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TecnologiaTranscrição
00:00Vamos repercutir agora esse assunto aqui no Olhar Digital News.
00:04Os desafios para essa empreitada rumo à Marte vão muito além da tecnologia.
00:10E essa é a nossa reflexão de agora.
00:13Para isso, vamos receber Miriam Pacheco, que é chefe do Laboratório de Paleobiologia e Astrobiologia da UFSCar.
00:22Vamos lá receber a Miriam aqui nos nossos estúdios do Olhar Digital.
00:27Vamos lá, deixa eu colocar a Miriam aqui na nossa tela.
00:31Esse meu mouse está querendo me dar um baile aqui hoje. Vamos lá.
00:34Olá, boa noite Miriam. Muito bem-vinda ao Olhar Digital News. Obrigada pela presença.
00:40Boa noite Marisa, tudo bem? Eu que agradeço.
00:44Miriam, eu queria começar com você pelo princípio mesmo.
00:48Como que funciona essa colonização de um planeta?
00:52O Elon Musk falou em terraformação.
00:55Existem pesquisas sobre isso?
00:59Sim, existem pesquisas sobre isso.
01:02Na verdade, boa parte é uma área na astrobiologia, inclusive,
01:08e faz parte de uma ciência que ainda está engatinhando,
01:12porque nós fazemos parte de uma ciência básica.
01:14Então, pensando no que o Elon Musk falou sobre a colonização humana em Marte,
01:20a gente tem que passar por algumas etapas.
01:23E a primeira etapa, de fato, seria a terraformação.
01:27E a terraformação basicamente tem a ver com esse nome mesmo,
01:31é a gente transformar um outro mundo, que pode ser um planeta, uma lua, enfim,
01:35em algo parecido com o planeta Terra mesmo.
01:37Então, é algo que pode ser muito demandante e não é tão simples assim.
01:44Então, pensando num planeta como Marte, teria que haver uma modificação profunda,
01:49primeiro porque Marte tem uma atmosfera muito rarefeita,
01:53uma atmosfera muito fininha, muito diferente do nosso planeta,
01:57que consegue reter a própria umidade ali,
02:00reter água na forma líquida, de forma abundante na superfície,
02:04porque nós temos um campo magnético,
02:08o que já não acontece mais ali em Marte.
02:10Então, para se estabelecer qualquer tipo de ecossistema ou vida ali em Marte,
02:16que é o objetivo da terraformação,
02:19teria que pelo menos se estabelecer uma atmosfera,
02:22água líquida, a superfície, então, recobrar o ciclo da água ali
02:27e também fazer algumas alterações,
02:31eu falo algumas, mas elas são bastante profundas,
02:34no sol marciano,
02:36que teria que conter vida de uma forma que mantivesse um ciclo biológico ali
02:42para que plantas e outros organismos se estruturassem.
02:45Então, é algo bem complicado do ponto de vista até,
02:48por exemplo, de bactérias, de micro-organismos.
02:52Isso é um primeiro estágio, que é super complexo,
02:55e fazer isso sem um campo magnético,
02:58ou seja, estabelecer uma atmosfera, estabelecer vida sem um campo magnético,
03:02é como encher um balão furado,
03:05é como se a gente estivesse soprando um balão furado,
03:08porque tudo que foi estabelecido ali
03:09não vai ter a segurança do campo magnético,
03:13é o campo magnético que vai proteger a atmosfera
03:16e vai proteger tudo que tem ali no planeta
03:18contra os raios do sol que podem carregar essa atmosfera,
03:23podem carregar água líquida e superfície.
03:25Então, é um desafio, a própria terraformação é um grande desafio
03:28e as pesquisas ainda estão engatinhando, por exemplo,
03:32com a gente tentando entender como que bactérias
03:34interagem com grão de areia aqui na Terra.
03:40E aí, para pular para uma colonização humana,
03:44pensando em estabelecimento de hábitos e postos ali,
03:49aí teria que se pensar em vários desafios
03:52que vão desde proteger os seres humanos da radiação,
03:57que é extremamente alta ali em Marte,
04:00e pode causar câncer, por exemplo,
04:03ver como que esses seres humanos,
04:06como que eles iam respirar,
04:07então como que esses postos vão ser sustentáveis
04:09a ponto de ter ar respirável,
04:12proteger os seres humanos também
04:14dessas tempestades de poeira que existem em Marte,
04:18então fazer todo um tipo de proteção para esses seres humanos,
04:22e tem também a questão do desafio físico
04:25que o ser humano vai ter.
04:26Então, a gravidade em Marte é 38% da gravidade
04:29do nosso planeta,
04:31então isso traz consequências fisiológicas
04:33para a nossa musculatura,
04:35para os nossos ossos,
04:36então é uma série de desafios
04:39e de pesquisas que têm que estar em andamento
04:42totalmente alinhadas para que esse tipo de coisa ocorra.
04:46Pois é, quando a gente ouve o Elon Musk falando,
04:49parece que é uma coisa que é simples,
04:51o ano que vem já vamos começar.
04:53Agora, qual é o foco científico
04:55dessas missões da SpaceX, Miriam?
04:57E mais até, como conciliar ciência
05:00com ética nesse caso?
05:04Então, eles têm um plano bastante ambicioso,
05:07que é um entusiasmo pela exploração,
05:11só que o nosso entusiasmo pela exploração
05:14ele tem que levar em conta
05:16a responsabilidade científica.
05:18Então, assim, quando a gente está falando
05:21em terraformar, mesmo antes de colonizar
05:25por humanos um planeta,
05:27em terraformar um planeta
05:29ou até em fazer uma missão tripulada à Marte,
05:32isso deve ser bem pensado.
05:34Pelo que vocês apresentaram muito bem
05:36até na reportagem, eles têm um cronograma
05:38que começa a partir do ano que vem
05:39e parece que, assim, o auge do sucesso
05:42pelo que eles estão colocando como meta
05:45ocorre em 2050 já,
05:47uma cidade autossustentável ali em Marte.
05:51De acordo com eles, as primeiras missões,
05:54elas vão ser missões, principalmente as tripuladas,
05:57elas vão ser missões de reconhecimento
05:59para exploração de recursos que possam ser utilizados,
06:02os estabelecimentos de fontes de energia
06:05que possam ser utilizadas,
06:06mas tudo ali tem um papel humano
06:09na exploração do planeta muito grande.
06:12E ali o ser humano, a humanidade,
06:15se a gente pensar,
06:16estaremos sendo representados por esse evento,
06:19a humanidade, ela não deixa de ser uma força geológica.
06:23Então, como ela é uma força geológica
06:24aqui no nosso planeta,
06:25que altera ciclos,
06:28que altera a atmosfera,
06:30que altera oceanos, enfim,
06:32vai ser a mesma coisa ali em Marte.
06:34Ok, fazemos isso no nosso planeta
06:36enquanto humanidade,
06:38mas fazer isso agora em Marte,
06:42sendo que isso,
06:44sem que isso seja precedido minimamente
06:46de um estudo profundo
06:48a respeito da geologia,
06:51da parte do campo magnético,
06:55da atmosfera marciana,
06:57eu acho isso um pouco temerário,
06:59na verdade, bastante temerário,
07:01porque a gente vai deixar
07:02passar uma série de informações
07:05que tem a ver principalmente
07:07com o patrimônio da origem da vida.
07:10Marte é, a gente pode considerar,
07:13enquanto uma,
07:14hoje é a cápsula do tempo
07:16mais promissora que a gente tem
07:18para estudar a origem da vida.
07:20É como se, fazendo um paralelo,
07:23Marte e Terra,
07:25na origem do Sistema Solar,
07:27há mais ou menos,
07:28entre 3,5 e 4 bilhões de anos,
07:30existiam condições muito parecidas.
07:33Então, enquanto a Terra
07:34já tinha estabelecido água em superfície,
07:38o campo magnético funcionando,
07:40a atmosfera mais densa e tal,
07:43Marte também tinha isso.
07:45Marte tinha condições muito parecidas
07:46com a Terra,
07:47enquanto a Terra estava
07:48tendo estabelecimento da vida aqui,
07:50a origem da vida acontecendo aqui.
07:51Isso pode ter acontecido lá em Marte.
07:55Só que como Marte perdeu
07:56o seu campo magnético
07:57mais cedo que a Terra,
08:00ele pode ter preservado algo
08:01que aqui a gente não tem mais preservado
08:04diante de todas as alterações
08:05que aconteceram em bilhões de anos
08:07no nosso planeta,
08:08com essa atmosfera rica
08:10e sempre em transformação que a gente tem.
08:12a gente pode ter um registro muito importante
08:15sobre a origem da vida ali em Marte
08:18que se perdeu aqui no nosso planeta.
08:20Registros muito importantes
08:21sobre a nossa origem.
08:23E se a gente já começa
08:25uma missão exploratória
08:27e de conquista,
08:29explorando os recursos geológicos
08:31e transformando o planeta
08:33dessa forma,
08:34a gente pode apagar
08:36essa informação
08:37e a nossa enciclopédia galáxia
08:39aqui, tomando emprestado
08:41o termo do Isaac Asimov,
08:43ela pode se perder.
08:45Ou seja,
08:46o passado da Terra
08:47pode ajudar a entender Marte
08:49e Marte também pode ajudar
08:50a entender o futuro da Terra,
08:52é isso?
08:53Exatamente.
08:54Marte também pode ajudar.
08:55Além de a gente fazer
08:57uma série de pesquisas
08:58aqui em Terra,
08:59olhando para como era a Terra
09:00no passado,
09:01para entender como Marte
09:02pode ter preservado alguma coisa
09:04e a gente então poder procurar
09:06as nossas origens ali,
09:08a gente pode olhar para Marte
09:10sem o campo magnético quase,
09:13com a atmosfera rarefeita
09:14e pensar no futuro da Terra.
09:16É como se a gente estivesse vendo
09:18o nosso futuro fossilizado,
09:19suspenso ali
09:20e tivesse uma oportunidade
09:22de entender melhor
09:23tanto o nosso próprio passado
09:24quanto o nosso próprio futuro
09:25comparando com o nosso planeta.
09:27E explorar isso
09:28de uma forma massiva
09:29vai apagar essa história.
09:32Pelo menos por enquanto.
09:35Agora, Miriam,
09:36a SpaceX,
09:37como todos nós sabemos,
09:38é uma empresa privada
09:40e que recebe
09:41um grande apoio da NASA.
09:43Qual é o papel
09:44dos cientistas
09:45nessas discussões
09:46desses planos,
09:48desses projetos
09:49da SpaceX,
09:50sendo ela
09:50essa empresa privada?
09:52Bom, isso daí
09:55é a visão que eu tenho
09:56que o cientista
09:57ele deve agir
09:59com responsabilidade
10:00e honestidade
10:01o máximo possível.
10:03Então, a gente não deve
10:04barrar a tecnologia
10:05de forma alguma,
10:06nem os avanços científicos.
10:07Inclusive,
10:08toda essa empreitada
10:10que é promovida
10:11pela SpaceX
10:12está causando
10:13uma série de avanços
10:15tecnológicos,
10:16de fato.
10:17O que deve ser pensado,
10:18e aí os cientistas
10:19têm que tomar o seu lugar
10:20e o seu papel,
10:21é o cronograma
10:22desses acontecimentos
10:23e o quanto
10:25que a gente vai lidando
10:26com essas informações
10:27e o que é preciso
10:28preservar antes
10:29que intervenções
10:30muito profundas
10:31sejam realizadas.
10:33Senão, a gente pode
10:34acabar incorrendo
10:35numa escala
10:36muito maior agora
10:37porque a humanidade
10:38em termos de tecnologia
10:39está ficando cada vez
10:40mais poderosa
10:41e isso sempre fez parte
10:43da nossa história,
10:44a gente querer ir mais
10:45e mais além.
10:46A gente talvez possa
10:47incorrer
10:48no que aconteceu
10:49de uma forma
10:50muito mais catastrófica
10:51o que aconteceu
10:52na década de 80
10:53com a Challenger,
10:54quando o ônibus espacial
10:56ali explodiu
10:57e quando o Richard Feynman,
10:59que é um grande cientista
11:01que a gente teve
11:02no século XX,
11:03ele foi chamado
11:05a investigar
11:06e a exercer
11:07a sua responsabilidade científica,
11:09ele não faltou
11:11com honestidade
11:11quando ele disse
11:13que para que uma tecnologia
11:16ela seja bem sucedida,
11:18a realidade
11:18ela deve preceder
11:20as relações públicas
11:22porque a natureza
11:23ela não pode ser enganada
11:24e no nosso caso
11:26agora, né,
11:27a natureza
11:28ela não pode ser enganada
11:29de forma alguma
11:29e ela corre o risco
11:31de ser apagada
11:32dentro da nossa história.
11:34Tá certo, bom.
11:37Tá aí.
11:38Miriam Pacheco,
11:39muitíssimo obrigada
11:40pela sua participação
11:41com essas reflexões todas
11:43a respeito
11:44dessas declarações
11:46de Elon Musk.
11:47Agradeço muito
11:47sua participação
11:48e espero que a gente
11:49se encontre
11:49em outros momentos.
11:50Muito obrigada,
11:51boa noite.
11:52Eu que agradeço,
11:53boa noite.
11:55Tá aí, pessoal,
11:56nós conversamos,
11:57deixa eu só fechar aqui
11:57a tela
11:58para a gente continuar,
11:59nós conversamos
12:00com Miriam Pacheco
12:01que é chefe
12:02do Laboratório
12:02de Paleobiologia
12:04e Astrobiologia
12:04da UFSCar.
12:06Interessante
12:07essa discussão
12:08sobre essas declarações
12:10de Elon Musk.