigo. Nós nunca estaremos juntas no palco.
00:16:47Calma, gente. Não vamos brigar. O público está esperando. O espetáculo não pode parar.
00:16:53Vem cá, vem. O que a gente vai fazer? Para a minha julieta?
00:17:07Para com isso. Vem cá. Tô precisando de carinho.
00:17:14Sempre fugindo.
00:17:33Não é isso. Eu estou sempre em movimento.
00:17:37Movimento? Para onde?
00:17:40Sei lá. Para lá e para cá.
00:17:43A gente nunca sabe.
00:17:46Me deixou largada lá.
00:17:48Nenhum adeus.
00:17:50Para que despedida?
00:17:52Que diferença faz?
00:17:54Nesse seu mundo de merda, que diferença faz?
00:17:58Não é um mundo perfumado.
00:18:00Mas é o mundo em que vivemos.
00:18:03Tô cheia dessa vida.
00:18:05Isso que a gente faz.
00:18:08Muita gente chama de arte.
00:18:12Isso tem uma virtude.
00:18:15A redenção.
00:18:17Bela droga.
00:18:19Pode ser tragédia.
00:18:24Se for alta, a tragédia é melhor.
00:18:27Pode ser também a risada do homem forte.
00:18:33A risada do homem forte.
00:18:36Onde você tirou isso?
00:18:38Alguém escreveu.
00:18:40Anda pelas ruas sórdidas de armada.
00:18:45Um homem que não é sórdido.
00:18:49Quem é esse homem?
00:18:51Ele é jovem.
00:18:54E ele é pobre.
00:18:56É um homem comum.
00:18:58Ou não poderia andar com as pessoas comuns.
00:19:02Ele não aceita o dinheiro desonesto de ninguém.
00:19:08E também não aceita a insolência da parte de ninguém.
00:19:12Ele fala como uma pessoa da sua idade.
00:19:19É áspero.
00:19:21Tem senso do grotesco.
00:19:23Mas é espirituoso.
00:19:25E ele fala com total desprezo pela mesquinheza alheia.
00:19:36Belo perfil.
00:19:38E a sua história?
00:19:40É a aventura de procurar uma verdade oculta.
00:19:53Não seria uma aventura se não ocorresse com um homem talhado para a aventura.
00:19:59Se todos fossem como ele, este mundo seria mais belo.
00:20:07Mas não de interessante ao ponto de não se querer viver nele.
00:20:13Eu gostaria de amar esse homem.
00:20:16Eu gostaria de conhecê-lo.
00:20:37E aí
00:20:43Tchau, tchau.
00:21:13Tchau.
00:21:43O que é isso?
00:22:09É a sopa dos pobres, senhor.
00:22:12Dos pobres?
00:22:13Dos pobres, senhor.
00:22:15É a sopa dos pobres.
00:22:16Dos pobres?
00:22:17Dos pobres, é a sopa dos pobres.
00:22:19Eu não tenho certeza se eu estou com tanta fome, não.
00:22:39Tchau.
00:22:41Tchau.
00:22:42Tchau.
00:22:43Tchau.
00:22:45Tchau.
00:22:46Tchau.
00:22:47Tchau.
00:22:48Tchau.
00:22:50Tchau.
00:22:51Tchau.
00:22:52Tchau.
00:22:53Tchau.
00:22:54Tchau.
00:22:56Tchau.
00:22:57Tchau.
00:22:59Tchau.
00:23:00Tchau.
00:23:02Tchau.
00:23:03Tchau.
00:23:05Tchau.
00:23:06Tchau.
00:23:08Tchau.
00:23:09Tchau.
00:23:11Tchau.
00:23:12Tchau.
00:23:13Tchau.
00:23:14Tchau.
00:23:15Tchau.
00:23:16Tchau.
00:23:17Tchau.
00:23:18Tchau.
00:23:19Tchau.
00:23:49Tchau.
00:23:50Tchau.
00:23:51Tchau.
00:23:52Tchau.
00:23:53Tchau.
00:23:54Tchau.
00:23:55Tchau.
00:23:56Tchau.
00:23:57Tchau.
00:23:58Tchau.
00:23:59Tchau.
00:24:00Tchau.
00:24:01Tchau.
00:24:02Tchau.
00:24:03Tchau.
00:24:04Tchau.
00:24:05Tchau.
00:24:06Tchau.
00:24:07Você sabe mesmo bater a máquina?
00:24:10Que outra coisa eu sei fazer a não ser bater a máquina?
00:24:16Eu fui campeão de datilografia em Hamburgo.
00:24:21Você bateu muito rápido.
00:24:25Quer ver?
00:24:26Não.
00:24:27Não é preciso.
00:24:28Eu acredito.
00:24:29O que mais precisa fazer aí?
00:24:32O trabalho é fácil.
00:24:35Não se preocupe.
00:24:37Você vai aprender logo.
00:24:39O nosso trabalho é esse.
00:24:46Vender essas latas.
00:24:48Tome.
00:24:49Leve.
00:24:50Valeu.
00:24:51Você está mal.
00:24:52Precisa se tratar.
00:24:54Vamos arranjar uma casinha para eu morar.
00:25:07Tchau.
00:25:08Tchau.
00:25:09Tchau.
00:25:10Tchau.
00:25:11Tchau.
00:25:12Tchau.
00:25:13Tchau.
00:25:43Tchau.
00:26:13Tchau.
00:26:26Tchau.
00:26:27Tchau.
00:26:29Tchau.
00:26:30Trabalhe para ele, meu patrão
00:26:33Senta aí e espera
00:26:36Ele não demora
00:27:00Eu te recebo
00:27:18Como minha legítima esposa
00:27:21E te prometo ser fiel
00:27:23Na alegria e na dor
00:27:27Na miséria e na riqueza
00:27:30Na doença e na saúde
00:27:34Te amando e respeitando
00:27:37Por todos os dias da minha vida
00:27:40Eu te recebo como meu esposo
00:27:43E te prometo ser fiel
00:27:46Na alegria e na dor
00:27:48Na riqueza e na pobreza
00:27:51Na saúde e na doença
00:27:53Te amando e te respeitando
00:27:56Por todos os dias da minha vida
00:27:58Deus abençoe o amor de vocês
00:28:03Por este sacramento
00:28:06O que Deus uniu
00:28:08Que o homem não separe
00:28:10Amém
00:28:11Receba essas alianças
00:28:16Como prova
00:28:20Do meu amor e de minha fidelidade
00:28:25Receba esta aliança
00:28:28Como prova do meu amor
00:28:30E da minha fidelidade
00:28:32Em nome da Santa Madre Igreja
00:28:36Eu vos declaro
00:28:38Marido e mulher
00:28:40Pode beijar a noiva
00:28:42Não entendo
00:28:51E você?
00:29:06O que é que você está fazendo aqui?
00:29:12Eu vim cobrar uma dívida
00:29:14Do meu tio
00:29:14Prometi para minha mãe
00:29:17Quando ela morreu
00:29:17Ela me disse
00:29:19Filha, não peça nada
00:29:22Exija que ele te pague
00:29:23Tudo que roubou do teu pai
00:29:25Dá para perceber
00:29:27Você percebe nos menores gestos
00:29:32Você está muito tensa
00:29:34Como uma cobra esperando
00:29:37No momento de dar o bote
00:29:39Relaxa
00:29:42Vem cá
00:29:43Qual o problema?
00:29:51Filhos
00:29:52Não vem
00:29:54Sua mulher já viu isso?
00:29:56Fez todos os exames
00:29:57Parece que está bem
00:29:59Vamos fazer um espermograma
00:30:02Recolhe o material
00:30:03Nesse vidrinho, por favor
00:30:05É você que está aí?
00:30:10O que você está fazendo?
00:30:15Fala alguma coisa
00:30:16Me conta
00:30:18O que houve lá no médico?
00:30:22Não se faz de morto
00:30:26Diz alguma coisa
00:30:27Fala
00:30:30Pelo amor de Deus
00:30:31O que está acontecendo aí?
00:30:33Já não enche o saco
00:30:35O que você falou?
00:30:39Deus existe
00:30:41Porra
00:30:42O que você tem?
00:30:50Vazio
00:30:53Me sinto um saco vazio
00:30:57Nada por dentro
00:31:00Nem as entranhas
00:31:02Você não se apega a nada?
00:31:07Não sei porque fica comigo
00:31:09É uma inércia o casamento
00:31:14Mas casar faz bem
00:31:18É bom
00:31:22Você não acha?
00:31:29Eu gosto do seu tio
00:31:30Ele é um bom sujeito
00:31:33É
00:31:35Olá
00:31:40Qual é o resultado?
00:31:42Não há espermatozoides suficientes
00:31:44Para fecundar
00:31:45Na sua corte espermática
00:31:46Doutor
00:31:46Deixa essa retórica para lá
00:31:48Fala claro
00:31:50Não dá para procriar
00:31:51Não há espermatozoides suficientes
00:31:53Não há espermatozoides suficientes
00:31:55Agora
00:31:55Vamos ver
00:31:57De só
00:32:13Estamos aqui reunidos
00:32:37para encomendar o corpo de Alexandre da Silva Mar
00:32:41Que ele descanse em paz
00:32:45Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo
00:32:49Amém
00:32:51Viu?
00:33:05Não se pode ter tudo
00:33:07Sinto muito
00:33:09Não se lamente
00:33:11Eu estou triste
00:33:14Mas aliviada
00:33:15Me livrei daquela promessa
00:33:48Por que?
00:33:54Me descoitei, fiquei assim
00:33:55Quer dizer que não existe uma história longa de miséria na família?
00:34:02Não
00:34:03O único responsável sou eu
00:34:05E a família?
00:34:08Por favor
00:34:09Só hoje
00:34:11Eu preciso de um pouso
00:34:13Só por hoje
00:34:14Tá bem
00:34:18O dormitório é ali
00:34:21Cama 17
00:34:23Mas
00:34:39Música
00:34:41Tchau, tchau.
00:35:11Tchau, tchau.
00:35:41Tchau, tchau.
00:36:11Tchau, tchau.
00:36:42Um dia, estou indo para a cidade e parei meu carro num sinal vermelho.
00:36:50Apareceu um garoto que começou a esfregar o vidro do carro.
00:36:54O garoto cuspia e esfregava um panil de feltro no vidro do carro.
00:37:02Cuspia, esfregava, cuspia, esfregava.
00:37:04O sinal passou para a verde e o garoto não saía dali.
00:37:10Eu peguei umas moedas, mostrei para o garoto.
00:37:14Mas o garoto não via nada, ele queria esfregar o panil de feltro no vidro do carro.
00:37:22Então, começaram a buzinar sem parar.
00:37:28E o garoto ali na minha frente, a cuspir e a esfregar.
00:37:32Eu comecei a suar, puxei a gravata e gritei para o garoto, sai da frente, sai!
00:37:42E o garoto, nada.
00:37:45Então, não sei o que me deu nos miolos.
00:37:52Eu arranquei o carro e passei por cima do garoto, que morreu na hora esmagado pelos pneus traseiros.
00:38:01Meu filho, eu esmaguei o garoto.
00:38:15Depois disso, não entendi mais nada.
00:38:22Me deixei prender, me deixei internar num manicômio judiciário.
00:38:29Eu, que tinha corrido meio mundo regendo orquestras, abandonei tudo.
00:38:40Todos me abandonaram.
00:38:43E no fim da vida, vim parar aqui.
00:38:50Compreende?
00:38:59Bom, Carlos, esse é o novato.
00:39:20Como é o seu nome?
00:39:21Eu sou o Johnny Game.
00:39:23O que ele faz?
00:39:26Não sei, pergunta pra ele.
00:39:28O que você faz?
00:39:30Atualmente, eu compro feito.
00:39:33Ela quer saber o que você sabe fazer.
00:39:35Ah, eu sei.
00:39:37Contar histórias.
00:39:38Então conte, então conte.
00:39:40O que?
00:39:40Então conte.
00:39:41Vocês querem?
00:39:42Vocês querem que eu conte uma história?
00:39:44Silêncio, porque eu vou contar a história de como eu fui concebido.
00:39:56Eu me lembro.
00:39:59Entre mim e a minha concepção, há um anteparo.
00:40:03Uma espécie de vidro opaco.
00:40:05Para que não se distinga exatamente o contorno das coisas.
00:40:14Subitamente, explode uma convulsão e eu vejo em torno de mim partículas irrequietas, claras, muito claras, em meio à escuridão total.
00:40:27Então, vejam, senhores, de repente, uma terrível encarnação.
00:40:40É terrível, senhores, ver a matéria, afinal, se instalando em estado de aparente repouso.
00:40:50Ela não tinha motivo nenhum para vir, mas está aí agora, presa a uma forma.
00:41:03Me vejam, senhores, e vejam o resultado de tudo isso.
00:41:10Eu, em um corpo de carne e osso.
00:41:15De onde você veio?
00:41:17De um homem?
00:41:18Que diabo que você é?
00:41:19Que nada, ele não é desse mundo, não.
00:41:23Não tenha medo, minha irmã.
00:41:24Eu sou desse mundo.
00:41:27O seu nome é?
00:41:28Vicente.
00:41:30O que você faz?
00:41:31Sorveteiro.
00:41:32Sorveteiro.
00:41:33Jesus.
00:41:34Jesus?
00:41:35É.
00:41:36Carpinteiro.
00:41:37Carpinteiro.
00:41:37Você?
00:41:38Tião, eletricista.
00:41:39Tião, eletricista.
00:41:41Você?
00:41:42João, pintor de paredes.
00:41:43João, pintor de paredes.
00:41:45Sebastião, músico.
00:41:47Sebastião, músico.
00:41:48Músico.
00:41:49José, marcineiro.
00:41:51José, marcineiro.
00:41:52Ari, lixador.
00:41:54Eu preciso de uma costureira e uma cabeleireira.
00:41:57Estamos aqui.
00:41:59A costureira, o nome é?
00:42:00Helena.
00:42:01Helena.
00:42:02E a cabeleireira?
00:42:03Luma.
00:42:04Luma.
00:42:05Lucas, o que é aquilo lá?
00:42:07É a nossa banda.
00:42:09O que houve com ela?
00:42:11Está parada.
00:42:12Vamos ressuscitar a banda.
00:42:14Você se encarrega disso.
00:42:15E vamos fazer o quê?
00:42:17Nós vamos fazer teatro.
00:42:20Luma.
00:42:21Um dó.
00:42:24Obrigado.
00:42:26Admir, um dó comigo.
00:42:30Isso, obrigado.
00:42:31Sebastião.
00:42:32Agora nós vamos tocar a escada de dó maior.
00:42:39Você acompanha a gente.
00:42:40Está bom?
00:42:41Vai.
00:42:42Dó.
00:42:43Ré.
00:42:44I.
00:42:45É uma vez uma batalha sangrenta, que deixou em escombros cidades e aldeias.
00:42:58A mulher perdeu o marido, a irmã perdeu o irmão e o filho procura, entre as cinzas, seu pai e sua mãe.
00:43:10Infão.
00:43:12Não chegam cartas, não chegam notícias, mas corre de boca em boca a notícia.
00:43:19De um, os meninos se organizaram numa cruzada.
00:43:27Mortos de fome e de frio, eles caminham e se unem a outros meninos nas aldeias por onde passam.
00:43:41Na frente vai o menino, o líder que organizou a cruzada.
00:43:46E atrás, uma menina de 11 anos, que cuida do seu irmão, que mal sabe andar.
00:44:01Viajava também com eles, um menino triste e fraco, que sempre ficava para trás.
00:44:09E também um músico, que encontrou um tambor, mas sem prestígio, pois não podia tocar para não se denunciar.
00:44:18E ia também num cão, a princípio, para ser comido.
00:44:22Mas ainda não houve coragem para matá-lo.
00:44:27Um belo dia, eles encontraram um outro grupo de meninos.
00:44:31E quase se instalou uma guerra.
00:44:34Mas vendo o absurdo que era, eles fizeram uma trégua.
00:44:38Restou ainda uma pequena batalha em torno de uma cabana.
00:44:41Mas um dos lados ficou sem comida.
00:44:45E o inimigo, sabendo disso, mandou um saco de batatas.
00:44:50Pois não se pode lutar se não se come nada.
00:44:55Depois disso, continuaram a caminhar unidos.
00:45:02Pois é melhor caminhar juntos que separados.
00:45:05Houve também um julgamento, um dia, à luz de velas.
00:45:13E foi condenado o juiz, depois de uma difícil audiência.
00:45:21Houve também um enterro do menino fraco,
00:45:27que foi carregado nos ombros de seus companheiros mais fortes.
00:45:35Segura na mão de Deus e vai.
00:45:44Segura na mão de Deus.
00:45:50Segura na mão de Deus.
00:45:56Segura na mão de Deus.
00:46:01Ainda havia fé e esperança.
00:46:05Apesar de faltar carne, pão e qualquer sentido de direção.
00:46:13É claro que havia cartazes pendurados nos postos.
00:46:17Mas não se devia lê-los.
00:46:19Pois quem se fia...
00:46:22Podiam estar invertidos.
00:46:23Em torno do líder, se agrupam, pois confiam nele.
00:46:31E apontam para o horizonte branco, em qualquer direção.
00:46:36Por ali.
00:46:37Por ali deve ser.
00:46:42Por ali.
00:46:44Um fogo.
00:46:46Um fogo.
00:46:46Eles viram.
00:46:48Mas não se aproximam com medo.
00:46:52Vem cruzar também um batalhão de soldados.
00:46:58Eu fecho os olhos.
00:47:01E vejo que eles se deslocam.
00:47:03De um povoado destruído...
00:47:07...para uma aldeia em ruínas.
00:47:08Debaixo de um vento frio.
00:47:14Enregelados.
00:47:16Famintos.
00:47:19Eles caminham.
00:47:22Caminham.
00:47:24Eles só desejam uma terra para morar.
00:47:28Longe do troar dos canhões.
00:47:31E dos incêndios.
00:47:38Nessa manhã...
00:47:40...os soldados mataram um cão...
00:47:42...com um cartaz no pescoço.
00:47:46Os camponeses o encontraram.
00:47:49Socorro, dizia o cartaz.
00:47:52Estamos perdidos.
00:47:54Somos 50.
00:47:56Não matem esse cão.
00:47:59Só eles sabem onde estamos.
00:48:02Se o matarem...
00:48:03...nossa esperança morrerá com ele.
00:48:06A voz onê...
00:48:14...oê transita...
00:48:19...es perviam...
00:48:24...atê indité...
00:48:29...atê indité...
00:48:36...dividete...
00:48:39...se és dolo...
00:48:47Escuta.
00:48:49Preciso conversar com você no ambulatório.
00:48:50Se és dolo...
00:48:54...eu...
00:48:56...
00:48:57...
00:48:59...
00:49:00...
00:49:01...
00:49:02...
00:49:03...
00:49:04...
00:49:08Chora e grita o tempo inteiro.
00:49:10Você podia dar uma ajuda para a gente.
00:49:12Tenta se comunicar com ela, tenta.
00:49:13Como é que ela veio parar aqui?
00:49:14Assistência social.
00:49:15Tenta.
00:49:16Tenta.
00:49:17Como é que ela veio parar aqui?
00:49:18Assistência social.
00:49:19Assistência social.
00:49:46Fio.
00:49:49Simplesmente isso.
00:49:51Desapareceu.
00:49:55Dizem que ela pode ter morrido lá pelas bandas do norte.
00:49:59No último terremoto que teve por lá.
00:50:02Não sei.
00:50:06O que eu sei é que tudo caminhava bem e de repente ela sumiu.
00:50:13Voltei da escola e ela não estava mais.
00:50:15Como é que ela era?
00:50:17Bonitona.
00:50:21Muito louca. Não dá para descrever.
00:50:24O que ela fazia?
00:50:25Teatro.
00:50:27Ela era atriz.
00:50:28Muito boa atriz até.
00:50:29Vivia perambulando por aí.
00:50:31Mambeambando.
00:50:33E o nome dela?
00:50:35Amanda.
00:50:37Amanda?
00:50:39Você disse Amanda.
00:50:41Você ouviu.
00:50:42Você está branca.
00:50:45O palio é seu.
00:50:48E você também. Você parece transparente.
00:50:51Então você é a Cris.
00:50:52Eu não sabia.
00:50:54Você é a Cris que eu segurei no colo.
00:50:57Devia ter, sei lá, quatro, cinco meses.
00:51:00Não acredito.
00:51:03Não é possível.
00:51:07Como foi?
00:51:08A troca passou por aqui.
00:51:09Eu conheci você.
00:51:12Aí ficamos juntos duas semanas.
00:51:14Eu e Amanda.
00:51:17Aí ela foi embora sem se despedir. Sumiu.
00:51:20Nunca mais a vi.
00:51:22Ela sempre foi assim.
00:51:24Minha mãe.
00:51:27Nunca conheci meu pai.
00:51:31Quando eu nasci, disseram que ele tinha ganho uma bolsa de estudos.
00:51:35Pra Bélgica.
00:51:38Nunca mais soubemos dele.
00:51:41Minha mãe dizia que eu era a cara dele.
00:51:47Você me faria um favor?
00:51:51Me arranja um batom.
00:51:54Vamos tocar na festa da cidade.
00:51:56Muito bem.
00:51:58Vamos sair cedo amanhã.
00:51:59Sete horas.
00:52:01Que hora vamos voltar?
00:52:02Meio dia.
00:52:04Ah, o sol tá muito quente.
00:52:05Não poderia ser mais cedo, não?
00:52:07Não, não pode.
00:52:09Ué, por que que não pode?
00:52:11Por que não?
00:52:12Ué, então eu não vou.
00:52:13Pronto. Então não vai.
00:52:15Então eu não vou, não vou.
00:52:17E você? Como é que tá?
00:52:22Eu acordei.
00:52:24De manhã me espreguicei.
00:52:26Aí me perguntei, por que que você faz isso?
00:52:29É bom.
00:52:30Me disseram que espreguiçar.
00:52:32É bom pra musculatura.
00:52:35Alonga.
00:52:37Aí, é bom pra fazer ginástica.
00:52:39Mas, pra que fazer ginástica?
00:52:44Pra fortalecer meus músculos.
00:52:48Eu não sei.
00:52:50Mas, pra que fortalecer meus músculos?
00:52:56Pra vencer meus inimigos.
00:53:00Aí, eu disse pra mim.
00:53:03Pra que vencer meus inimigos?
00:53:04Porque me disseram que eles podem me deixar sem comer.
00:53:11Bem, então.
00:53:14Eu acordei de manhã.
00:53:16Me espreguicei.
00:53:18Pra fazer ginástica.
00:53:20Fazer ginástica.
00:53:23Pra fortalecer meus músculos.
00:53:25Fortalecer meus músculos.
00:53:28Pra vencer meus inimigos.
00:53:30Vencer meus inimigos pra não ficar sem comer.
00:53:34Aí, eu me perguntei.
00:53:37Pra que comer?
00:53:43Gris.
00:54:00Cris.
00:54:14Você quer seguir a carreira de Amanda?
00:54:19Quando eu andava pelas ruas.
00:54:22Depois da morte da minha mãe.
00:54:24Quando eu andava por aí.
00:54:28Sem eira nem beira.
00:54:30Às vezes, eu fazia o que tava representando.
00:54:34Você entende?
00:54:37Olha só.
00:54:40Eu procurava um lugar mais elevado.
00:54:43Fosse uma caixa vazia deixada pela feira.
00:54:48Fosse um banco de praça.
00:54:51Qualquer coisa.
00:54:54Então.
00:54:56Eu construía gestos muito disfarçados.
00:54:59Olhos.
00:55:01Boca.
00:55:03Uma expressão pro rosto.
00:55:07Inventava falas.
00:55:10Que elas não saiam pelos lábios, não.
00:55:15Porque eu não queria que notassem que eu tava representando.
00:55:21Porque se eu notassem.
00:55:26Meu Deus.
00:55:28Me poriam no hospício.
00:55:30E eu não queria.
00:55:32Até pensava que se fosse um asilo que nem esse aqui.
00:55:35Onde é só comer e dormir.
00:55:37Sem camisa de força.
00:55:39Eletro.
00:55:41Coisas assim.
00:55:42Até que dava pra ser.
00:55:43Mas eu não queria também asilo.
00:55:49Eu preferia ficar pelas ruas.
00:55:52Fazendo fogo com os restos do lixo que eu encontrava.
00:55:55Só pra ficar olhando.
00:55:58Como uma vez.
00:55:59Eu não quero mais falar nada.
00:56:07Você sabe de tudo, não é?
00:56:11Você sabe por que que eu vim parar aqui?
00:56:14Foi porque eu peguei uma agilete no lixo.
00:56:17E passei na minha língua pra ver se ela parava de falar.
00:56:23Eu não falava com ninguém.
00:56:26Mas eu falava pra dentro.
00:56:29Eu falava pra dentro.
00:56:32E era o tempo todo.
00:56:34Eu não tava mais aguentando.
00:56:38Então eu peguei a agilete no lixo.
00:56:46Droga.
00:56:52E passei na minha língua.
00:56:56Porque desde que minha mãe desapareceu.
00:57:00Desde então.
00:57:01Eu não consigo mais parar de ouvir minha voz.
00:57:09Então eu peguei a agilete no lixo.
00:57:14Mas uma velha me viu passando a agilete na língua.
00:57:17Chamou um guarda.
00:57:19Vieram outros guardas.
00:57:21Muita gente em volta.
00:57:23E eu me recusando a falar.
00:57:29Na língua mesmo.
00:57:32Só tinha uma dorzinha.
00:57:34Uma coisinha de sangue.
00:57:37Que me escorria no canto da boca.
00:57:39Aí veio o micro ônibus preto.
00:57:47E de repente eu tava aqui.
00:57:50Dentro dessa casa.
00:57:52Vamos fugir daqui.
00:57:54Uma manhã dessas.
00:57:55Bem próxima.
00:57:56Estarás comigo no paraíso.
00:57:57Uma manhã dessas.
00:58:00Uma manhã dessas.
00:58:02Bem próxima.
00:58:04Estarás comigo no paraíso.
00:58:05Estarás comigo no paraíso.
00:58:08Um beijo no paraíso.
00:58:10A CIDADE NO BRASIL
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01:00:46NO BRASIL
01:00:47A CIDADE NO BRASIL
01:00:53cream
01:00:54A CIDADE NO BRASIL
01:00:57Atença
01:00:58Lembra quando subimos para o quarto?
01:01:02Tinha um troço avesso no ar.
01:01:04Um ódio preso que acabou arrebentando no quarto.
01:01:08Ainda detonamos os insultos mais terríveis.
01:01:11Demos muros um no outro.
01:01:13Lembro.
01:01:16Eu me lembro.
01:01:18Lembro também daquele hotelzinho barato em Washington.
01:01:22Você ligou para sua mãe agonizante em Dallas.
01:01:26Lembro.
01:01:27Entrei no avião.
01:01:29Dois dias depois, ela morreu.
01:01:32E eu fiquei no hotelzinho, esperando para seguir viagem.
01:01:36Eu peguei a pequena caixa com as cinzas e enviei para a armada.
01:01:42E continuamos a viagem.
01:01:44Quando voltamos, enterramos as cinzas.
01:01:49Eu me lembro.
01:01:53Lembra daquele dia que eu te segui?
01:01:56Você me seguiu?
01:01:59Eu te segui por horas e horas.
01:02:01Você andava, esmo.
01:02:05E eu te chamei.
01:02:07Você se voltou assustado, meio envergonhado e disse oi.
01:02:10Não, não me lembro.
01:02:13Naquela noite, você disse, não.
01:02:16Não vou ficar.
01:02:19Vou me afastar do teatro.
01:02:22Dali, passei 20 anos sem te ver.
01:02:26Foi melhor assim.
01:02:27Agora você sabe que estamos prontos.
01:02:31Não precisamos mais avaliar, suspender, premeditar.
01:02:40Ah, as nuvens se abriram.
01:02:44O sol voltou a brilhar.
01:02:46A luz.
01:02:47Para que a luz?
01:02:49Não vivemos da luz?
01:02:50Os verdadeiros atores são aqueles limpos de figuras.
01:02:58Aqueles que se mantêm em refúgios, longe das linhas, dos volumes, das cores.
01:03:07Os verdadeiros atores, os verdadeiros atores, frutificam na ausência.
01:03:13E assim se tornam mais sumarentos, apetitosos, nutritivos.
01:03:19Por estarem apartados da selva do universo visual.
01:03:29Longe das plateias, então.
01:03:30Não, longe dessas formas prontas e acabadas, dessa exibição, que é a excrescência das coisas.
01:03:52Companheiro, nada mudou, né?
01:03:56Gosta?
01:03:58Esta é a sua cara.
01:04:00Este teatro está caindo aos pedaços.
01:04:08Isto é apenas uma casca.
01:04:11O verdadeiro teatro é o que acontece aqui.
01:04:16É o que se passa em cima destas tábuas.
01:04:30Tire o seu papo.
01:04:34Vamos, venha.
01:04:37Tome conta do seu espaço.
01:04:40Tome posse desse palco.
01:04:43Ande.
01:04:46Corra.
01:04:49Corra.
01:04:50Pule e esperneie.
01:04:51É seu.
01:04:52É seu.
01:04:59Eu...
01:04:59Eu me sinto estranha nele.
01:05:02Logo, logo, logo, você se acostuma.
01:05:07Cris, preste atenção.
01:05:08Você está criando um personagem.
01:05:12Você está de luto.
01:05:14Mas você não se cobre de luto, no rosto, no corpo, pela morte do seu amante ou do seu marido, qualquer ser vivente.
01:05:29Não.
01:05:30Você está de luto pelas misérias de toda a humanidade.
01:05:34E você acredita com ódio e desespero na possibilidade de ser ouvida.
01:05:41Você cobre esse rosto, com esse véu de luto, como se você cobrisse o corpo inteiro.
01:05:49Você se cobre de luto para expressar sua indignação.
01:05:57É isso.
01:05:59É assim mesmo.
01:06:01Incorpore o personagem.
01:06:02Eu não quero uma metamorfose.
01:06:07O ator nunca chega a se metamorfosear integralmente na personagem.
01:06:12Procure representar a conduta dessa mulher imaginária, mas não se confunda com ela.
01:06:18Você é uma atriz.
01:06:22Veja se descobre uma expressão exterior para as emoções da personagem.
01:06:27Uma ação que revele o seu íntimo.
01:06:30A emoção deve ser expressa no exterior.
01:06:37Deve se emancipar para que possa ser tratada com grandeza.
01:06:41Você já dirigiu antes?
01:06:44Não.
01:06:45Mas trabalhei muito.
01:06:49Conheci muitos diretores.
01:06:51Mestres.
01:06:51Ali vai estar o seu público.
01:06:58Houve uma época...
01:07:00Que se criou uma espécie de linha imaginária.
01:07:04Uma quarta parede separando o palco da plateia.
01:07:08Como se nós pudéssemos existir sem o nosso público.
01:07:12Os nossos dramas se passavam numa redoma de vidro.
01:07:17Criaram um teatro psicológico, intimista, visto pelo buraco da fechadura.
01:07:24Não existe mais isso.
01:07:26Nós estaremos sempre diante do nosso público.
01:07:29Eu vejo o teatro como uma praça cheia de gente.
01:07:35Homens, mulheres, crianças.
01:07:38A única coisa que temos que fazer é nos utilizar do gesto e do verbo para apresentá-lo ensaiado, pronto e acabado.
01:07:48Gostei.
01:07:50O que mais?
01:07:51Você tem que criar no palco gente de carne e osso.
01:07:56Você tem que tornar o personagem tão evidente, tão difícil de imaginar de outro modo,
01:08:02que o espectador será obrigado a aceitar o que você está lhe apresentando.
01:08:06Essa é a sua obrigação.
01:08:09Cris, vamos lá.
01:08:11Fique na posição.
01:08:13Dê o seu texto.
01:08:14Vocês dirão que é pura tolicimia, que é um desatino lamentar-se da sorte e de mais coisas dessa terra pasmada em que o destino nos esqueceu.
01:08:28Espere.
01:08:30Você fala para o público, mas não deve olhar para ele.
01:08:34Olhe um pouquinho acima, como se você estivesse olhando para o céu, para o mar ou para o espaço sideral.
01:08:42Experimente.
01:08:44Vocês dirão que é pura tolice minha, que é um desatino lamentar-se da sorte e de mais coisas dessa terra pasmada em que o destino nos esqueceu.
01:09:00A verdade é que dá trabalho se acostumar com a fome.
01:09:06E mesmo que digam que a fome repartida entre todos toca a poucos, o certo é que vocês estão morrendo.
01:09:15E não temos nem sequer onde cair mortos.
01:09:18E parece que as coisas estão cada vez piores.
01:09:19E não tem nada disso de encerrar o assunto com o nocego.
01:09:24Nada disso.
01:09:26Desde que o mundo é mundo, caminhamos com o umbigo grudado nas costas, tentando agarrar o vento com as próprias unhas.
01:09:32O mundo está imundado de gente como nós.
01:09:37De muita gente como nós.
01:09:40E alguém tem que nos ouvir.
01:09:44Alguém e outros mais.
01:09:46Mesmo que nossos gritos arrebentem os seus tímpanos.
01:09:52Não.
01:09:53Não estamos revoltados nem pedindo esmolas para a lua.
01:09:59Não.
01:09:59Não estamos com pressa de encontrar o nosso caminho.
01:10:04Nem vamos correr para o monte a cada vez que os cães nos ladram.
01:10:09Alguém tem que nos ouvir.
01:10:13Quando deixarmos de grunir como um enxame de vespas,
01:10:16Ou virarmos um rabo de furacão.
01:10:22Ou dispersarmos sobre a terra como se fosse um relâmpago de mortos.
01:10:28Então talvez nos chegue a todos o remédio.
01:10:46Gostei desse apartamento aqui.
01:11:03Cris?
01:11:05Cris?
01:11:11Meu pai?
01:11:13Como vai?
01:11:15Tudo bem, senhor.
01:11:16Vou indo.
01:11:18A Cris foi sempre essa garotinha linda?
01:11:21Sempre.
01:11:22Você está pálida?
01:11:32Meu pai.
01:11:34Meu pai.
01:11:36Você e seus cuidados.
01:11:38É uma boa cozinha.
01:11:44Eu sinto como se já te conhecesse.
01:11:53Pode ser.
01:11:55Me faz bem ver vocês juntos.
01:11:59Sempre que vocês se tocam,
01:12:02Eu sinto passar uma corrente indisfarçável de tremor.
01:12:05Emoção pura.
01:12:09Precinto que vai dar certo.
01:12:17Você foi ator até uns 20 anos atrás, não é?
01:12:21É.
01:12:22E por que você deixou a carreira durante esse tempo?
01:12:25Eu fiquei criando galinhas.
01:12:31Galinhas?
01:12:32É, galinhas.
01:12:33Para quem gosta de galinhas.
01:12:35E você gosta de galinhas?
01:12:36É.
01:12:37Gosto.
01:12:38E você mesmo matava as galinhas?
01:12:40É.
01:12:40É.
01:12:41Para vender ou comer?
01:12:45Para comer.
01:12:47Eu pego o pescoço delas, pegava, deslocava assim.
01:12:52No meu melhor desempenho.
01:12:55E qual o seu lazer costumeiro hoje?
01:13:01Se nem é uma praia.
01:13:04Não, não.
01:13:05Não, não tem nada.
01:13:14Como vai?
01:13:16Bem.
01:13:17Conta um pouco da sua história.
01:13:21Está.
01:13:22Minha mãe morreu meses depois de eu nascer e meu pai me criou sozinho.
01:13:31Ele me levava para o teatro e me deixava dormindo nos camarins.
01:13:35Muitas viagens nós fizemos juntos.
01:13:38Eu sempre com ele.
01:13:40Por cidades coerentas.
01:13:41Ele dizia que entrava em cena com medo de ouvir meu choro.
01:13:46Eu lembro uma vez eu estava no palco fazendo papel de barba ruiva.
01:13:51Quando ouviu o choro no camarim.
01:13:55Aí comecei a suar, não sabia o que fazer.
01:13:58Quando saí de cena por alguns segundos, cheguei no camarim e ela já dormia.
01:14:02Eu lembro de uma vez, eu tinha sete anos e nós chegamos numa aldeia de índios.
01:14:14Meu pai ia apresentar o alto de Natal.
01:14:17Era muito engraçado.
01:14:18Porque o menino Jesus, a Maria e o José, todos esses que são gente, na peça eram bichos.
01:14:28É.
01:14:30O menino Jesus era um bezerrinho.
01:14:33A Maria, a dona vaca.
01:14:35E o São José que meu pai fazia, era o boi.
01:14:38Era tudo ao contrário.
01:14:39Os bichos é que eram gente e os humanos eram figurantes.
01:14:44Os índios entenderam tudo.
01:14:51Eu lembro que numa dessas viagens ao interior, ela se estraviou de mim.
01:14:58Não era sempre que ela guiou o espetáculo.
01:15:01Quando cheguei ao hotel, ela tinha sumido.
01:15:04Eu chamei a polícia, os hospitais.
01:15:10Nada.
01:15:11Passei uma noite infernal.
01:15:12Teve uma hora que eu quase bati com a cabeça na parede.
01:15:17Aí pelas cinco, seis da manhã, ela me aparece.
01:15:19Molhada da cabeça aos pés.
01:15:22Eu tinha caído no rio que havia perto da rua principal.
01:15:26Eu fiquei encharcada com a água do rio e aquilo me humilhou.
01:15:30Eu não queria voltar pro hotel antes que a roupa secasse.
01:15:34Mas a roupa ficou grudada no meu corpo e não secava.
01:15:37Então, eu resolvi voltar pro hotel conduída de mim mesma.
01:15:44Porque essa foi a única maneira que eu encontrei pra eu voltar.
01:15:48Eu comecei a fazer um esforço pra sair de mim própria.
01:15:52E ver de fora uma outra menina que não era eu.
01:15:57Isso diminuía minha vergonha.
01:16:01Era uma outra menina que tinha caído no rio e não era eu.
01:16:03E quando eu voltei pro hotel e meu pai me beijou...
01:16:10Eu juro pra você.
01:16:14Eu tava tão apartada de mim.
01:16:17Me olhando assim tão de longe...
01:16:20Que eu não senti o braço do meu pai.
01:16:23Eu vi que ele me beijou.
01:16:25Mas no meu rosto não veio calor de ninguém.
01:16:27Isso é tanto verdade que até hoje eu me lembro disso.
01:16:33Que no momento em que meu pai me beijou...
01:16:36Eu me vi afagando meu próprio rosto.
01:16:39Como se há muito tempo não soubesse de afago...
01:16:42De carinho e de beijo.
01:16:47Então, eu fiquei na dúvida...
01:16:49Se a umidade do meu rosto...
01:16:52Era a água do rio...
01:16:54Ou era eu a transpirar.
01:16:57Cris.
01:17:01Hein?
01:17:02O espetáculo de ontem, você gostou?
01:17:09Hein, Cris?
01:17:11Você gostou do espetáculo de ontem?
01:17:15Ontem foi um bom espetáculo.
01:17:24Sabe?
01:17:25A partir de amanhã...
01:17:27Eu vou passar a viver com ele.
01:17:30Ele quem?
01:17:33Com o cara que você conheceu ontem.
01:17:36É que ele não passa.
01:17:40Não fica triste.
01:17:43Não, não fico triste.
01:17:44Está indo?
01:17:50Estou.
01:17:52Para onde?
01:17:54Ainda não sei.
01:17:58E a Cris?
01:17:59Ela não precisa mais de mim.
01:18:02Vai caminhar sozinha.
01:18:04Já é uma atriz.
01:18:05Quem é você?
01:18:26Aí.
01:18:27Quem é você?
01:18:34Você vai falar, não?
01:18:44Teu nome, hein?
01:18:47Ué, não vai dizer nada?
01:18:53Ali, ali, ó.
01:18:56Você que fechou aqui, ali, é cutia.
01:19:02Ó, rapaz.
01:19:04Tu vai me dizer, ah, já sei, já sei.
01:19:08Você veio de um desses ralos de esgoto.
01:19:12E agora não sabe como viver, não é?
01:19:14Não é? Não é?
01:19:20Tu não vai falar comigo, não vai dizer nada?
01:19:22Não vai dizer quem é teu pai, quem é tua mãe?
01:19:24Não vai saber quem eu sou?
01:19:27E se eu for um homem mau?
01:19:28Hum?
01:19:32Hein? Hein?
01:19:34Então, fala, fala.
01:19:46Hum?
01:19:47Hum?
01:19:58Hum?
01:19:59Hum?
01:20:01Hum?
01:20:01Hum?
01:20:04Ah! Ah!
01:20:34Seja bem-vindo. Eu sou Pedro Armada.
01:20:41Amigos! Amigos! Chegou!
01:20:48Seja bem-vindo. Eu sou Pedro Armada.
01:20:52Amigos! Amigos! Chegou!
01:21:03Chegou a hora. Estamos aqui para celebrar o teatro.
01:21:08Conosco novamente o nosso ator principal.
01:21:11Viva o teatro! Viva a arte dos contadores de história!
01:21:16Viva a liberdade!
01:21:18Viva!
01:21:33Viva!
01:21:34Viva!
01:21:35Viva!
01:21:36Viva!
01:21:37Viva!
01:21:38Viva!
01:21:39Viva!
01:21:40Viva!
01:21:41Viva!
01:21:42Viva!
01:21:43Viva!
01:21:44Viva!
01:21:45Viva!
01:21:46Viva!
01:21:47Viva!
01:21:48Viva!
01:21:49Viva!
01:21:50Viva!
01:21:51Viva!
01:21:52Viva!
01:21:53Viva!
01:21:54Viva!
01:21:55Viva!
01:21:56Viva!
01:21:57Viva!
01:21:58Viva!
01:21:59Viva!
01:22:00Viva!
01:22:01Viva!
01:22:02Viva!
01:22:03Viva!
01:22:04Viva!
01:22:05Viva!
01:22:06Viva!
01:22:07Viva!
01:22:08Viva!
01:22:09Viva!
01:22:10Viva!
01:22:11Viva!
01:22:12Legenda Adriana Zanotto
01:22:42Legenda Adriana Zanotto
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