GUERRA DO ULTRAMAR PORTUGUÊS GUINÉ- MADINA DO BOÉ - A RETIRADA
  • há 6 anos
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1. Este documento, que me chegou às mãos através do Humberto Reis, relata a dramática operação em que participou a CCAÇ 2405, sedeada em Galomaro, e pertencente ao BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), operação essa que tinha em vista retirar as NT da posição insustentável de Madina do Boé, cercada pelo PAIGC (e depois ocupada logo a seguir, no mesmo dia, a 6 de Fevereiro de 1969, após a retirada das NT).

Recorde-se que a companhia que estava em Madina do Boé, há 13 meses, era a CCAÇ 1790, a mesma a que pertencia Gustavo Pimenta, o alferes miliciano que perdeu metade do seu pelotão nessa trágica retirada (ele é o autor do livro sairómeM - Guerra Colonial. Porto: Palimage Editores, 1999) [vd. post de 17 de Julho de 2005 > Guiné 69/71 - CIX: Antologia (7): Os bravos de Madina do Boé (CCAÇ 1790) ]

Em Cheche, já no regresso de Madina, pelas 9 da manhã do dia 6 de Fevereiro de 1969, as NT sofrem a perda de meia centenas de homens e grandes quantidades de material, quando a jangada que fazia a travessia do Rio Corubal se virou. Aparentemente, sem explicação (Já ouvi várias teorias sobre isso, mas essas especulações ficam para mais tarde...).

O desastre terá sido devido a excesso e desiquíbrio de peso. Iam na jangada mais de cem homens (4 grupos de combate mais a tripulação da embarcação), além de viaturas e outro equipamento. Dos que desapareceram, 17 pertenciam à companhia de Galomaro.

Esta operação foi uma das mais dramáticas que se desenrolaram no TO da Guiné, devido não só à pressão do IN (invisível mas sempre ubíquo como Deus) como a outros factores desfavoráveis para as NT (o calor, a falta de água, as condições do terreno, as terríveis abelhas da Guiné que estavam objectivamente ao serviço do PAIGC, as insónias, o stresse, a exaustão física e emocional...).

A minha experiência de operacional diz-me que mais do que dois dias no mato, naquelas terras, era humanamente impossível para um tuga. Andar a pé, no mato, ao sol, entre as 10 e as 16 horas, era uma loucura suicidária. As elevadas temperaturas, à sombra e ao sol, a par da humidade do ar, obrigavam à ingestão de elevadas quantidades de água. As rações de combate eram intragáveis e inadequadas às condições da guerra da Guiné. Apercebendo-se de que provocavam mais sede, os militares deixavam de as consumir. O risco de desidratação e de subnutrição aumentava. O abastecimento de água era sempre crítico e nunca estava garantido. Além disso, tínhamos mais medo das abelhas do que o diabo da cruz.

Nesse ano, no início da estação seca, iriam realizar-se grandes operações de limpeza, como a da Lança Afiada, já aqui descrita (vd. post de 31 de Julho de 2005 > Guiné 63/74 - CXXXI: As grandes operações de limpeza: Op Lança Afiada, Março de 1969) . Dizia-se em Bissau que o então brigadeiro Spínola queria acabar com a guerra em seis meses... O PAIGC percebeu que o homem grande de Bissau não era pera doce, que era um adversário de respeito, mas também não lhe deu tréguas...

O impacto negativo do desastre de Cheche no moral das nossas tropas foi enorme (É curioso que ainda hoje não se fala em Cheche, mas sim em Madina do Boé... Ora o desastre ocorreu justamente em Cheche, na travessia do Rio Corubal, com Madina já para trás...).

Lembro-me, quando ainda periquito, em Contuboel, ouvir os dramáticas relatos de camaradas mais velhos que participaram nesta complexa e vasta operação, a nível de agrupamento. No meu Diário de um Tuga, eu costumava comparar Madina do Boé a Dien Bien Phu, comandada pelo célebre general Giap, onde os franceses perderam a guerra do Vietname.

A comparação era um evidente exagero. Mas é um facto que em Madina do Boé, em 5 de Fevereiro de 1969, começava provavelmente o fim da guerra colonial na Guiné e do nosso império. Esta queda foi também simbólica. Para o PAIGC representou uma vitória retumbante. Não é por acaso que a proclamação unilateral da independência é feita em Madina do Boé, a 24 de Setembro de 1973. Mas deixemos isso para mais tarde e sobretudo para os historiadores...

O texto que se segue tem uma ou outra palavra ilegível. Foi feita a sua recuperação. Impresso a stencil há 35 anos, do documento foi feita uma fotocópia, fornecida ao Humberto Reis por um camarada da CCS do BCAÇ 2852.

Curiosamente, o autor do relatório da Op Mabeco (?), o comandante da CCAÇ 2405, não apresenta quais quer razões, técnicas, militares ou outras, para o afundamento da jangada, limitando-se a descrever, de maneira sucinta e factual, o desastre, como mandava o livro de estilo dos operacionais, nunca deixando que os seus sentimentos ou emoções interferissem com a capacidade de identificar e descrever os acontecimentos mais relevantes ocorridos durante uma operação.

No entatanto, o autor do relatório usa um advérbio de modo (espectacularmente) .
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