MEMÓRIAS DE UMA GUERRA GUINÉ 69/71

  • há 7 anos
ASPECTOS DA GUERRA COLONIAL (1961-1975)





A guerra que Portugal travou em África entre 1961 e 1974, e que contribuiu de forma decisiva para o 25 de Abril, foi um dos acontecimento mais marcantes da história portuguesa na segunda metade do Século XX.

Entre os antecedentes longínquos dos conflitos coloniais do pós-II Guerra Mundial podemos considerar não só a ideia de libertação vivida pelos contingentes militares coloniais que combateram na Europa, como o facto persistente do mundo bipolar dividido entre as duas superpotências, EUA e URSS, e o ambiente de guerra-fria mutuamente alimentado. A criação das Nações Unidas e a aprovação da sua Carta, onde expressamente se definem, através do capítulo XI, as questões relacionadas com os territórios não-autónomos, contribuiu grandemente para definir o enquadramento internacional da questão colonial. Finalmente, também se tornou um factor decisivo, a constituição do movimento dos não-alinhados, especialmente a partir da Conferência de Bandung em 1955.

Estas condições conduziram directamente ao movimento descolonizador, que se iniciou no Extremo Oriente, se propagou para o Médio Oriente e que chegou ao Norte de África, em poucos anos, antes de passar para a África sub-saahriana.

A estas condições gerais devemos acrescentar, como factores condicionantes da política e dos conflitos coloniais, algumas especificidades relacionadas com Portugal. Por um lado, foram importantes os reflexos da criação da NATO e da presença de Portugal como país fundador, em 1949; por outro, a integração do “Acto Colonial” na Constituição Portuguesa, em 1951, com a designação “Do Ultramar Português”, a publicação da nova Lei Orgânica do Ultramar Português em 1953, e a entrada de Portugal na ONU em 1955 acabaram por condicionar muito do que foi a política do Estado Novo em relações às suas colónias nesta época. Também se revestiram de grande importância, os acontecimentos da Índia.

Devemos salientar a relevância desta última questão, tanto pela sua influência na definição da política colonial do regime português, que nunca aceitou separar os casos de cada território colonial, para lhes dar soluções distintas, como por se manter na memória dos militares como marca das relações entre o poder político e as Forças Armadas, que foram transformadas em bode expiatório dos acontecimentos. Nos períodos difíceis da guerra, esta questão tornou-se sempre relevante no seio dos militares.

A guerra colonial desenrolou-se nos territórios de Angola, Guiné e Moçambique, no período de 1961 a 1974. Estiveram em confronto as Forças Armadas portuguesas e as forças organizadas pelos movimentos de libertação de cada uma daquelas colónias. Os movimentos de libertação que especialmente se opuseram a Portugal em cada um dos territórios foram os seguintes: em Angola, a UPA, União dos Povos de Angola, depois transformada em FNLA, Frente Nacional de Libertação de Angola; o MPLA, Movimento Popular de Libertação de Angola; e a UNITA, União Nacional para a Independência Total de Angola. Na Guiné, o PAIGC, Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde. Em Moçambique, a FRELIMO, Frente para a Libertação de Moçambique.

Não parece desajustado que comecemos o estudo deste conflito por uma breve análise do ano de 1961 e dos acontecimentos que marcaram este primeiro ano da guerra.

Ainda no final de 1960, a Assembleia-Geral da ONU aprovou, por grande maioria, três resoluções muito importantes: a resolução 1514 (XV), conhecida como “Declaração Anticolonialista”, a resolução 1541 (XV), com a definição de território não-autónomo, e a resolução 1542 (XV), enumerando, como territórios não-autónomos, todos os territórios coloniais administrados por Portugal.

Mas o ano de 1961 seria de facto demolidor para o regime. Podem salientar-se alguns acontecimentos de maior relevância.

Logo em Janeiro, a repressão dos trabalhadores da Baixa do Cassange, em Angola, acontecimento que ficará para sempre ligado ao início da revolta das populações; a posse do presidente John Kennedy, nos Estados Unidos, que mudaria o sentido da sua política externa no que respeita ao movimento descolonizador, criando imensas dificuldades diplomáticas ao regime português; e o assalto ao paquete “Santa Maria”, por Henrique Galvão, que ficou sempre como um símbolo da oposição ao regime de Salazar.

Depois, em Fevereiro, a revolta de Luanda, iniciada no dia quatro, que virá a ser considerada como o despontar da luta armada neste território.

Em Março tem início a revolta do Norte de Angola, com imensas vítimas entre a população branca e os trabalhadores oriundos de outras regiões de Angola.

Segue-se, em Abril, a tentativa de golpe de Estado conduzida pelo ministro da Defesa, general Botelho Moniz, rapidamente anulada por Salazar, mas que ficou sempre na memória militar (ou pelo menos de alguns militares), como sinal de oposição à política colonial do regime.

Já em Agosto, é de assinalar a ocupação de S. João Baptista de ANGOLA.